Série “O Rio de Janeiro desaparecido” XXVI – Conclusão do arrasamento do Morro do Castelo por Augusto Malta

O Morro do Castelo já foi tema de um artigo da Brasiliana Fotográfica, publicado em 30 de abril de 2019, Série “O Rio de Janeiro desaparecido” VIII – A demolição do Morro do Castelo. Hoje o portal volta ao assunto com a publicação de 18 fotografias, recentemente inseridas no nosso acervo fotográfico, da conclusão do arrasamento do Morro do Castelo produzidas pelo alagoano Augusto Malta (1864 – 1957), que foi o fotógrafo oficial da prefeitura do Rio de Janeiro, de 1903 a 1936, e o principal fotógrafo da transformação urbana carioca nas primeiras décadas do século XX, período de grandes mudanças na cidade, dentre elas uma importante intervenção na paisagem natural carioca: justamente a demolição do Morro do Castelo.

 

 

O Morro do Castelo representava o passado colonial do Rio de Janeiro e era parte da história de sua própria fundação, ocorrida em 1565, no Morro Cara de Cão. A cidade foi reinstalada, dois anos depois, no Morro do Castelo, então denominado Morro do Descanso. A escolha do ponto, da onde se via a Baía de Guanabara, sua porta de entrada, foi estratégico para a defesa da cidade em caso de possíveis futuros ataques. Murado e fortificado, o Rio de Janeiro no Morro do Castelo passou a abrigar a Casa do Governador, a Casa da Câmara, a Cadeia, o Colégio dos Jesuítas, o Convento dos Capuchinhos, armazéns e igrejas, dentre elas a Igreja de São Sebastião, inaugurada, em 1583, mesmo ano em que os restos mortais de Estácio de Sá (1520 – 1567), fundador do Rio de Janeiro, foram trasladados para lá. A última missa na Igreja de São Sebastião foi celebrada em 1º de novembro de 1921. Esses prédios formavam um importante conjunto arquitetônico, destruído, entre 1921 e 1922, com o arrasamento do Morro do Castelo. O acesso ao morro era feito a partir da Ladeira da Misericórdia.

 

 

 

Acessando o link para as fotografias da conclusão do arrasamento do Morro do Castelo produzidas por Augusto Malta e disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

 

O Morro do Castelo tinha 63 metros de altura, ocupava uma área de cento e oitenta e quatro mil metros quadrados e seus limites eram as atuais avenida Rio Branco (antiga avenida Central), as ruas Santa Luzia, Misericórdia e São José.

Já em 1838, os engenheiros militares Conrado Niemeyer (1831 – 1905) e Pedro Bellegarde (1807 – 1864) defendiam em um projeto o desmonte do Morro: “Edifícios nobres deverão um dia substituir aquele morro; e o navegante que demandar o importante porto capital do Brasil receberá na sua entrada a agradável impressão da vista de toda a cidade, até hoje encoberta a seus olhos pela massa informe do mesmo morro”.

Mas foi em 1904 que parte do Morro do Castelo foi demolida para a construção da Avenida Central, cuja abertura foi uma das principais marcas da reforma urbana realizada por Francisco Pereira Passos (1836 – 1913), o bota-abaixo, entre 1902 e 1906, período em que foi prefeito do Rio de Janeiro. Essas transformações foram definidas por Alberto Figueiredo Pimentel (1869-1914), autor da seção “Binóculo”, da Gazeta de Notícias, com a máxima “O Rio civiliza-se”, que se tornou o slogan da reforma urbana carioca. O morro passou a ter como limites os fundos da Biblioteca Nacional e a Escola de Belas Artes. Quando estavam se realizando as obras para a abertura da avenida, uma galeria foi descoberta e por ela se chegaria a túneis subterrâneos, onde os jesuítas, quando expulsos, em 1759, pelo Marques de Pombal (1699 – 1782), teriam escondido suas riquezas. Essa crença passou a existir no imaginário urbano do Rio de Janeiro, e seus habitantes passaram a temer que a demolição do morro dificultasse a descoberta desses supostos tesouros.

A segunda etapa de sua demolição foi determinada pelo prefeito Carlos Sampaio (1861 – 1930), em 17 de agosto de 1920, quando assinou um decreto que autorizava seu desmonte (Jornal do Brasil, 18 de agosto, quinta coluna). A decisão foi baseada, segundo o governo, na necessidade de higienização e modernização da cidade. O morro foi literalmente por água abaixo, demolido por incessantes jatos d´água. A terra do morro foi usada no aterro da Avenida Beira-Mar, levado até a Ilha de Villegaignon, onde depois foi construído o Aeroporto Santos Dumont; da Lagoa Rodrigo de Freitas e no aterro dos charcos e pântanos do Jardim Botânico.

