Com a publicação de fotografias de crianças de diferentes etnias, a Brasiliana Fotográfica celebra o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial. As imagens escolhidas são de autoria do berlinense Alberto Henschel (1827 – 1892) e do português Felipe Augusto Fidanza (1844 – 1903). Pertencem ao Arquivo Nacional e ao Leibniz-Institut für Länderkunde, ambas instituições parceiras do portal.
“O racismo continua a envenenar instituições, estruturas sociais e o cotidiano de toda a sociedade”.
António Guterres (1949-), secretário-geral da ONU, em 21 de março de 2022
Henschel foi um dos mais importantes fotógrafos que atuaram no Brasil na segunda metade do século XIX. Chegou no Recife, em 1866, e, ao longo de 16 anos, teve uma intensa atividade no país. Segundo o historiador Boris Kossoy (1941 – ), Henschel pode ser considerado pioneiro no Brasil como empresário da fotografia, pois chegou a ter quatro estabelecimentos: o primeiro no Recife (1866), o segundo em Salvador (provavelmente em 1868) e os últimos no Rio de Janeiro (1870) e em São Paulo (1882).
Fidanza foi também fotógrafo de destaque, tendo trabalhado no norte do Brasil no século XIX e no início do século XX. Chegou ao país em fins da década de 1860 e, em seu estúdio, retratou tipos diversos no formato carte de visite. Para tornar essas fotografias, que vendia, exóticas, utilizava adereços e construía cenários. Além de produzir estes retratos, registrou as paisagens e documentou o início do desenvolvimento urbano de Belém e de Manaus, ocasionado pela riqueza do ciclo da borracha.
Breve história do Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial
“Discriminação Racial significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada na raça, cor, ascendência, origem étnica ou nacional com a finalidade ou o efeito de impedir ou dificultar o reconhecimento e exercício, em bases de igualdade, aos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou qualquer outra área da vida pública”
O Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial foi criado pela Organização das Nações Unidas, ONU, em 26 de outubro de 1966 (Portal da UNESCO). É uma referência ao Massacre de Sharperville, ocorrido em 21 de março de 1960, em Joanesburgo, na África do Sul. Neste dia, milhares de pessoas faziam um protesto pacífico contra a Lei do Passe, que obrigava a população negra a portar um cartão que continha seus dados pessoais e os locais onde era permitida sua circulação. A polícia do regime do apartheid atacou os manifestantes, matando 69 e deixando cerca de 180 feridos (Correio da Manhã, 22 de março de 1960; Jornal do Brasil, 23 de março de 1960).
Segundo pesquisa divulgada pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -, no dia 22 de julho de 2022, cujos dados integram a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Características Gerais dos Moradores 2021, o perfil da população brasileira de acordo com cor ou raça é a seguinte: 99,90 milhões de pardos, 91,47 milhões de brancos, 19,30 milhões de negros e 1,98 de indígenas, amarelos ou sem declaração (Folha de São Paulo, 22 de julho de 2022). No Brasil, o crime de racismo está previsto na Constituição Federal, é inafiançável e imprescritível. A Lei n° 7.716/1989 tipifica a discriminação racial como crime.
O Brasil é um dos países signatários do acordo que a ONU que estabeleceu os anos entre 1º de janeiro de 2015 e 31 de dezembro de 2024 como a Década Internacional das Pessoas Afrodescentes com o objetivo de reduzir as desigualdades e exclusões as quais eles estão submetidos (Portal da ONU; Americas Quarterly).
“Africanos e pessoas afrodescendentes, asiáticos e pessoas de descendência asiática, comunidades minoritárias, pessoas indígenas, migrantes, refugiados e tantos outros – todos continuam a enfrentar estigmatização, culpabilização, discriminação e violência”.
Em 2023, o tema da ONU do Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial é o foco na urgência no combate ao racismo e à discriinação racial 75 anos após a adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos (Portal da ONU).
Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé
Em 6 de janeiro de 2023, foi sancionada a Lei 14.519/2023, que instituiu o Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé, que será celebrado anualmente também no dia 21 de março.
