O Teatro Amazonas (Theatro Amazonas), em Manaus, a “Paris dos Trópicos”

Com registros realizados pelo fotógrafo, botânico e naturalista alemão George Huebner (1862 – 1935) a Brasiliana Fotográfica conta um pouco da história do Teatro Amazonas, um dos símbolos do apogeu da borracha na região Norte do Brasil, inaugurado na virada do ano de 1896 para 1897. O Teatro Amazonas mantém viva parte da história do ciclo da borracha e é, até hoje, um dos mais importantes símbolos culturais e arquitetônicos do estado do Amazonas. Localiza-se no Largo de São Sebastião, no centro de Manaus. Destaca-se, em sua história, a importância de Eduardo Ribeiro (1862 – 1900), governador do Amazonas em dois períodos – 1890 a 1891 e 1892 a 1896- , considerado o grande transformador de Manaus. A historiografia amazonense diz que ele teve origem modesta e que talvez fosse descendente de escravos.

 

 

Huebner foi um dos estrangeiros atraídos a Manaus quando a cidade, justamente com o ciclo da borracha, tornou-se um importante pólo econômico. Estabeleceu-se comercialmente em Belém onde, em 1897, colaborou com o fotógrafo português Felipe Augusto Fidanza (c. 1847 – 1903). Em novembro do mesmo ano, apresentando-se como membro correspondente da Sociedade Geográfica de Dresden, informava a abertura de um ateliê fotográfico em Manaus, a Photographia Allemã, no antigo Hotel Cassina, junto ao Palácio do Governo. O ateliê mudou algumas vezes de endereço. Fotografou etnias indígenas, retratos de personalidades importantes de sua época, a sociedade que surgiu a partir do apogeu da economia da borracha, paisagens da floresta amazônica e a chegada da modernidade em Belém e em Manaus. Os registros do Teatro Amazonas se enquadram nessa última categoria.

 

Acessando o link para as fotografias do Teatro Amazonas disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

Durante a administração do governador Fileto Pires Ferreira (1866 – 1917), o Teatro Amazonas, imponente e de estilo neoclássico com detalhes ecléticos, foi inaugurado em 31 de dezembro de 1896, com a execução de trechos de óperas, apresentada pela Companhia Lírica Italiana, empresariada pelo maranhense Joaquim de Carvalho Franco. Na semana seguinte, em 7 de janeiro de 1897, a mesma companhia encenou a primeira récita operística no teatro: a ópera La Gioconda, de Almicare Ponchielli (1834 – 1886). Era a época áurea de Manaus, quando a cidade era conhecida como a Paris dos Trópicos. 

 

 

A história do teatro começou durante o governo de Alarico José Furtado (1846 – 1884) no estado do Amazonas, quando o deputado provincial Antônio José Fernandes Júnior apresentou, em 21 de setembro de 1881, o projeto de lei para a construção de um teatro em Manaus. Sua construção foi polêmica, já que a cidade contava apenas com cerca de cem mil habitantes. Porém, a sociedade local, com a prosperidade causada pelo ciclo da borracha e influenciada pela cultura europeia, exigia um espaço para as artes, onde pudesse ver e ser vista.

Em 1882, a licitação da obra foi vencida pelo Gabinete Português de Engenharia de Lisboa, representado pelo comerciante Antônio de Oliveira Braga. Segundo o historiador Mario Ypiranga Monteiro, constavam da planta original do teatro os nomes dos construtores Jorge dos Santos e Felipe Monteiro e do arquiteto francês Charles Peyroton (18? – 19?), que mais tarde participou da construção do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Em 1884, foi lançada sua pedra fundamental e o teatro começou a ser construído mas, em 11 de agosto de 1885, as obras foram suspensas porque os construtores queriam alterar o projeto inicial. Finalmente, em 12 de janeiro de 1886, o contrato com a firma italiana Rossi & Irmãos foi rescindido. Em 1892, já no período republicano, o governador do Amazonas, o militar e positivista maranhense Eduardo Gonçalves Ribeiro (1862 – 1900) (O Paiz, 18 de outubro de 1900, sexta coluna) decidiu reiniciar a construção, que ganhou fôlego a partir de uma lei que oferecia facilidades a artistas brasileiros e estrangeiros que quisessem se fixar em Manaus. Eduardo Ribeiro foi o grande transformador de Manaus. São também do período de sua administração o Palácio da Justiça, o Instituto Benjamin Constant e o inacabado Palácio do Governo, que se transformou no Instituto de Educação do Amazonas (IEA).