 

 

A derrubada causou muita polêmica, tendo sido criticada por vários intelectuais como Monteiro Lobato (1882 – 1948) e Lima Barreto (1881 – 1922), porém saudada por personalidades importantes como o sanitarista Belisário Pena (1868 – 1939). Na área deixada por seu desmonte foram construídos pavilhões da Exposição Internacional do Centenário da Independência, aberta em 7 de setembro de 1922. Em setembro de 1921, havia no morro 4200 moradores distribuídos em 408 prédios. Eram trabalhadores e pobres e seriam instalados, inicialmente, em barracos na Praça da Bandeira.

 

 

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

BARROS, Paulo Cezar de. Onde nasceu a cidade do Rio de Janeiro? ( um pouco da história do Morro do Castelo)Revista geo-paisagem (online ) Vol. 1, número 2, julho/dezembro de 2002

Blog do Jornal do Brasil, 9 de março de 2011

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

LOBATO, Monteiro. Onda Verde. São Paulo: Monteiro Lobato e C., 1921.

MENEZ, Alexssandro. Civilização versus barbárie: a destruição do Morro do Castelo no Rio de Janeiro (1905-1922). Revista Historiador Número 06. Ano 06. Janeiro de 2014.

MOTTA, Marly Silva da. A nação faz cem anos: a questão nacional no centenário da independência. Rio de Janeiro: Editora FGV: CPDOC, 1992.

NONATO, José Antônio Era uma vez o Morro do Castelo. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2000.

PAIXÃO, Cláudia Míriam Quelhas. O Rio de Janeiro e o morro do Castelo: populares, estratégias de vida e hierarquias sociais (1904-1922). Dissertação de mestrado. Niterói: UFF, 2008.

Site do Diário do Rio

Site do CPDOC

 

Links para os outros artigos da Série O Rio de Janeiro desaparecido

 

Série O Rio de Janeiro desaparecido I Salas de cinema do Rio de Janeiro do início do século XXde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 26 de fevereiro de 2016.

Série O Rio de Janeiro desaparecido II – A Exposição Nacional de 1908 na Coleção Família Passos, de autoria de Carla Costa, historiadora do Museu da República, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 5 de abril de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido III – O Palácio Monroe, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica, em 9 de novembro de 2016.

Série O Rio de Janeiro desaparecido IV - A via elevada da Perimetral, de autoria da historiadora Beatriz Kushnir, publicado na Brasiliana Fotográfica em 23 de junho de 2017.

Série O Rio de Janeiro desaparecido V – O quiosque Chopp Berrante no Passeio Público, Ferrez, Malta e Charles Dunlopde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portalpublicado na Brasiliana Fotográfica em 20 de julho de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VI – O primeiro Palácio da Prefeitura Municipal do Rio de Janeirode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de setembro de 2018.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VII – O Morro de Santo Antônio na Casa de Oswaldo Cruzde autoria de historiador Ricardo Augusto dos Santos da Casa de Oswaldo Cruzpublicado na Brasiliana Fotográfica em 5 de fevereiro de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido VIII – A demolição do Morro do Castelode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portalpublicado na Brasiliana Fotográfica em 30 de abril de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido IX – Estrada de Ferro Central do Brasil: estação e trilhosde autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de novembro de 2019.

Série O Rio de Janeiro desaparecido X – No Dia dos Namorados, um pouco da história do Pavilhão Mourisco em Botafogode autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de junho de 2020.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XI – A Estrada de Ferro do Corcovado e o mirante Chapéu de Sol, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 22 de julho de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XII – o Teatro Lírico (Theatro Lyrico), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 15 de setembro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIII – O Convento da Ajuda, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 12 de outubro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIV – O Conselho Municipal, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 19 de novembro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XV – A Praia de Santa Luzia no primeiro dia do verão, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 21 de dezembro de 2021.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVI – O prédio da Academia Imperial de Belas Artes, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, publicado na Brasiliana Fotográfica em 13 de janeiro de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVII – Igreja São Pedro dos Clérigos, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 18 de março de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XVIII – A Praça Onze, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 20 de abril de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XIX – A Igrejinha de Copacabana, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 23 de junho de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XX – O Pavilhão dos Estados, futuro prédio do Ministério da Agricultura, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 26 de julho de 2022.

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXI – O Chafariz do Largo da Carioca, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 19 de setembro de 2022. 

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXII – A Cadeia Velha que deu lugar ao Palácio Tiradentes, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicado na Brasiliana Fotográfica em 11 de abril de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXIII e Avenidas e ruas do Brasil XVII A Praia e a Rua do Russel, na Glória, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 15 de maio de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXIV – O luxuoso Palace Hotel, na Avenida Rio Branco, uma referência da vanguarda artística no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 4 de julho de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXV – O Theatro Phenix, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 5 de setembro de 2023

Série O Rio de Janeiro desaparecido XXVII e Série Os arquitetos do Rio de Janeiro V – O Jockey Club e o Derby Club, na Avenida Rio Branco e o arquiteto Heitor de Mello (1875 – 1920), de autoria de Andrea c. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, em 15 de janeiro de 2024

 

 

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