Lembramos aqui a reportagem As noivas dos deuses sanguináriossobre o candomblé, que tornou-se histórica. Foi realizada pelo repórter Arlindo Silva (1924 – 2011) e pelo fotógrafo José Medeiros (1921 – 1990) e publicada na revista O Cruzeiro, de 15 de setembro de 1951. Tratava-se de uma documentação fotográfica inédita e foi uma resposta à publicação na revista Paris-Match, de 15 de maio de 1951, da matéria Les possédées de Bahia, com fotografias produzidas pelo cineasta francês Henri Georges-Clouzot (1907 – 1977) e escrita na terceira pessoa. A reportagem foi considerada etnocêntrica e arrogante.
Com a ajuda de um motorista de táxi de Salvador, o fotógrafo Medeiros localizou um terreiro e pagou pelos animais que seriam sacrificados no ritual. Na hora da realização da reportagem, o cabo do sincronismo do flash se rompeu e ele teve de ajustar o anel do obturador de sua Rolleiflex para enfrentar a escuridão do terreiro. A reprodução total ou parcial da matéria publicada no Cruzeiro era absolutamente interdita. O tom sensacionalista da reportagem foi criticado. Seis anos depois, Medeiros relançou as fotografias no livro Candomblé, primeiro sobre essa religião no Brasil e o material passou a ser considerado importante do ponto de vista etnográfico. O Instituto Moreira Salles, que em agosto de 2005 adquiriu sua obra completa com aproximadamente 20 mil negativos, relançou o livro em 2011.
‘Antigamente no passeio público a esquerda de quem entrava pelo portão da rua do Passeio, existia um bar ao ar livre, dos apelidados pelo público de “Chopp Berrante”. Nesse bar havia um teatrinho, onde aos domingos acorria a garotada e todas as noites se exibiam cançonetistas acompanhados ao piano. A consumação obrigatória pagava o espetáculo. O bar era arrendado pela prefeitura ao senhor Arnaldo Gomes de Souza’.
Assim Charles Julius Dunlop (1908–1987), escritor e entusiasta do Rio Antigo, começava seu texto intitulado O Chopp Berrante do Passeio Público, publicado na Revista G.E., em 1956. Dunlop trabalhou entre 1927 e 1976 no departamento jurídico da Light, empresa onde conheceu, em meados da década de 30, o fotógrafo Augusto Malta (1864 – 1957), que trabalhava na Prefeitura do Rio de Janeiro, e havia sido designado para cobrir a inauguração de uma usina de força da empresa. Esse encontro foi decisivo no interesse de Dunlop por fotografias e histórias cariocas. Entre 1952 e 1955, ele publicou a coluna “Rio Antigo”, no jornal Correio da Manhã, muitas vezes ilustrada por fotos de Malta (Correio de Manhã, 30 de maio de 1952).
Um pouco da história do quiosque Chopp Berrante e da parceria entre Arnaldo Gomes e Marc Ferrez – os primórdios do cinema no Brasil
Localizava-se no Passeio Público, concorrido ponto de encontro da população carioca nos séculos XVIII e XIX e primeiro parque ajardinado do Brasil. Já no século XX, entre 1902 e 1906, na gestão do prefeito Francisco Pereira Passos (1836 – 1913), o Passeio Público recebeu diversos melhoramentos e foi inaugurado o primeiro aquário de água salgada da América do Sul, em 18 de setembro de 1904 (Gazeta de Notícias, 19 de setembro de 1904, na última coluna sob o título “O Aquarium”). Possivelmente, o Chopp Berrante no Passeio Público foi inaugurado em 1900, quando esse tipo de estabelecimento era um dos locais do universo de entretenimento da belle époque. Acredita-se que Catulo da Paixão Cearense (1866 – 1946) tenha sido um dos muitos músicos que se apresentaram no Chopp Berrante no Passeio Público.
O dono do Chopp Berrante no Passeio Público, Arnaldo Gomes de Souza, é o senhor de calça branca retratado na imagem acima. O fotógrafo Marc Ferrez (1843 – 1923) vendia aí seus filmes para que Arnaldo os exibisse em lençóis estendidos entre as árvores, no jardim do parque. No final de 1905, a Casa Marc Ferrez & Filhos passou a ser a fornecedora exclusiva do cinematógrafo ao ar livre Passeio Público, que existiu entre em 28 de outubro de 1905 e 2 de novembro de 1906. Apesar de ter um repertório pouco variado, o cinematógrafo do Passeio Público aumentou a concorrência do quiosque que, segundo Dunlop, passou a ser ponto obrigatório dos primeiros fãs de cinema da cidade.