Segundo o trabalho Da província à corte: a trajetória do negro maranhense Eduardo Ribeiro, rumo ao Rio de Janeiro, da historiadora Geisimara Soares Matos, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, apresentado no II Seminário Internacional Histórias do Pós-Abolição do Mundo Atlântico, realizado entre 15 a 18 de maio de 2018, na Fundação Getulio Vargas, no Rio de Janeiro:

Na pesquisa documental feita até o momento não encontramos fontes primárias que permitissem dizer se Ribeiro nasceu livre ou escravo, ou, se sua mãe viveu as experiências do cativeiro. Muito pouco se sabe sobre a infância de Ribeiro, a historiografia amazonense diz que teve origem modesta e que talvez fosse descendente de escravos, mas sem nenhuma indicação de fonte primária sobre isso. Sua mãe, Florinda Maira da Conceição é citada em vários documentos aqui analisados, desde Fé de Ofício de Eduardo Ribeiro até o seu inventário póstumo. Em nenhum momento há referência a seu pai. No registro de batizados da Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da capital do Maranhão de 1863 há apenas o registro da descendência feminina; sem nenhuma menção a sua paternidade. Isso era um fato preponderante, pois já que o mesmo era desconhecido, muitos jornais oposicionistas utilizavam-se desse fato para sugerir que não fosse filho natural e assim estigmatizá-lo, tendo em vista o preconceito contra uniões sem oficialização, ou para insinuar que Eduardo Ribeiro tinha vergonha de sua origem.

Em 2019, Robério Braga (1951-), presidente da Academia Amazonense de Letras, proferiu uma palestra segundo a qual teria havido uma tentativa de apagamento do legado público de Eduardo Ribeiro:

“Soterraram seu nome do alto do Teatro Amazonas que havia sido gravado em pedras revestidas de ouro, na lateral superior esquerda do prédio […]”, afirmou Braga, reforçando sua tese de que Eduardo Ribeiro sofreu preconceito, por ser negro, nordestino e de baixa estatura, e perseguição política por parte das elites política e econômica da época“.  A placa em homenagem a Ribeiro foi redescoberta, durante obras de manutenção do teatro, em 2012.

 

 

Na mesma palestra, Robério Braga afirmou que no sepultamento de Eduardo Ribeiro, João Barreto de Menezes, corajoso jornalista, filho de Tobias Barreto, então residente em Manaus, tido e havido como figura de contestação e coragem, anunciou que Ribeiro havia sido envenenado e que não havia praticado o suicídio, e o fez na presença de alguns de seus algozes.

No trigésimo dia de sua morte foi realizada uma sessão magna, no Teatro Amazonas (Commercio do Amazonas, 13 de novembro de 1900):

 

 

Voltando à história da construção do teatro. Em 1893, Manuel Coelho de Castro, também encarregado da construção do Palácio da Justiça, que assim como os Palácio do Governo e os prédios do Instituto Benjamin Constant e de Artes e Ofícios estava sendo construídos, assinou um contrato para a retomada das obras do Teatro Amazonas (Diário Oficial do Amazonas, 25 de novembro de 1893, última colunaDiário Oficial do Amazonas, 10 de julho de 1894, última coluna).

O versátil artista pernambucano, nascido em Olinda, Crispim do Amaral (1858 – 1911) foi contratato, em 1893, para as obras de decoração, pintura, ornamentação e mobiliário do teatro. Crispim era pintor, caricaturista, decorador, ilustrador e cenógrafo e havia estudado no Recife com o pintor e cenógrafo francês Leon Chapelin, que possuia um estúdio fotográfico na cidade (Diário de Pernambuco, 23 de abril de 1867). Foi o responsável pelo pano de boca do Teatro Amazonas, que descreve o encontros dos rios Negros e Solimões (Diário Oficial do Amazonas, 23 de janeiro de 1896, segunda coluna).

 

 

Em 1876, havia se fixado em Belém. Tudo indica que foi discípulo do também pernambucano Vicente Pontes de Oliveira que, além de ator, era decorador e cenógrafo. Provavelmente, entre alugns anos de 1880 e 1893, Crispim viveu entre a França e a Itália. Na Itália, teria se formado pela Academia San Lucca. Na França, colaborou em vários periódicos, dentre eles o Le Rire, e trabalhou como cenógrafo da Comedie Française. Após sua passagem por Manaus, foi morar no Rio de Janeiro em fins do século XIX. Ao longo de sua vida, editou e ilustrou o jornal O Estafeta (1879), sob o pseudônimo Puck, trabalhou na revista A Semana Illustrada (1887), foi o primeiro diretor artístico da revista O Malho (1902), e o fundador das revistas A Avenida (1903) e O Pau (1905). Trabalhava como caricaturista na revista O Século quando faleceu, em 1911.

 

 

Por intermédio de Crispim, o pintor romano Domenico De Angelis (c. 1852 – 1900) retornou, em torno de 1897, ao Brasil, onde já havia vivido. De Angelis havia participado da decoração interna do Teatro Nossa Senhora da Paz, em Belém, inaugurado em 1878. Haviam se conhecido nesta ocasião e foi justamente por intermédio de De Angelis que Crispim foi agraciado, em 1888, com uma bolsa de estudos do governo paraense para aperfeiçoar-se em pintura na Academia de San Luca.

 

 

De Angelis foi contratado como decorador do Salão Nobre do Teatro Amazonas, no período de 1897 a 1899 (Commercio do Amazonas, 17 de julho de 1898, segunda coluna). É de sua autoria a pintura A glorificação das Bellas Artes da Amazônia (1899), que orna o plafond do teatro. O teto tem também bustos de personalidades brasileiras e as tapeçarias que cobrem todas as paredes retratam a fauna e a flora amazônica. Possui lustres de vidro de Murano e seu piso, com formatos geométricos, foram produzidos com quatro tipos de madeiras. Faleceu na Itália, em março de 1900.

 

 

Outro destaque do teatro é sua cúpula, composta por 36 mil peças importadas da região da Alsácia, na França, nas cores da bandeira brasileira. Foi adquirida na Casa Koch Frères, em Paris, e sua pintura ornamental foi feita por Lourenço Machado.

Segundo o Portal do Iphan:

“A construção do teatro apresentou soluções avançadas para a época destacando-se a estrutura metálica da cobertura incluindo a cúpula. Devido à dificuldade de importação de materiais nobres, as colunatas, alisares, óculos e balaústres foram feitos de cimento, alvenaria e reboco, mas preparados para parecerem mármore e outros materiais nobres. A cúpula é revestida externamente em cerâmica policromada, com telhas em escamas e áreas em vidros coloridos”.

 

 

Outros artistas que participaram da decoração interna do teatro foram Silvio Centofanti, Adalberto de Andreis e Francisco de Alegini. Provavelmente participaram da decoração do Salão de Honra Giovanni Capranesi (1852 – 1921) e Enrico Quattrini (1864 – 1950). A decoração externa foi realizada por Henrique Mazzolani. A época da construção do teatro foi, portanto, um tempo de efervescência artística em Manaus, quando oficinas de aprendizados e realizações foram formadas para sua edificação.

Segundo a Secretaria de Cultura e Economia Criativa Amazonas:

“A maior parte do material usado na construção do teatro foi importada da Europa: as paredes de aço de Glasgow, na Escócia; os 198 lustres e o mármore de Carrara das escadas, estátuas e colunas, são da Itália.

O salão de espetáculos tem capacidade para 701 pessoas, distribuídas entre a plateia e três pavimentos de camarotes. Impossível não ficar hipnotizado com o teto côncavo, no qual estão quatro telas pintadas em Paris pela tradicional Casa Carpezot. As telas representam música, dança, tragédia e ópera. Esta última, uma homenagem ao compositor brasileiro Carlos Gomes. Ao centro, um majestoso lustre de bronze francês. Também não passam despercebidas as máscaras nas colunas da plateia, que homenageiam compositores e dramaturgos, entre eles, Aristophanes, Molière, Rossini, Mozart e Verdi.”

Foi tombado pelo Iphan, em 1966, e reformado diversas vezes ao longo do século XX. Entre 1987 e 1990, durante o governo de Amazonino Mendes (1939-), foi feita a restauração e conclusão do projeto original do Teatro Amazonas. Dez anos depois, em 1997, foi realizado o I Festival de Ópera de Manaus e tiveram início os festivais de Teatro, Dança, Música, Rock, Jazz e Cinema.

Em 2015, foi indicado para tombamento como Patrimônio da Humanidade, pela ONU-Unesco. Em setembro de 2021, foi inaugurada no Teatro Amazonas uma exposição comemorativa de seus 125 anos, com a curadoria do artista plástico paraense Jandr Reis (1968-).

Link para todas as fotografias do Álbum Vistas de Manaus, de Georges Huebner, do acervo da Instituto Moreira Salles, uma das instituições fundadoras da Brasiliana Fotográfica. A fotografia destacada abaixo faz parte do álbum.

 

 

O Teatro Amazonas serviu como cenário para o filme Fitzcarraldo (1982), de Werner Herzog, e do desenho animado Rio 2 (2014). Vários artistas de destaque estiveram no palco do Teatro Amazonas, dentre eles o compositor Heitor Villa-Lobos (1887 – 1959), os cantores líricos Bidu Sayão (1902 – 1999) e José Carreras (1946-), a pianista Guiomar Novaes (1895 – 1979), o ator Procópio Ferreira (1898 – 1979), os cantores Caetano Veloso (1942-) e Gilberto Gil (1942-), além do grupo de rock norte-americano White Stripes.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Acervo Digital da UNESP

ARAÚJO, Emanuel (curador). Para nunca esquecer: negras memórias / memórias de negros. Rio de Jnaeiro : Museu Histórico Nacional, 2002.

Enciclopédia Itaú Cultural

Globoplay

Hemeroteca Digital daBiblioteca Nacional

MATOS, Geisimara Soares. Da província à corte: a trajetória do negro maranhense Eduardo Ribeiro, rumo ao Rio de Janeiro in Caderno de Progamação e Resumos II Seminário Internacional Histórias do Pós-Abolição do Mundo Atlântico, página 49, 2018.

MONTEIRO, Mário Ipyranga. Teatro Amazonas, 2ª edição. Amazonas : Valer, 2003.

Portal Iphan

SAMUEL, Rogel. Teatro Amazonas . Amazonas: Editora Eduá, 2012.