Em sociedade com Arnaldo, Ferrez arrendou os prédios de número 145 e 149 da Avenida Central e inaugurou, em 18 de setembro de 1907, o Cinema Pathé, o terceiro da cidade (Gazeta de Notícias, 18 de setembro de 1907, nas sexta e sétima colunas). O primeiro, Chic, foi inaugurado em 1º de agosto de 1907; o segundo, Parisiense, foi aberto em 9 de agosto do mesmo ano.
A firma de Arnaldo e Ferrez chamava-se Arnaldo & Cia, omitindo a participação de Ferrez porque Charles Pathé (1863 – 1957), um dos proprietários da Pathé Frères, proibia que seus distribuidores e representantes possuíssem cinematógrafos. Em 1908, a sociedade de Ferrez com Arnaldo Gomes de Souza foi denunciada pelo concorrente de Ferrez, Jácomo Rosário Staffa, proprietário do cinema Parisiense. Ainda nesse ano, Ferrez e Arnaldo Gomes de Souza produziram o filme, Nhô Anastácio chegou de viagem, dirigido por Julio Ferrez. É considerada a primeira comédia cinematográfica brasileira e foi estrelada por Antônio Cataldi, José Gonçalves Leonardo e Ismênia Matteo. Em 1911, a sociedade de Marc Ferrez com Arnaldo Gomes de Souza foi desfeita.
A revista O Cruzeiro publicou ao longo de 1951 uma série de matérias intituladas Fotografias do Rio Antigo sobre a obra de Marc Ferrez na segunda metade do século XIX. As compilações e a legendas das imagens assim como os textos das matérias foram feitos pelo neto do fotógrafo, Gilberto Ferrez (1908 – 2000), o primeiro historiador da fotografia no Brasil. Muitas imagens reproduzidas nessas matérias estão no acervo da Brasiliana Fotográfica.
O título deste artigo foi alterado de O quiosque Chopp Berrante no Passeio Público, Ferrez, Malta e Charles Dunlop para Série “O Rio de Janeiro desaparecido” V - O quiosque Chopp Berrante no Passeio Público, Ferrez, Malta e Charles Dunlop, em 16 de setembro de 2021.
Publicações da Brasiliana Fotográfica em torno da obra do fotógrafo Marc Ferrez
FERLIM, Uliana dias Campos. A polifonia das modinhas: diversidades e tensões musicais no Rio de Janeiro na passagem do século XIX ao XX, 2006. Campinas: Unicamp
SAMPAIO, Lilian Alves. Vaidade e ressentimento dos músicos populares e o universo musical do Rio de Janeiro no início do século XX, 2011. São Paulo: USP
Segundo o Observatório Nacional, o verão 2016 começou hoje, dia 22 de dezembro de 2015, às 2h48m (horário de Brasília), quando ocorreu o solstício de verão. A Brasiliana Fotográfica homenageia a mais brasileira das estações com uma seleção de várias praias e vistas de nosso litoral. São registros fotográficos de Alagoas, da Bahia, de Pernambuco, do Rio de Janeiro, do Rio Grande do Sul e de São Paulo. A fotografia mais antiga é do Forte de São Francisco da Barra, de Augusto Stahl (1828 – 1877), produzida por volta de 1855, no litoral de Pernambuco. Outros fotógrafos presentes nessa seleção de imagens do litoral brasileiro são Abilio Coutinho, A. Ribeiro, Augusto Malta (1864 – 1957), Augusto Stahl (1828 – 1877), Georges Leuzinger (1813 – 1892), Guilherme Gaensly (1843 – 1928) , J. Schleier (1827 – 1903), Marc Ferrez (1843 – 1923), Moritz Lamberg (18? – ?),Revert Henrique Klumb (c.1826 – c.1886), Thiele, Rodolfo Lindemann (c. 1852 – 19?) e S.H. Holand.
Nesta edição, O Cruzeiro divulgou os resultados do primeiro concurso de fotografia promovido pela revista (páginas 33 e 34), cujo tema foi “a vida das praias”.
Há ainda artigos sobre o verão, fotografias e caricaturas de banhistas em diversas praias como Copacabana, Flamengo e Urca; e anúncios de roupas para banho de mar. Uma das matérias da revista é sobre estrelas de cinema internacionais fotografadas com roupas de praia.