Site AmazonaAmazônia

Site CPDOC

Projeto de planta de site

Site Teatro Amazonas

Site Secretaria de Cultura e Economia Criativa Amazonas

VALLADARES, Clarival do Prado. Restauração e Recuperação do Teatro Amazonas. Amazonas : Governo do Estado do Amazonas, 1974.

 

Outros artigos publicados na Brasiliana Fotográfica sobre teatros e cinemas

 

Série O Rio de Janeiro desaparecido I Salas de cinema do Rio de Janeiro do início do século XXpublicado em 26 de fevereiro de 2016.

Os teatros do Brasil, publicado em 21 de março de 2016

A inauguração do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, publicado em 14 de julho de 2017

Cinema no Brasil – a primeira sessão e um pouco da história do Cinema Odeon, publicado em 8 de julho de 2021

Série “O Rio de Janeiro desaparecido” XII – O Teatro Lírico (Theatro Lyrico), publicado em 16 de setembro de 2021

O Theatro de Santa Isabel, publicado em 28 de outubro de 2021

O Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro, no Dia Mundial do Teatro, publicado em 27 de março de 2023

Dia do Cinema Brasileiro, publicado em 19 de junho de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXV – O Theatro Phenix, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado em 5 de setembro de 2023

O Theatro da Paz, em Belém do Pará, inaugurado em 15 de fevereiro de 1878, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado em 15 de fevereiro de 2024

 

Série “O Rio de Janeiro desaparecido” XV – A praia de Santa Luzia no primeiro dia do verão

No 15º artigo da série O Rio de Janeiro desaparecido, publicado no primeiro dia do verão de 2021, o tema é a praia de Santa Luzia, que ficava em frente à igreja homônima, no Centro da cidade e era uma das preferidas dos banhistas cariocas. A mais antiga imagem dessa praia disponível no acervo fotográfico da Brasiliana Fotográfica foi produzida em torno de 1866 pelo fotógrafo e editor suíço Georges Leuzinger (1813 – 1892).

 

 

Há ainda registros realizados por Augusto Malta (1864 – 1957)Juan Gutierrez (c. 1860 – 1897)Marc Ferrez (1843 – 1923)Revert Henrique Klumb (c. 1826 – c. 1886) e por Rodrigues & C°. Editores e Proprietários. A grande maioria das fotografias são da paisagem, mas há uma, de autoria de Gutierrez, de uma trincheira montada durante a Revolta da Armada, entre 1893 e 1894. Uma curiosidade: foi justamente durante uma outra revolta ocorrida no Brasil, a Guerra de Canudos, que Gutierrez faleceu. Em 28 de junho, foi mortalmente ferido (Jornal do Commercio, 13 de julho de 1897, na terceira coluna sob o título “Expedição de Canudos” e O Paiz, 7 de setembro de 1897, na primeira coluna).

 

 

Acessando o link para as fotografias da Praia de Santa Luzia disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

Voltando à praia de Santa Luzia. Em suas margens foi construída a Santa Casa da Misericórdia, em meados do século XVI.

 

 

Em 1898,  um dos pioneiros do cinema no Brasil, o ítalo-brasileiro Affonso Segreto (1875 – 19?), filmou o documentário A Praia de Santa Luzia, um de seus primeiros registros cinematográficos do Rio de Janeiro.

 

 

Até o início do século XX, a praia de Santa Luzia era uma opção de lazer no Rio de Janeiro, mas sua descaracterização começou, em 1905, quando o então prefeito Francisco Pereira Passos (1836 – 1913) mandou construir barracões que funcionariam como garagens para os barcos dos clubes de remo.

 

 

 

Durante o seu mandato, entre 1902 e 1906, Pereira Passos realizou uma extensa reforma urbana, tendo ordenado diversas demolições, conhecidas como a política do “bota-abaixo”, que contribuíram para o surgimento do Rio de Janeiro da Belle Époque. Entre as obras dessa época, foi aberta a avenida Beira Mar, que estendeu  a linha litoral do entroncamento da praia de Santa Luzia até o Largo da Glória.

 

 

Em 1922, com a derrubada do Morro do Castelo, foi construída a Esplanada do Castelo, diminuindo muito a faixa de areia da Praia de Santa Luzia. Foi substituída na preferência dos banhistas pela Praia das Virtudes, que ficava na altura da avenida Beira Mar entre a avenida Presidente Antônio Carlos e a rua Marechal Câmara, ao lado da praia de Santa Luzia (Correio da Manhã, 13 de janeiro de 1931, penúltima coluna).

 

O Globo, 12 de janeiro de 1931

O Globo, 12 de janeiro de 1931

 

Foi na década de 1930, que o que restava da praia de Santa Luzia e da Ponta do Calabouço desapareceram em consequência da ampliação do aterro, feito com entulho do desmanche do Morro do Castelo, para a construção do Aeroporto Santos Dumont, inaugurado oficialmente em 30 de novembro de 1936 com a presença do presidente da República, Getulio Vargas (1882 – 1954). Chamava-se anteriormente Aeroporto do Calabouço e teve seu nome alterado por ordem de Getulio para homenagear o Pai da Aviação (Diário Carioca, 20 de outubro de 1936, última coluna). O terminal de passageiros, projeto dos arquitetos Marcelo Roberto (1908-1964) e Milton Roberto (1914-1953), que venceram um concurso realizado pelo Ministério da Aeronáutica, ficou pronto em 1945.

 

 

 

 

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

ANDREATTA, Verena; CHIAVARI, Maria Pace; e REGO, Helena. O Rio de Janeiro e a sua orla: história, projetos e identidade carioca. Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, dezembro de 2009.

Diário do Rio de Janeiro

MELO, Victor Andrade. Remo, modernidade e Pereira Passos: primórdios das políticas públicas de esporte no Brasil. Revista do Núcleo de Estudos e Pequisas sobre Esporte e Sociedade – Universidade Federal Fluminense, julho/outubro de 2006

Rio Memórias

Site Infraero

 

Links para os outros artigos da Série O Rio de Janeiro desaparecido

 

Série O Rio de Janeiro desaparecido I Salas de cinema do Rio de Janeiro do início do século XXde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 26 de fevereiro de 2016.

Série O Rio de Janeiro desaparecido II – A Exposição Nacional de 1908 na Coleção Família Passos, de autoria de Carla Costa, historiadora do Museu da República, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 5 de abril de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido III – O Palácio Monroe, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 9 de novembro de 2016.

Série O Rio de Janeiro desaparecido IV - A via elevada da Perimetral, de autoria da historiadora Beatriz Kushnir, publicado na Brasiliana Fotográfica em 23 de junho de 2017.

Série O Rio de Janeiro desaparecido V – O quiosque Chopp Berrante no Passeio Público, Ferrez, Malta e Charles Dunlopde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portalpublicado na Brasiliana Fotográfica em 20 de julho de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VI – O primeiro Palácio da Prefeitura Municipal do Rio de Janeirode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de setembro de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VII – O Morro de Santo Antônio na Casa de Oswaldo Cruzde autoria de historiador Ricardo Augusto dos Santos da Casa de Oswaldo Cruzpublicado na Brasiliana Fotográfica em 5 de fevereiro de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VIII – A demolição do Morro do Castelode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portalpublicado na Brasiliana Fotográfica em 30 de abril de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido IX – Estrada de Ferro Central do Brasil: estação e trilhosde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de novembro de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido X – No Dia dos Namorados, um pouco da história do Pavilhão Mourisco em Botafogode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de junho de 2020.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XI – A Estrada de Ferro do Corcovado e o mirante Chapéu de Sol, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 22 de julho de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XII – o Teatro Lírico (Theatro Lyrico), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 15 de setembro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIII – O Convento da Ajuda, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de outubro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIV – O Conselho Municipal, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 19 de novembro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVI – O prédio da Academia Imperial de Belas Artes, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, publicado na Brasiliana Fotográfica em 13 de janeiro de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVII – Igreja São Pedro dos Clérigos, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 18 de março de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVIII – A Praça Onze, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 20 de abril de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIX – A Igrejinha de Copacabana, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 23 de junho de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XX – O Pavilhão dos Estados, futuro prédio do Ministério da Agricultura, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 26 de julho de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXI – O Chafariz do Largo da Carioca, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 19 de setembro de 2022. 

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXII – A Cadeia Velha que deu lugar ao Palácio Tiradentes, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 11 de abril de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXIII e Avenidas e ruas do Brasil XVII - A Praia e a Rua do Russel, na Glória, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 15 de maio de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXIV – O luxuoso Palace Hotel, na Avenida Rio Branco, uma referência da vanguarda artística no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 4 de julho de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXV – O Theatro Phenix, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 5 de setembro de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXVI – Conclusão do arrasamento do Morro do Castelo por Augusto Malta, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 14 de dezembro de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXVII e Série Os arquitetos do Rio de Janeiro V – O Jockey Club e o Derby Club, na Avenida Rio Branco e o arquiteto Heitor de Mello (1875 – 1920), de autoria de Andrea c. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, em 15 de janeiro de 2024

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XI – A Rua da Esperança, em São Paulo, por Vincenzo Pastore

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XI – A Rua da Esperança, em São Paulo, por Vncenzo Pastore

Na décima primeira publicação da Série “Avenidas e ruas do Brasil”, destacamos fotos do casario da Rua da Esperança, em São Paul,o em dois tempos: erguido e demolido. As imagens foram produzidas pelo fotógrafo italiano Vincenzo Pastore (1865 – 1918), que, da segunda metade do século XIX ao início do século XX, foi um importante cronista visual de São Paulo. Com sua câmara, Pastore capturava tipos e costumes de um cotidiano ainda pacato da cidade que logo, com o desenvolvimento econômico, mudaria de perfil. Captava as transformações urbanas e humanas de São Paulo, que passava a ser a metrópole do café.

Com seu olhar sensível, o imigrante italiano flagrava trabalhadores de rua como, por exemplo, feirantes, engraxates, vassoureiros e jornaleiros, além de conversas entre mulheres e brincadeiras de crianças. Pastore, ao retratar pessoas simples do povo, realizou, na época, um trabalho inédito na história da fotografia paulistana. Registrou cenas de ruas, de demolições em São Paulo com uma câmara de pequeno formato, produzindo imagens diferentes das realizadas, durante o século XIX, com câmeras de grande formato sobre tripés. Foi um dos pioneiros da nova linguagem da fotografia do século XX. Com a ferramenta zoom os leitores podem observar as imagens com detalhes.

 

 

Acessando o link para as fotografias da Rua da Esperança disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

A antiga igreja da Sé começou a ser demolida em 1912, e também em torno desse período foi realizada toda a reurbanização do local com a demolição de alguns quarteirões, sendo alguns da Rua da Esperança, necessários para se abrir uma esplanada diante do edifício religioso (Correio Paulistano, 3 de fevereiro de 1912, terceira coluna; Correio Paulistano, 22 de janeiro de 1913, penúltima coluna; Correio Paulistano, 25 de abril de 1913, terceira coluna).

 

 

Opinião de uma nonagenária sobre São Paulo

O progressão da Rua da Esperança é mencionado

O Pirralho, 25 de janeiro de 1913

 

O projeto da nova catedral foi do arquiteto alemão radicado no Brasil, Maximiliano Hehl (1861 – 1916), e, em 06 de julho de 1913, foi realizada a cerimônia de lançamento da pedra fundamental (Correio Paulistano, 7 de julho de 1913, segunda coluna). Porém a inauguração da Catedral Metropolitana de São Paulo só aconteceria em 1954 por ocasião do IV Centenário de São Paulo, porém foi simbólica, já que o prédio ainda não estava concluído (Correio Paulistano, 22 de janeiro de 1954, primeira coluna). As torres só  foram inauguradas em 15 de novembro de 1969.

 

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Dicionário de Ruas de São Paulo

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

 

Links para as outras publicações da série “Avenidas e ruas do Brasil”

 Série “Avenidas e ruas do Brasil” I – Avenida Central, atual Rio Branco, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 7 de setembro de 2016

Série “Avenidas e ruas do Brasil” II – A Rua do Imperador em Petrópolis por Klumb, Leuzinger e Stahl, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 26 de junho de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” III – A Rua do Bom Jesus, no Recife, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 6 de agosto de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” IV – A Rua 25 de Março, em São Paulo, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 1º de setembro de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” V – A Rua Direita, a Rua das Mercês e a Rua Macau do Meio, em Diamantina, Minas Gerais, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 22 de outubro de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” VI  – Rua Augusto Ribas e outras, em Ponta Grossa, no Paraná, pelo fotógrafo Luiz Bianchi, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 16 de novembro de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” VII – A Avenida Atlântica, em Copacabana, no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 23 de dezembro de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil VIII – A Rua da Carioca por Cássio Loredano, de autoria de Cássio Loredano, publicada em 20 de janeiro de 2021

Série “Avenidas e ruas do Brasil” IX – Ruas e panoramas do bairro do Catete, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 14 de julho de 2021

Série “Avenidas e ruas do Brasil” X – A Rua da Ajuda, no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 9 de novembro de 2021

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XII – A Avenida Paulista, o coração pulsante da metrópole, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 21 de janeiro de 2022

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XIII – A Rua Buenos Aires no Centro do Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 19 de julho de 2022

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XIV – A Avenida Presidente Vargas,, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 31 de agosto de 2022

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XV – Misericórdia: rua, largo e ladeira, no Rio de Janeiro, por Cássio Loredano, de autoria de Cássio Loredano, publicada em 8 de dezembro de 2022

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XVI – “Alguma coisa acontece no meu coração”, a Avenida São João nos 469 anos de São Paulo, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 25 de janeiro de 2023

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XVII  e série “O Rio de Janeiro desaparecido” XXIII – A Praia e a Rua do Russel, na Glória, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 15 de maio de 2023

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XVIII – Avenida Beira-Mar, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 22 de janeiro de 2024

 

 

 

A Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro

A Brasiliana Fotográfica destaca fotografias da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro produzidas por Augusto Malta (1864 – 1957), Juan Gutierrez (c.1860 – 1897), Marc Ferrez (1843 – 1923), Revert Henrique Klumb (c.1826 – c. 1886) e S.H. Holland (1883 – 1936).

 

 

Acessando o link para as fotografias da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

Apesar de haver discordâncias em torno do ano de sua fundação, os historiadores concordam que a Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro foi criada em meados do século XVI e teve forte influência do padre José de Anchieta (1534 – 1597), que a teria fundado ou  ampliado. Em 1967, a data de fundação foi oficialmente fixada em 24 de março de 1582.

 

 

Permanece no mesmo endereço: rua de Santa Luzia, inicialmente nº 2 e, atualmente, nº 206. Era regida pela Santa Casa de Lisboa, criada, em fins do século XV, pelo frei espanhol Miguel de Contreiras (1431 – 1505) com o apoio da rainha Dona Leonor (1458 – 1525), esposa do rei João II de Portugal (1455 – 1495). Tinha como objetivos acolher os presos, alimentar os pobres, curar os doentes, asilar os órfãos, sustentar as viúvas, enfim, ser a casa a serviço dos mais carentes, desassistidos e abandonados.

 

 

Foi durante a gestão de José Clemente Pereira (1787 – 1854) como provedor da Santa Casa, entre 1838 a 1854, que foi construído o complexo atual – hospital e capela – que está na rua Santa Luzia, 206. Com a presença de dom Pedro II (1825 – 1891), a pedra fundamental foi lançada, em 2 de julho de 1840, e a construção foi iniciada no ano seguinte (Diário do Rio de Janeiro, 2 de julho de 1840, última coluna).

 

 

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O hospital foi inaugurado em  julho de 1852 e sua planta original, de autoria do engenheiro Domingos Monteiro (1765 – 1857), foi alterada por José Maria Jacinto Rebelo (1821 – 1871), discípulo do arquiteto Grandjean de Montigny (1776 – 1850). O frontão da Santa Casa da Misericórdia, talvez o mais grandioso do Rio de Janeiro, foi executado, em 1868, pelo artista Luigi Guidice (1826 – 1892).

 

 

Sobre a data de fundação:

“A Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro foi fundada em meados do século XVI, em data incerta, na praia de Santa Luzia no 2, atual rua de Santa Luzia no 206, onde permanece até hoje. A sua criação costuma ser atribuída por vários estudiosos ao padre José Anchieta, da Companhia de Jesus, que chegara ao Brasil na esquadra do segundo governador-geral, Duarte da Costa, em 1553. Em março de 1582, Anchieta teria acudido a esquadra espanhola comandada pelo almirante Diogo Flores Valdez com destino ao Estreito de Magalhães, que aportara no Rio de Janeiro devido a enfermidades que acometeram sua tripulação. Providenciando agasalhos e remédios, o jesuíta, para abrigar os enfermos, mandara construir um barracão de palma coberto de sapé na orla marítima do morro do Castelo, que teria dado origem à Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro e, possivelmente, ao primeiro hospital da cidade.

Houve outros estudos, contudo, que consideraram a data de fundação da Santa Casa anterior a 1582. Segundo o historiador Félix Ferreira (1899), a instituição teria sido criada em 1545 ou 1547, antes da fundação da cidade do Rio de Janeiro (1565), coincidindo com os primeiros núcleos de povoamento das margens da Baía de Guanabara. No período da União Ibérica (1580-1640), em alvará datado de 6 de outubro de 1605, o rei Dom Felipe II de Espanha e I de Portugal concedia à entidade os mesmos benefícios desfrutados pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, em vista do que alegavam seu provedor e irmãos de que já havia sessenta anos que “existia casa com hospital para enfermos, sacristia, parlatório e é uma das boas da costa, e a algumas faz vantagem notável com sempre ter sua irmandade guardado o Compromisso, fazendo muitas esmolas, casando órfãs e dando ordinárias todos os sábados, conforme a possibilidade da terra”.

Já para Gabriel Soares de Sousa no “Tratado descritivo do Brasil”, em 1587, o hospital junto ao morro do Castelo teria sido iniciativa do terceiro governador-geral, Mem de Sá, com o apoio do padre da Companhia de Jesus, Manuel da Nóbrega. Em 1567, Mem de Sá em curta visita e permanência no Rio de Janeiro, depois da expulsão dos franceses, tratou não só do povoamento da cidade instalada por seu sobrinho, Estácio de Sá, em 1565, como promoveu importantes melhoramentos, entre os quais a construção de algumas igrejas com a sua Santa Casa da Misericórdia e hospital.

Ainda sobre a data de criação da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro, José Vieira Fazenda (1902) procurou conciliar as opiniões divergentes, admitindo que os primeiros povoadores tenham sido os fundadores da Misericórdia e que os irmãos desta, animados e auxiliados pelo jesuíta José de Anchieta, tenham edificado o hospital em 1582, com o propósito de nele abrigar os doentes da armada espanhola. De uma forma ou de outra, todos os que discorreram sobre o tema, concordaram que a Santa Casa surgiu ou foi ampliada nesta data, por influência de José de Anchieta.”

Site da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro

 

 

Sobre arquitetura e tombamento:

O Hospital da Santa Casa de Misericórdia foi construído no séc. XVI no Morro do Castelo.

IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
Nome atribuído: Hospital da Santa Casa de Misericórdia: prédio
Localização: R. Santa Luzia, nº 206, Centro – Rio de Janeiro – RJ
Número do Processo: 10-T-1938
Livro do Tombo Belas Artes: Inscr. nº 174, de 15/07/1938
Descrição: A cidade do Rio de Janeiro foi fundada em 1565 entre os Morros Cara de Cão e Pão de Açúcar e transferida para o antigo Morro do Castelo no ano de 1567. A Santa Casa de Misericórdia foi construída no século XVI na parte baixa, próxima ao mar e junto a uma das ladeiras que subiam para o seu cume, no mesmo local onde hoje ainda se encontra, como último vestígio do morro do Castelo. Não se sabe ao certo a data da sua construção, mas em 1582 os doentes da esquadra do Diogo Valdez foram nela acolhidos. No ano de 1734, um terceiro pavimento foi acrescentado.
Após a transferência do cemitério que existia junto à Santa Casa para o Caju, um novo prédio foi erguido para servir de hospital. A construção foi iniciada em 1840 e no ano de 1852 já estava funcionando. Seu projeto inicial, atribuído ao Tenente Coronel de Engenharia Domingos Monteiro, é, no entanto, discutido em função das alterações realizadas na fachada durante a construção pelo Arquiteto José Maria Jacinto Rabelo.
A fachada é caracterizada por linhas classicizantes. O pórtico central é composto, segundo o Arquiteto Augusto Silva Telles, por “um corpo com dupla colunata de cantaria, encimado por frontão, ornamentado com baixo relevos feitos por Luís Giudice.” No frontão do prédio, destacam-se o símbolo da Misericórdia ao centro, ladeado à esquerda pelos símbolos da Cristandade, e à direita, pelo da Medicina. A construção se divide em três alas paralelas, separadas por pátios e ligados entre si por um corpo transversal. Nas alas paralelas localizam-se as enfermarias.
No hospital, além das extensas barras de azulejos holandeses, encontrados nos corredores de circulação e nas escadas, é notável a imensa galeria de retratos dos benfeitores, na qual se destacam grande número de telas setecentistas das mais antigas do acervo carioca. O seu interior abriga uma capela, cujo projeto é atribuído ao Arquiteto Joaquim Cândido Guilhobel e decorada com trabalhos de talha de Antônio de Pádua e Castro.
Observações: O tombamento compreende as antigas enfermarias. No hospital foi instalado o Museu da Farmácia.
Fonte: Iphan.

INEPAC – Instituto Estadual do Patrimônio Cultural
Nome atribuído: Hospital Geral da Santa Casa da Misericórdia
Localização: R. Santa Luzia, nº 206, Centro – Rio de Janeiro – RJ
Número do Processo: E-18/001/549/2015
Tombamento Provisório: 25/05/2015
Inventário Inepac
Descrição: O Complexo Hospitalar da Santa Casa da Misericórdia situa-se no Centro da Cidade do Rio de Janeiro, nas proximidades de outros bens tombados pelo Estado do Rio de Janeiro: Ladeira da Misericórdia, Museu da Imagem e do Som e Prédio do Tribunal Regional do Trabalho. Originalmente, a Misericórdia se situava ao sopé do antigo Morro do Descanso, depois denominado Morro do Castelo, no local onde hoje se encontram as antigas enfermarias e a Igreja de Nossa Senhora de Bonsucesso, na Ladeira da Misericórdia. O prédio principal do Hospital Geral se destaca na paisagem por sua imponência de gosto neoclássico, com frontão triangular, onde está inserido o brasão da Ordem da Irmandade da Misericórdia. Voltado para a Rua Santa Luzia, este complexo, que ocupa quase a totalidade da quadra, se estende até a Rua Marechal Aguinaldo Caiado de Castro. Ladeando o prédio da Santa Casa, ainda se encontra um casario baixo que preserva sua imponência.
Fonte: Inepac.

 Site I Patrimônio

 

Uma curiosidade: em seu romance, A Viuvinha, de 1857, José de Alencar (1829 – 1877), comenta sobre o grande numero de suicídios ocorridos durante a construção da Santa Casa da Misericórdia:

“O Rio de Janeiro ainda se lembra da triste celebridade que, há dez anos, tinha adquirido o lugar onde está hoje construído o Hospital da Santa Casa. Houve um período em que quase todas as manhãs os operários encontravam em algum barranco, ou entre os cômoros de pedra e de areia, o cadáver de um homem que acabara de pôr termo à sua existência. 

Amantes infelizes, negociantes desgraçados, pais de família carregados de dívidas, homens ricos caídos na miséria, quase todos aí vinham, trazidos por um ímã irresistível, por uma fascinação diabólica. 

As Obras da Misericórdia, como chamavam então esse lugar, tinham a mesma reputação que o Arco das Águas Livres, de Lisboa, e a Ponte Nova, de Paris. 

Era o templo do suicídio, onde a fragilidade humana sacrificava em holocausto a esse ídolo sanguinário tantas vítimas arrancadas às suas famílias e aos seus amigos.

Essa epidemia moral, que se agravava todos os dias, começava já a inquietar alguns espíritos refletidos, alguns homens pensadores, que viam com tristeza os progressos do mal”. 

 

 

Link para o artigo O Hospital Geral da Misericórdia, de Escragnolle Dória, publicado na Revista da Semana, de 26 de novembro de 1938.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

 

CAMPOS, Ernesto de Souza. Santa Casa de Misericórdia de Santos: primeiro hospital fundado no Brasil; sua origem e evolução 1543-1943. São Paulo: Elvino Pocai, 1943

Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832 – 1930) Casa de Oswaldo Cruz / Fiocruz

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

I Patrimônio

Site Alma Carioca

Site Missão das Misericórdias

Site O Rio que o rio não vê

Site Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro