No último dia do verão, o céu e o sol do Rio de Janeiro por Guilherme Santos

A Brasiliana Fotográfica celebra o fim do verão, a estação do ano mais carioca, e o início do outono, destacando uma bela imagem do sol brilhando em um céu encoberto por nuvens, entre o Morro da Urca e o Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro. A estereoscopia foi produzida pelo fotógrafo amador Guilherme Santos (1871 – 1966),  em torno de 1915.

 

 

Guilherme Santos era um entusiasta da fotografia estereoscópica, tendo sido um dos pioneiros dessa técnica no Brasil, ao adquirir, em 1905, na França, o Verascope, um sistema de integração entre câmera e visor, que permitia ver imagens em 3D, produzidas a partir de duas fotos quase iguais, porém tiradas de ângulos um pouco diferentes. Eram impressas em uma placa de vidro e reproduziam a sensação de profundidade de maneira bem próxima da visão real. Antes dele, entre os anos de 1855 e 1862, o “Photographo da Casa Imperial”, Revert Henrique Klumb (1826 – c. 1886), favorito da imperatriz Teresa Christina e professor de fotografia da princesa Isabel, havia produzido vários registros utilizando a técnica da estereoscopia. A Casa Leuzinger também produziu fotografias estereoscópicas.

 

“Photographia Estereoscópica”

Por Guilherme A Santos

Photo Revista do Brasil, vol 1, maio de 1925, pg 14

“Confeccionar uma photographia é quasi sempre reconstruir uma recordação!

Nenhuma outra photographia trabalhada pelos processos conhecidos, pôde dar-nos tamanha satisfação, produzir-nos impressão tão viva  e tão nitida daquilo que quizermos recordar como a photographia estereoscopica! Seja o retracto de um ente querido, seja uma paysagem, ou ainda uma reunião de família, cujo objecto exprima um momento feliz da nossa existencia!

A sensação do relevo e da perspectiva que nos dá um positivo sobre vidro, copia de um cliche estereoscopico, introduzido no instrumento apropriado, é inegualavel! inconfundivel! incomparavel!

Ao olhar, apresentam-se as imagens das creaturas, da Natureza ou dos objectos, com a expressão a mais perfeita e verdadeira , mostrando-nos em destaque todos os planos que as objectivas colheram na extensão do angulo focal!

Como passa tempo, o que é possível de encontrar que seja mais agradável, mais divertido do que os positivos sobre vidro da photoestereoscopia!?

Reunidos em família e acompanhados de bons amigos sentados em redor de uma mesa, passa-se de mão em mão o apparelho estereoscópicos exibindo as differentes séries de positivos! Algumas, despertando recordações aos que, num afogar de saudades revêem os bons momentos que passaram, contemplando imagens de creaturas que talvez nunca mais encontrem no caminho da vida e que fizeram a delícia daqueles momentos, em uma estação de águas, em uma excursão, em cidades de verão, a bordo de um transatlântico, na convivência íntima de uma longa viagem, etc.

Outras séries apresentando o esplendor da Natureza em grandes quadros compostos com senso esthético, com observação artística que estasiam, que empolgam e que nunca cançaríamos de contemplar são photografias que provam como é impossível negar o extraordinário poder que tem a natureza, de impressionar e fazer vibrar a alma das creaturas com suas majestosas creações!

Nesse particular a nossa terra recebeu do CREADOR um dote precioso, o qual infelizmente em vez de ser transportado para as chapas da photographia por meio das objectivas dos differentes apparelhos, tem o homem esbanjado e destruido quasi inconscientemente sem considerar o grande mal que causa ao bem commum e sem reflectir no crime que pratica!

Disse PAULO MANTEGAZZA, capitulo IV no “O LIVRO DAS MELANCHOLIAS” de uma forma encantadora e com a alma amargurada: que se conhecesse DEUS, dir-khe-hia que na sua infinita misericordia, perdoasse todos os peccados dos homens e reservasse toda a sua ira, toda as suas vinganças, tododos seus raios, para o homem que destróe uma “FLORESTA”!!…

Faço minhas as palavras do primoroso escriptor, mas accrescento que o homem que dedicar-se á photographia, de preferenciaa estereoscopica, no contacto intimo e constante que ele tiver com a NATUREZA, quando a tiver estudado bem, irá lentamente habituando-se a apreciar devidamente a sua obra grandiosa, sentirá despertar em sua alma, sentimentos delicadosque até então desconhecia e difficilmente será capaz de derrubar uma arvore ou consentir que alguem o faça em sua presença!

A falta de amor e o abandono ás nossa bellezas naturaes é patente! Cito um exemplo mui recente:

Por uma destas lindas manhãs de ABRIL (era dia feriado) percorremos uma parte da estrada que liga o ALTO DA BOA VISTA ao SUMARÉ.

É uma das maravilhas da TIJUCA! A vegetação é abundante e variada e conta-se ás dezenas, arvores gigantescas cujas ramadas projectam sombras extensas sobre o caminho!

O sol imprimia uma luz de oiro sobre o verde esmeralda do arvoredo e fazia pensar que foi a NATUREZA quem inspirou os nossos antepassados sobre a escolha das cores para a nossa bandeira!

Caminhamos cerca de 6 kilometros ida e volta e gastamos cerca de 5 horas. Pois bem, nesse demorado percurso, cruzamos com 3 outros grupos de excursionistas, todos elles, compunham-se de estrangeiros!

Nem um brasileiro! nem um amador da photographia! Digo, encontramos um brasileiro, que empunhando uma vara que tinha um sacco de gaze preso a uma das extremidades, caçava as lindas borboletas azues de grandes azas que faziam o encanto daquellas paragens! aquelle rapaz de 20 annos presumives, de bella estaturaphysica, fazia-o como meio de vida! Contamos estendidas sobre um jornal, 20 daquellas borboletas, apanhadas em menos de uma hora! Pobrezinhas! a  NATUREZA limitou-lhes curtíssima existência, nem mesmo a essas deixam viver!

Creio ser o momento de ser transformada essa situação. A Photo-Revista vem preencher uma lacuna e acreditamos que uma campanha sustentada com perseverança por todos os seus collaboradores, daria bom resultado, no sentido de desenvolver o gosto dos brasileiros pela arte photographica: talvez conseguíssemos convence-los de trocar uma ou outra vez (às horas de ócio) os encantos do lar doméstico, pelos encantos naturaes, lembrando-lhes que em companhia de nossa família e em contacto com a floresta, também construímos lares provisorios sob a benção da mãe de tudo e de todos que é a NATUREZA!

 

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

Dia Internacional das Pessoas Idosas e Dia Nacional do Idoso

O dia 1º de outubro é o Dia Internacional das Pessoas Idosas e também o Dia Nacional do Idoso. Para homenagear as datas, a Brasiliana Fotográfica destaca a imagem As cantigas do vovô, produzida, em torno de 1900, pelo fotógrafo amador e fotoclubista gaúcho Lunara (1864 – 1937). O registro mostra um idoso cantando e tocando violão alegremente para duas crianças, que o olham com admiração e atenção. A foto exprime a ternura de um momento de interação entre um vovô e seus netos, entre a terceira idade e a infâncianos envolvendo numa atmosfera amorosa, respeitosa e, até, nostálgica.

 

 

A fotografia faz parte do álbum Vistas de Porto Alegre – Fotografias Artísticas, produzido pelos Editores Krahe & Cia com 20 imagens assinadas por Lunara, um dos pseudônimos de Luiz Nascimento Ramos – formado a partir das primeiras sílabas de seus três nomes e que ele usava para expor suas fotos e também para participar de concursos fotográficos. Ele foi um participante ativo da vida cultural e econômica de Porto Alegre e adotou a fotografia como um hobby.

As imagens deste álbum fotográfico nos revelam uma Porto Alegre bucólica de fins do século XIX, início do século XX. Segundo  Denise Burges Stumvoll, mestre em Artes Visuais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e autora da dissertação Fotografia e aproximações com a arte no início do século xx : um olhar para as narrativas visuais de Lunara, o álbum Vistas de Porto Alegre:

propõe um percurso realizado pelo fotógrafo, em que somos conduzidos pelas bordas e margens da cidade, bem como aos lugares e às pessoas que ali viveram, como se interessasse, ao autor das imagens, produzir uma metáfora da marginalidade, social e cultural, revelando o que geralmente ficava à sombra da memória visual sobre a modernidade na paisagem urbana.

 

Acessando o link para as fotografias de Lunara disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas. 

 

Alguns dos temas mais abordados nas fotografias de Lunara foram os ex-escravizados, cenas de família, os carreteiros, as aguadeiras e os viajantes. Seus registros eram influenciados pelo movimento pictorialista internacional, movimento que se desenvolveu a partir do surgimento dos fotoclubes e que caracterizava-se pelo resultado da fotografia, que se aproximava da pintura. Em suas imagens, Lunara, com um olhar artístico que acentuava aspectos bucólicos, mostrava seu universo familiar com sensibilidade e humor.

 

Um pouco sobre o Dia Internacional das Pessoas Idosas e do Dia Nacional do Idoso

 

O dia 1º de outubro foi designado como o Dia Internacional das Pessoas Idosas pela Assembleia das Nações Unidas, em 14 de dezembro de 1990. Isso foi precedido por iniciativas como o Plano de Ação Internacional de Viena sobre o Envelhecimento, que foi adotado pela Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento de 1982 e endossado mais tarde naquele ano pela Assembleia Geral da ONU. Em 1991, a Assembléia Geral adotou os Princípios das Nações Unidas para Pessoas Idosas (resolução 46/91). Em 2002, a Segunda Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento adotou o Plano de Ação Internacional de Madri sobre o Envelhecimento, para responder às oportunidades e desafios do envelhecimento da população no século XXI e promover o desenvolvimento de uma sociedade para todas as idades (Site da ONU).

Em 1º de outubro de  2003, foi criado, no Brasil, o Estatuto do Idoso, pela Lei nº 10.741 para viabilizar políticas públicas às pessoas idosas. Três anos depois, em 2006, a Lei nº 11.433 instituiu, no país, o Dia Nacional do Idoso. Anteriormente, a data, estabelecida, em 1999, pela Comissão pela Educação, do Senado Federal, era comemorada no dia 27 de setembro.

 

Art. 1º Fica instituído o Dia Nacional do Idoso, a ser celebrado no dia 1º de outubro de cada ano.

Parágrafo único. Os órgãos públicos responsáveis pela coordenação e implementação da Política Nacional do Idoso ficam incumbidos de promover a realização e divulgação de eventos que valorizem a pessoa do idoso na sociedade.

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 28 de dezembro de 2006; 185º da Independência e 118º da República.

 

A Assembleia Geral da ONU proclamou, em 14 de dezembro de 2020, os anos entre 2021 e 2030 como a Década do Envelhecimento Saudável das Nações Unidas, uma colaboração global, alinhada aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que reúne governos, sociedade civil, agências internacionais, profissionais, academia, mídia e iniciativa privada, em prol de melhorias para a vida dos idosos, de suas famílias e das comunidades onde vivem (Biblioteca Virtual em Saúde).

A composição da população mundial mudou significativaamente nas últimas décadas e a expectativa de vida em todo o mundo subiu de 46 para 68 anos. Mais de 8% da população tinha 65 anos ou mais em 2020. Em 2050, a população de idosos deverá atingir mais de 1,5 bilhão de pessoas, sendo que 80% delas viverão em países de baixa e média renda. O Dia Internacional das Pessoas Idosas tem como objetivo prestar uma homenagem aos idosos e também conscientizar e sensibilizar a sociedade sobre as necessidades destas pessoas.

Esta foi a mensagem do secretário-geral das Nações Unidas, o português António Manuel de Oliveira Guterres (1947-) na última celebração do Dia Internacional de Pessoas Idosas, em 1º de outubro de 2022:

Neste Dia Internacional das Pessoas Idosas, focamos a atenção na resiliência de mais de mil milhões de mulheres e homens idosos num mundo em mudança.

Os últimos anos testemunharam reviravoltas dramáticas – e as pessoas idosas estão muitas vezes no epicentro das crises. Eles são particularmente vulneráveis ​​a uma série de desafios, incluindo a pandemia da Covid -19, o agravamento da crise climática, a proliferação de conflitos e a pobreza crescente.

No entanto, perante estas ameaças, os idosos inspiraram-nos com a sua notável resiliência. Em 2030, 1,4 mil milhões de pessoas terão pelo menos 60 anos.

A nossa tarefa enquanto sociedades e enquanto comunidade global é enfrentar os desafios da longevidade – e promover o seu potencial. Devemos promover a inclusão social, económica e política de todas as pessoas em todas as idades.

Esta promessa está consagrada nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Aprendizagem ao longo da vida, proteção social forte, cuidados de saúde a longo prazo acessíveis e de qualidade, redução do fosso digital, apoio intergeracional, dignidade e respeito são essenciais.

Os idosos são uma tremenda fonte de conhecimento e de experiência. Devemo-nos esforçar para garantir o seu envolvimento ativo, participação plena e contribuições essenciais.

Juntos, vamos construir sociedades mais inclusivas e amigas dos idosos e um mundo mais resiliente.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Site Biblioteca Virtual em Saúde – Ministério da Saúde

Site ONU

Site Organização Pan-Americana da Saúde – Opas

WANDERLEY, Andrea. Lunara (1864 – 1937), um fotógrafo amador e fotoclubista de Porto Alegre in Brasiliana Fotográfica, 5 de setembro de 2018.

 

Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência

Com fotografias em formato cabinet*  de autoria de João Xavier de Oliveira Menezes, o J. Menezes (18? – 19?), pertencentes ao acervo da Fundação Biblioteca Nacional, uma das instituições fundadoras da Brasiliana Fotográfica; e com um pequeno histórico do Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, o portal celebra esta data.

 

 

 

Pequeno histórico do Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência

 

O Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, que coincide com o início da primavera, dia 21 de setembro, e simboliza o nascimento e a renovação do movimento das pessoas com deficiência, foi instituído pela Lei nº 11.133/2005, de 14 de julho de 2015. Seu objetivo é a conscientização da população brasileira de que pessoas com deficiência devem ter seus direitos respeitados e devem ser integradas à sociedade sem preconceitos, de forma igualitária. De acordo com o IBGE, no Brasil, 17,3 milhões de pessoas com dois anos ou mais de idade – o que representa 8,4% da população – possuem algum tipo de deficiência.

 

 

Segundo a Lei Brasileira de Inclusão de Pessoa com Deficiência, também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, de 2015, a pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. 

Existe, há relativamente pouco tempo, o conceito de capacitismo, sobre a discriminação em relação a pessoas com deficiência, a partir da subestimação da capacidade e aptidão dessas pessoas devido a suas deficiências, o que se traduz como um obstáculo à inclusão desses indivíduos à sociedade. Além disso, cada vez mais pessoas com deficiência trazem à sociedade um questionamento: seriam elas deficientes ou seria deficiente a sociedade que não satisfaz às necessidades de todas as pessoas que a formam?

O Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência foi oficializado, como já mencionado, em 2005, porém a data já era celebrada desde 1982 por iniciativa do Movimento pelos Direitos das Pessoas com Deficiência. O grupo começou a se organizar em fins de 1979 para reivindicar direitos e melhorias para a vida das pessoas com deficiência.

 

 

Legislação brasileira em relação a pessoas com deficiência:

Lei n° 7.713/1998: garante a dedução do Imposto de Renda para pessoas com deficiência.

Lei nº 7.853/1989: dispõe sobre o apoio às pessoas com deficiência e sua efetiva integração social.

Lei nº 8.213/1991: ordena que, a partir de 100 empregados, a empresa deve reservar de 2% a 5% de vagas para pessoas com deficiência.

Lei nº 8.899/1994: a Lei do Passe Livre prevê que toda pessoa com deficiência tenha direito ao transporte coletivo interestadual gratuito, e que cabe a cada estado ou município implantar programas similares ao Passe Livre para os transportes municipais e estaduais.

Lei nº 8.989/1995promove a isenção do imposto sobre produtos industrializados – IPI, na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de passageiros, bem como conduzidos pelas próprias pessoas com deficiência física, e dá outras providências. (Redação dada pela Lei Nº 10.754, de 31.10.2003).

Lei nº 9.394/1996: Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Determina que “haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial e que o atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular”. A legislação brasileira também prevê o acesso a livros em Braille, de uso exclusivo das pessoas com deficiência visual.

Lei nº 10.098/2000: normatiza as condições de acessibilidade.

Lei nº 10.436/2002: reconhece a Língua Brasileira da Sinais (LIBRAS) para os surdos.

Lei nº 10.754/2003: altera a Lei Nº 8.989, de 24 de fevereiro de 1995 que “dispõe sobre a isenção do Imposto Sobre Produtos Industrializados – IPI, na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de passageiros, bem como por pessoas com deficiência física e aos destinados ao transporte escolar.

Lei nº 11.126/2005: garante o direito da pessoa com deficiência visual de ingressar e permanecer em ambientes de uso coletivo acompanhado de cão-guia.

Lei nº 12.319/2010: regulamenta a profissão de Tradutor e Intérprete da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS.

Lei 13.146/2015: a Lei Brasileira de Inclusão de Pessoa com Deficiência, também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, incorporou os princípios da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, realizada em 2006, pela Organização das Nações Unidas (ONU) e ratificada pelo país em 2008.

 

Pequeno perfil de João Xavier de Oliveira Menezes, o J. Menezes (18? – 19?)

 

Apesar de não sabermos onde e quando João Xavier de Oliveira Menezes, o J. Menezes, nasceu e faleceu, há registros de sua atuação como fotógrafo a partir de 1875, no Rio de Janeiro, na rua da Quitanda, nº 39. Era filho do comendador Thomaz Xavier Ferreira de Menezes e seus irmãos eram Francisco, Eurydice, Thomaz e Carlos Xavier de Oliveira Menezes; e Rita Augusta de Menezes Pinho (Jornal do Commercio, 2 de novembro de 1891, sexta colunaO Paiz, 13 de setembro de 1896, sexta coluna).

 

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Acervo IMS

 

Em 1876, foram realizadas obras em seu estúdio fotográfico e anunciado que já estava a disposição de nosso amigos e fregueses (Gazeta de Notícias, 27 de agosto de 1876).

 

 

Até 1882, foi associado, na firma Pacheco, Menezes & Irmão, a seu irmão, Carlos e a Bernardo José Pacheco (18? -?), que havia sido, entre 1866 e 1874, associado ao fotógrafo açoriano Christiano Junior (1802 – 1902). Apresentavam-se como sucessores de Christiano Junior & Pacheco e ofereciam retratos em todos os systemas (Jornal do Commercio, 3 de dezembro de 1866Gazeta de Notícias, 8 de agosto de 1875Diário do Rio de Janeiro, 9 de novembro de 1875, sexta colunaAlmanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro, 1875 1876187718781879188018811882). Lembramos que Christiano Jr. foi o autor da série Elephansiasis, realizada na década de 1860. Como já indagado no artigo, Para uma história da fotografia médica, no Brasil, de autoria de Joaquim Marçal Ferreira de Andrade, um dos curadores da Brasiliana Fotográfica, teria sido J. Menezes o sucessor de Christiano Junior no atendimento à classe médica da corte?

 

Acessando o link para as fotografias de autoria de J. Menezes disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas. 

 

O estabelecimento passou a chamar-se Menezes & Irmão (Gazeta de Notícias, 13 de junho de 1882, última coluna; Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro, 1884).

 

 

Ainda em 1882, anunciavam Photographia e Pintura e, em 1883, anunciavam uma Grande Novidade:

 

 

 

Em 1883,  foram lidas proclamas de seu casamento com Virgilia Adelaide Mendes Calaza (Gazeta de Notícias, 29 de dezembro de 1893, terceira coluna). Em 1884, com o falecimento de seu irmão e sócio Carlos, foi extinta a firma Menezes & Irmão e J. Menezes passou a atuar por conta própria, ainda na Rua da Quitanda, nº 39 (Jornal do Commercio, 26 de agosto de 1884, sétima coluna; Jornal do Commercio, 3 de outubro de 1884, última coluna). Residia na Rua do Souto, 16.

Foi na década de 1880, que J. Menezes produziu as fotos de pessoas com deficiência exibidas neste artigo.

Nos primeiros anos da década de 1890, seu estabelecimento fotográfico ficava na rua Marquês de Paraná, 1. O último registro de sua atividade como fotógrafo encontrada pela minha pesquisa data de 1902 (Gazeta de Notícias, 13 de junho de 1884, terceira colunaJornal do Commercio, 3 de outubro de 1884, última colunaAlmanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro, 188518911892, 1898190019011902).

Em 1902, seu filho Augusto (1901 – 1902) faleceu (Jornal do Commercio, 10 de julho de 1902, sexta coluna).

 

 

*Formato de apresentação de fotografias sobre papel que surgiu na Inglaterra em 1866 como uma evolução do formato cartão de visita, tendo portanto o mesmo tipo de apresentação, mas num tamanho maior, razão pela qual era dito de cabinet, de gabinete. Outra denominação empregada para esse formato, inclusive aqui no Brasil, era carte boudoir, em referência àquelas salas íntimas de uso feminino características das residências oitocentistas. Muito utilizado até fins do século passado, esse formato apresentava fotografias de cerca de 9,5 x 14cm montadas sobre cartões rígidos de cerca de 11 x 16,5 cm (Enciclopédia Itaú Cultural).

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

ANDRADE, Joaquim Marçal Ferreira de. Para uma história da Fotografia Médica, no Brasil. Brasiliana Fotográfica, 23 de outubro de 2016

Câmara Paulista para Inclusão da Pessoa Deficiente

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

KOUTSOUKOS, Sandra Sophia Machado.  O retratado era “diferente”. Rio de Janeiro, c. 1865. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho 2011.

Ministério da Saúde – Biblioteca Virtual em Saúde

Portal UOL

Site Câmara dos Deputados

Dia Internacional da Mulher Negra Latina Americana e Caribenha e Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra

A Brasiliana Fotográfica celebra o Dia Internacional da Mulher Negra Latina Americana e Caribenha e o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra com uma seleção de imagens de mulheres produzidas por Alberto Henschel (1827 – 1882), Antônio Lopes Cardoso (18? – ?), Augusto Stahl (1828 – 1877), Carneiro & Gaspar (Joaquim Feliciano Alves Carneiro (18? – 1887) e Gaspar Antonio da Silva Guimarães (18? – 1874) ), Felipe Augusto Fidanza (1844 – 1903), João Goston (18? – ?), Marc Ferrez (1843 – 1923)José Christiano Junior (1832 – 1902) e por fotógrafos ainda não identificados.

Foi no encontro de Mulheres Negras Latino-Americanas e Caribenhas, realizado em Santo Domingo, na República Dominicana, em 1992, cujo objetivo era propor a união entre essas mulheres e denunciar o machismo e o racismo, que nasceu o Dia Internacional da Mulher Negra Latina Americana e Caribenha, reconhecido pela ONU no mesmo ano. Também durante o encontro foi estabelecida a criação da Rede de Mulheres Afro-latino-americanas, Afro-caribenhas e da Diáspora.

 

 

Acessando o link para a seleção de fotografias que foram selecionadas para homenagear o Dia Internacional da Mulher Negra Latina Americana e Caribenha e o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

No Brasil, cerca de 22 anos depois, em 2 de junho de 2014, a Lei 12.987/2014, estabeleceu o dia 25 de julho como o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. A partir da figura da matriarca quilombola Tereza de Benguela, a data tem o propósito de dar visibilidade ao papel da mulher negra na história brasileira. Tereza de Benguela viveu no século XVIII e foi escravizada pelo capitão Timóteo Pereira Gomes. Foi casada com José Piolho, que era o chefe do Quilombo Quariterê ou Quilombo do Piolho, na fronteira de Mato Grosso com a Bolívia, até ser assassinado por soldados do Estado. A partir de sua morte, a Rainha Tereza, como era chamada, assumiu a chefia do quilombo, que liderou por cerca de 20 anos, resistindo contra o governo escravocrata.

Segundo os anais de Vila Bela da Santíssima Trindade, Tereza:

Governava esse quilombo a modo de parlamento, tendo para o conselho uma casa destinada, para a qual, em dias assinalados de todas as semanas, entravam os deputados, sendo o de maior autoridade, tido por conselheiro, José Piolho, escravo da herança do defunto Antônio Pacheco de Morais. Isso faziam, tanto que eram chamados pela rainha, que era a que presidia e que naquele negral Senado se assentava, e se executavam à risca, sem apelação nem agravo.

 

 

 

O GLOBO, 23 de julho de 2014

O GLOBO, 23 de julho de 2014

 

Antes de ser homenageada com a criação da data, Tereza de Benguela já havia sido, no carnaval de 1994, tema do enredo Tereza de Benguela – Uma Rainha Negra no Pantanal. da Escola de Samba Unidos do Viradouro.

 

Amor, amor, amor…
Sou a viola de cocho dolente
Vim da Pérsia, no Oriente
Para chegar ao Pantanal
Pela Mongólia eu passei
Atravessei a Europa medieval
Nos meus acordes vou contar
A saga de Tereza de Benguela
Uma rainha africana
Escravizada em Vila Bela
O ciclo do ouro iniciava
No cativeiro, sofrimento e agonia
A rebeldia, acendeu a chama da liberdade
No Quilombo, o sonho de felicidade

Ilê Ayê, Ara Ayê Ilu Ayê
Um grito forte ecoou (bis)
A esperança, no quariterê
O negro abraçou

No seio de Mato Grosso, a festança começava
Com o parlamento, a rainha negra governava
Índios, caboclos e mestiços, numa civilização
O sangue latino vem na miscigenação

A invasão gananciosa, um ideal aniquilava
A rainha enlouqueceu, foi sacrificada
Quando a maldição, a opressão exterminou
No infinito uma estrela cintilou

Vai clarear, oi vai clarear
Um Sol dourado de Quimera (bis)
A luz de Tereza não apagará
E a Viradouro brilhará na nova era

 

 

Voltou a ser homenageada por uma escola de samba, a Barroca Zona Sul, de São Paulo, desta vez em 2020, com o enredo Benguela… A Barroca Clama a Ti, Tereza.

 

Axé, Tereza
Divina alteza, meu tambor foi te chamar
Sua luz nessa avenida
Incorpora a chama, Yabá
Da magia irmanada por Odé
Não sucumbe a fé, traz a luta de Angola
E a corrente arrastou pro sofrimento
Um sentimento, valentia quilombola
Reluz o ouro que brota em seu chão
Desperta ambição, mas há de raiar o dia
Do Guaporé, ser voz de preservação

Em plena floresta, auê, auê!
Resistência na aldeia, Quariterê!
Na mata, sou mestiço, guardião
O meu grito de guerra é por libertação!

O nosso canto não é apenas um lamento
A coragem vem da alma de quem ergueu o parlamento
Do castigo na senzala à miséria da favela
O povo não se cala, ó Tereza de Benguela!
Vem plantar a paz por essa terra
A emoção que se liberta
E a pele negra faz a gente refletir
Nossa força, nossa luta
De tantas Terezas por aí!

No caminho do amanhã, Obatalá!
É a luz que vem do céu, clareia!
Vem de Benguela o clamor de liberdade
Barroca pede tolerância e igualdade!

 

Uma curiosidade: assim como a ilutração acima foi adotada para representar Tereza de Benguela, a fotografia abaixo, produzida por Alberto Henschel, em torno de 1870, é frequentemente associada a Luiza Mahin, que viveu no século XIX e foi mãe do poeta, advogado e abolicionista Luís Gama, e liderança da Revolta dos Malês, um dos maiores levantes de escravizados promovidos no Brasil, em Salvador, em 1835. Para saber mais sobre essa história, acesse o artigo A mulher negra de turbante, de Alberto Henschel, de autoria de Aline Montenegro Magalhães e Maria do Carmo Rainho, publicada na Brasiliana Fotográfica, em 13 de maio de 2020.

 

 

Acesse aqui a pesquisa Visível e Invisível: A Vitimização de Mulheres no Brasil, realizado pelo Datafolha a pedido do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e divulgada em 2 de março de 2023.

 

Montagem feita pelo fotógrafo Januário Garcia (1943 - 2021) com fotos de sua autoria  para o Dia de 2015

Montagem feita por Januário Garcia (1943 – 2021) com fotos de sua autoria para o Dia Internacional da Mulher Negra Latina Americana e Caribenha de 2015

 

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

Fontes:

BANDEIRA, Maria de Lourdes. Território Negro Em Espaço Branco. São Paulo : Brasiliense, 1988.

LACERDA, Thays de Campos. Tereza de Benguela: identidade e representatividade negra. Revista de Estudos Acadêmicos de Letras.

NUNES, Dimalice. Teresa de Benguela: a heroica rainha do Quilombo Quariterê. Aventura da História, 20 de novembro de 2019.

O GLOBO

Portal Geledés

Site Fiocruz

Site ONU Mulheres

Site Senado Federal

Site Sipad

Site Universidade Federal do Recôncavo Baiano

O Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial

Com a publicação de fotografias de crianças de diferentes etnias, a Brasiliana Fotográfica celebra o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial. As imagens escolhidas são de autoria do berlinense Alberto Henschel (1827 – 1892) e do português Felipe Augusto Fidanza (1844 – 1903). Pertencem ao Arquivo Nacional e ao Leibniz-Institut für Länderkunde, ambas instituições parceiras do portal.

“O racismo continua a envenenar instituições, estruturas sociais e o cotidiano de toda a sociedade”. 

António Guterres (1949-), secretário-geral da ONU, em 21 de março de 2022

 

Henschel foi um dos mais importantes fotógrafos que atuaram no Brasil na segunda metade do século XIX. Chegou no Recife, em 1866, e, ao longo de 16 anos, teve uma intensa atividade no país. Segundo o historiador Boris Kossoy (1941 – ), Henschel pode ser considerado pioneiro no Brasil como empresário da fotografia, pois chegou a ter quatro estabelecimentos: o primeiro no Recife (1866), o segundo em Salvador (provavelmente em 1868) e os últimos no Rio de Janeiro (1870) e em São Paulo (1882).

 

 

 

Fidanza foi também fotógrafo de destaque, tendo trabalhado no norte do Brasil no século XIX e no início do século XX. Chegou ao  país em fins da década de 1860 e, em seu estúdio, retratou tipos diversos no formato carte de visite. Para tornar essas fotografias, que vendia, exóticas, utilizava adereços e construía cenários. Além de produzir estes retratos, registrou as paisagens e documentou o início do desenvolvimento urbano de Belém e de Manaus, ocasionado pela riqueza do ciclo da borracha.

 

 

Breve história do Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial 

 

“Discriminação Racial significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada na raça, cor, ascendência, origem étnica ou nacional com a finalidade ou o efeito de impedir ou dificultar o reconhecimento e exercício, em bases de igualdade, aos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou qualquer outra área da vida pública”

 Artigo I da Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial,

20 de novembro de 1963

 

O Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial foi criado pela Organização das Nações Unidas, ONU, em 26 de outubro de 1966 (Portal da UNESCO). É uma referência ao Massacre de Sharperville, ocorrido em 21 de março de 1960, em Joanesburgo, na África do Sul. Neste dia, milhares de pessoas faziam um protesto pacífico contra a Lei do Passe, que obrigava a população negra a portar um cartão que continha seus dados pessoais e os locais onde era permitida sua circulação. A polícia do regime do apartheid atacou os manifestantes, matando 69 e deixando cerca de 180 feridos (Correio da Manhã, 22 de março de 1960Jornal do  Brasil, 23 de março de 1960).

 

 

Segundo pesquisa divulgada pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística -, no dia 22 de julho de 2022, cujos dados integram a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Características Gerais dos Moradores 2021, o perfil da população brasileira  de acordo com cor ou raça é a seguinte: 99,90 milhões de pardos, 91,47 milhões de brancos, 19,30 milhões de negros e 1,98 de indígenas, amarelos ou sem declaração (Folha de São Paulo, 22 de julho de 2022). No Brasil, o crime de racismo está previsto na Constituição Federal, é inafiançável e imprescritível. A Lei n° 7.716/1989 tipifica a discriminação racial como crime.

O Brasil é um dos países signatários do acordo que a ONU que estabeleceu os anos entre 1º de janeiro de 2015 e 31 de dezembro de 2024 como a Década Internacional das Pessoas Afrodescentes com o objetivo de reduzir as desigualdades e exclusões as quais eles estão submetidos (Portal da ONU; Americas Quarterly).

 

International Decade For People of African Descent Logo in Portuguese

 

“Africanos e pessoas afrodescendentes, asiáticos e pessoas de descendência asiática, comunidades minoritárias, pessoas indígenas, migrantes, refugiados e tantos outros – todos continuam a enfrentar estigmatização, culpabilização, discriminação e violência”.

Acesse aqui o discurso de António Guterres, secretário-geral da ONU, proferido no Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.em 21 de março de 2022.

Em 2023,  o tema da ONU do Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial é o foco na urgência no combate ao racismo e à discriinação racial 75 anos após a adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos (Portal da ONU).

 

Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé

 

Em 6 de janeiro de 2023, foi sancionada a Lei 14.519/2023, que instituiu o Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé, que será celebrado anualmente também no dia 21 de março.

Lembramos aqui a reportagem As noivas dos deuses sanguinários sobre o candomblé, que tornou-se histórica. Foi realizada pelo repórter Arlindo Silva (1924 – 2011) e pelo fotógrafo José Medeiros (1921 – 1990) e publicada na revista O Cruzeiro, de 15 de setembro de 1951. Tratava-se de uma documentação fotográfica inédita e foi uma resposta à publicação na revista Paris-Match, de 15 de maio de 1951, da matéria Les possédées de Bahia, com fotografias produzidas pelo cineasta francês Henri Georges-Clouzot (1907 – 1977) e escrita na terceira pessoa. A reportagem foi considerada etnocêntrica e arrogante.

Com a ajuda de um motorista de táxi de Salvador, o fotógrafo Medeiros localizou um terreiro e pagou pelos animais que seriam sacrificados no ritual. Na hora da realização da reportagem, o cabo do sincronismo do flash se rompeu e ele teve de ajustar o anel do obturador de sua Rolleiflex para enfrentar a escuridão do terreiro. A reprodução total ou parcial da matéria publicada no Cruzeiro era absolutamente interdita. O tom sensacionalista da reportagem foi criticado. Seis anos depois, Medeiros relançou as fotografias no livro Candomblé, primeiro sobre essa religião no Brasil e o material passou a ser considerado importante do ponto de vista etnográfico. O Instituto Moreira Salles, que em agosto de 2005 adquiriu sua obra completa com aproximadamente 20 mil negativos, relançou o livro em 2011.

 

Andrea C. T. Wanderley

Pesquisadora e editora da Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Folha de São Paulo

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

Portal da BBC

Portal da ONU

Portal da ONU – Direitos Humanos

Portal da Presidência da República – Casa Civil – Subchefia para Assuntos Jurídicos

Portal do Senado Federal

WorldLII

 

Série “Feministas, graças a Deus!” XIV – No Dia Internacional da Mulher, Alzira Soriano, a primeira prefeita do Brasil e da América Latina

No Dia Internacional da Mulher, a Brasiliana Fotográfica destaca, no 14º artigo da série Feministas, graças a Deus!, a eleição da potiguar Alzira Soriano (1897 – 1963), que se tornou, em 1928, a primeira prefeita do Brasil e da América Latina.  A conquista foi tema de uma das colunas “Turista Aprendiz”, do escritor Mário de Andrade (1893 – 1945). O portal também selecionou fotografias de feministas presentes em seu acervo fotográfico. A ideia da criação de um dia para celebrar a mulher remonta ao século XIX, mas foi, em 1975, que o dia 8 de março foi instituído pelas Nações Unidas como o Dia Internacional das Mulheres.

Apesar dos avanços relativos à emancipação feminina, infelizmente, conforme pesquisa realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e divulgada há alguns dias, o Brasil está diante de um aumento de violência contra a mulher. De acordo com Samira Bueno, diretora executiva do Fórum: Foram mais de 18 milhões de mulheres vítimas de violência no último ano. São mais de 50 mil vítimas por dia, um estádio de futebol lotado. O estudo revela também que uma a cada três mulheres brasileiras (33,4%) com mais de 16 anos já sofreu violência física e/ou sexual de parceiros ou ex-parceiros.

Acessando o link para fotografias de feministas selecionadas e disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

Alzira Soriano (1897 – 1963) , a primeira prefeita do Brasil e da América Latina

 

 

Foi no Rio Grande de Norte que Alzira Soriano (1897 – 1963) foi eleita, em 2 de setembro de 1928, para comandar a cidade de Lajes, com 60% dos votos, tornando-se a primeira prefeita do Brasil e da América do Sul, tendo tomado posse no cargo em 1º de janeiro de 1929 (O Paiz, 1º e 2 de outubro de 1928). Lembramos aqui que, justamente no estado referido, a Lei Estadual nº 660, com a emenda Regular o Serviço Eleitoral do Estado, que estabelecia a não distinção de sexo para o exercício do sufrágio e, tampouco, como condição básica de elegibilidade, passou a vigorar em 25 de outubro de 1927, durante o governo de  José Augusto Bezerra de Medeiros (1884 – 1971).

Na edição de O Paiz, de 2 de dezembro de 1927, foi publicada uma pequena matéria com uma mensagem de Alzira:

“Estão se mostrando animadores os primeiros resultados da instituição do voto feminino, no Rio Grande do Norte. Não obstante ser tão recente a introdução desta medida, já vem chegando as novas dos primeiros alistamentos. Há breves dias anunciava-se que a senhorita Julia Barbosa, catedrática de matemática na capital daquele estado, requerera alistamento eleitoral. Agora telegrama do anuncio de Mossoró afirma a inclusão do nome de uma senhora na lista eleitoral. Trata-se da Sra. Celina Vianna, casada, professora, com economia própria, que poderá vangloriar-se de ser a primeira eleitora do Brasil. Outro despacho telegráfico, de Jardim Angicos, vem assegurar ao senador Juvenal Lamartine, propulsor da ideia, e presidente eleito do Estado, o apreço e a solidariedade do futuro eleitorado feminino da sua terra. Transcrevemos a mensagem a seguir: “Orgulhosa pelo gesto da Assembleia Legislativa do nosso querido Estado, concedendo o direito ao voto feminino, em nome das mulheres de Lages, felicito V. EX. pela brilhante vitória e asseguro solidariedade política ao futuro governo. – Alzira Soriano”

As eleições para a escolha de um novo senador para o Rio Grande do Norte foram realizadas no dia 5 de abril de 1928, mas os votos das eleitoras foram anulados porque o Senado não reconheceu o direito de voto das mulheres. Mas o voto feminino valeria nas eleições já mencionadas, de 2 de setembro de 1928, quando Alzira tornou-se a primeira prefeita do Brasil e da América do Sul. Ela enfrentou forte resistência de seus opositores, correligionários ao seu concorrente, Sérvulo Pires Neto Galvão, que não se conformavam em disputar a eleição com uma mulher (SOUZA, 1993). A notícia de sua eleição foi publicada na edição do dia 8 de setembro do jornal norte-americano New York Times com o título ’Americanized’ Town Elects Brazil’s First Woman Mayor – Cidade americanizada elege primeira prefeita mulher do Brasil. O artigo atribuia o fato à influência do movimento sufragista norte-americano no Brasil (Gazeta de Notícias, 7 de setembro de 1928, quarta coluna).

Luiza Alzira Teixeira de Vasconcelos nasceu, em 29 de abril de 1897, em Jardim de Angicos, no Rio Grande do Norte, filha do coronel Miguel Teixeira de Vasconcelos e da dona Margarida Teixeira de Vasconcelos. Antes dela, haviam nascido duas meninas e um menino, que não sobreviveram às doenças da infância. O casal Miguel e Margarida teve 22 filhos, dos quais apenas sete mulheres e um homem se criaram. Seu pai detinha o poder político da região, que incluía os municípios de Lajes e Pedra Preta; e era o maior comerciante da cidade.

Em 29 de abril de 1914, Alzira casou-se com Thomaz Soriano de Souza Filho (1889 – 1919), de uma tradicional família de Pernambuco. Foram morar em Ceará-Mirim, no Rio Grande do Norte, onde o marido trabalhava como promotor. Tiveram quatro filhas: Sonia, que nasceu em 25 de setembro de 1915; Ismênia, nascida em 4 de outubro de 1917; Maria do Céu, que nasceu em 1918, mas morreu de sarampo antes de completar um mês de vida; e Ivonilde, nascida em 25 de março de 1919. Meses antes, em 9 de janeiro de 1919, Thomaz faleceu de gripe espanhola (Diário de Pernambuco, 11 de janeiro de 1919, quinta coluna). Alzira voltou a morar em Jardim de Angicos, depois passou uma pequena temporada no Recife e, finalmente retornou à Jardim de Angicos, onde voltou à administração da Fazenda Primavera, de seu pai. A cidade passara a ser um distrito de Lajes.

Voltando à carreira política de Alzira. A responsável pela indicação de Alzira como candidata à Prefeitura de Lajes pelo Partido Republicano foi Bertha Lutz (1894 – 1996), cuja atuação foi fundamental na luta pela emancipação da mulher no Brasil. Foi a fundadora da Federação Brasileira para o Progresso Feminino e foi uma figura central na luta pelo voto feminino no país, entidade da qual Alzira tornou-se conselheira (O Paiz, 8 de maio de 1930, última coluna). Bertha viajou ao Rio Grande do Norte, em 1928, em campanha pelo alistamento das mulheres. Na ocasião, foi almoçar com o então  governador do estado, Juvenal Lamartine  (1874 – 1956), na Fazenda Primavera, ocasião em que conheceu Alzira e se impressionou com sua determinação. Na época, Alzira participava ativamente da administração dos trabalhos na lavoura e pasto.

 

 

Enfrentou uma grande resistência de seus opositores, dos correligionários do outro candidato à prefeitura, Sérvulo Pires Neto Galvão. Eles não se conformavam com a candidatura de uma mulher. Alguns chegavam a afirmar que mulher pública era prostituta. O candidato derrotado, por ter se sentido humilhado por ter perdido para uma mulher, saiu da cidade.

Enfim, sua eleição foi festejada na edição de A Noite, de 10 de setembro de 1928, primeira coluna; e em O Paiz, de 1º e 2 de outubro de 1928 com a publicação de um pequeno perfil da recém eleita prefeita e também de uma entrevista realizada por Amphiloquio Câmara, representante de O Paiz no Rio Grande do Norte.

 

 

 

A declaração abaixo e outras feitas por Alzira na entrevista publicada na mesma edição de O Paiz deixa claro que ela seguia uma linha do feminismo, adotada pela grande maioria das mulheres que participavam da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, que não contestava a ordem patriarcal: as mulheres se colocavam como colaboradoras dos homens.

 

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Foi entrevistada pelo jornal A Noite, de 28 de setembro de 1928.

Em dezembro de 1928, foi publicada uma mensagem enviada por ela a Bertha Lutz, cuja atuação considerava brilhante e decisiva (O Paiz, 16 de dezembro de 1928).

 

 

Alzira tomou posse em 1º de janeiro de 1929 e, dias depois, em uma entrevista para o jornal A República (RN) declarou que sua gestão se alinharia a do governador Juvenal Lamartine (1874 – 1956), incansável em promover o bem estar coletivo. Ela já havia renovado o contrato de luz elétrica, começado a limpeza total e a edificação da cadeia de Lajes e que, em breve, as obras de construção de um campo de aviação na cidade se iniciariam (O Paiz, 21 e 22 de janeiro de 1929, quinta coluna).

 

 

Trecho de seu dircurso de posse:

…determinaram acontecimentos sociais do nosso querido Rio Grande do Norte, na sua constante evolução da democracia, que a mulher, esta doce colaboradora do lar, se voltasse também para colaborar com outra feição na sua obra políticoadministrativa. De outro modo não poderia se ser. As conquistas atuais, a evolução que ora se opera, abre uma clareira no convencionalismo, fazendo ressurgir nova faceta dos sagrados direitos da mulher.

Sua eleição foi tema de uma das colunas “Turista Aprendiz”, do escritor Mário de Andrade (1893 – 1945), datada de 4 de janeiro de 1929, e publicada no Diário Nacional: a democracia em marcha (SP), de 2 de fevereiro do mesmo ano. Mário de Andrade foi uma das figuras centrais do movimento modernista no Brasil. Ele e Oswald de Andrade (1890 – 1954) foram importantes participantes da Semana de Arte Moderna de 1922, mesmo ano em que Mário publicou Paulicéia Desvairada (1922), que introduziu, na poesia brasileira, temas e técnicas modernistas.

 

 

Foi publicado um relatório com um balanço do governo de Alzira na Prefeitura de Lajes (O Paiz, 26 de março de 1930, quarta coluna; O Jornal, 4 de abril de 1930, penúltima coluna; O Malho, 27 de abril de 1930O Paiz, 28 e 29 de abril de 1930, penúltima coluna). No artigo A mulher e o Estado, a gestão de Alzira foi elogiada (A Gazeta (SP), 23 de abril de 1930, última coluna).

 

 

Com a Revolução de 30, que ocorreu em outubro de 1930, por não concordar com o governo de Getulio Vargas (1882 – 1954) – havia apoiado Júlio Prestes (1882 – 1946) à presidência da República – Alzira, apesar de convidada a permanecer no cargo como interventora, não aceitou (O Paiz, 29 de agosto de 1929, quinta coluna). Segunda uma de suas filhas, no último dia de sua gestão foi visitar seus correligionários e também seus opositores. Tendo sido insultada por um deles, Miguel da Silveira, reagiu cobrindo-0 de tapas.

Mudou-se para Natal, onde permaneceu com as filhas até fins da década de 30, quando retornou ao comando da fazenda, com seus irmãos mais novos, devido ao falecimento de seu pai. Voltou à vida política somente em 1947, desta vez como vereadora da cidade de Lajes pela União Democrática Nacional – UDN. Reelegeu mais algumas vezes.

Faleceu, de câncer, no dia 28 de maio de 1963, após cerca de dois anos do diagnóstico da doença, na casa da filha Ivonilde, em Natal, um dia depois de retornar do Rio e de São Paulo, onde esteve se tratando. Na ocasião, além de três filhas, tinha oito netos (Diário de Notícias, 31 de maio de 1963, segunda coluna).

 

 

Em sua homenagem, foi realizada, entre 24 e 29 de abril de 2018, no município de Lajes, a Semana Alzira Soriano, com a realização de atividades educacionais e culturais.

 

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Em Jardim de Angicos há um museu municipal em memória de Alzira Soriano. Guarda em seu acervo fotos e móveis antigos, reportagens de jornais e de revistas.

 

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Sua imagem está presente na bandeira de Jardim de Angicos, juntamente com a representação de alguns pontos turísticos naturais da cidade. Foi sancionada uma lei, em 28 de dezembro de 2018, instituindo o dia e mês do nascimento de Alzira Soriano, 29 de abril, como feriado municipal na cidade.

 

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Ainda em 2018, Alzira Soriano foi postumamente homenageada com o Diploma Mulher-Cidadã Carlota Pereira de Queirós, da Câmara dos Deputados. A homenagem, segundo a Câmara, é concedida a mulheres que tenham contribuído para o pleno exercício da cidadania e para a defesa dos direitos da mulher e das questões de gênero no Brasil.

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Centro de Memória do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte

ENGLER, Isabel. A primeira prefeira brasileira Alzira Soriano: o poder político coronelístico, Lages/RN, 1928. Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Licenciatura em História da Universidade Federal da Fronteira Sul, como requisito para obtenção do título de licenciada em História. Universidade Federal da Frontiera Sul Campus Chapecó, 2019.

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

MARQUES, Teresa Cristina de Novaes. O voto feminino do Brasil. Brasília : Edições Câmara, 2019.

Mulheres de Luta

O GLOBO

Portal BBC News Brasil

Portal Câmara dos Deputados

Portal UOL

SCHUMAHER, Schuma; BRAZIL, Erico Vital (organizadores). Dicionário mulheres do Brasil: de 1500 até a atualidade biográfico e ilustrado. Rio de Janeiro : Jorge Zahar Ed., 2000.

SOUZA, Heloísa Maria Galvão Pinheiro de. Luísa Alzira Teixeira Soriano: primeira mulher eleita prefeita na América do Sul. Natal: CCHLA, 1993.

 

Acesse aqui os outros artigos da Série “Feministas, graças a Deus!

Série “Feministas, graças a Deus!” I – Elvira Komel, a feminista mineira que passou como um meteoro, publicado em 25 de julho de 2020, de autoria da historiadora Maria Silvia Pereira Lavieri Gomes, do Instituto Moreira Salles, em parceria com Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” II  – Natércia da Cunha Silveira (1905 – 1993), o jequitibá da floresta, publicado em 20 de agosto de 2020, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” III  – Bertha Lutz e a campanha pelo voto feminino: Rio Grande do Norte, 1928, publicado em 29 de setembro de 2020, de autoria de Maria do Carmo Rainha, doutora em História e pesquisadora do Arquivo Nacional

Série “Feministas, graças a Deus!” IV  – Uma sufragista na metrópole: Maria Prestia (? – 1988), publicado em 29 de outubro de 2020, de autoria de Claudia Heynemann, doutora em História e pesquisadora do Arquivo Nacional

Série “Feministas, graças a Deus!” V – Feminista do Amazonas: Maria de Miranda Leão (1887 – 1976), publicado em 26 de novembro de 2020, de autoria de Maria Elizabeth Brêa Monteiro, mestre em História e pesquisadora do Arquivo Nacional

Série “Feministas, graças a Deus!” VI – Júlia Augusta de Medeiros (1896 – 1972) fotografada por Louis Piereck (1880 – 1931), publicado em 9 de dezembro de 2020, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” VII – Almerinda Farias Gama (1899 – 1999), uma das pioneiras do feminismo no Brasil, publicado em 26 de fevereiro de 2021, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” VIII – A engenheira e urbanista Carmen Portinho (1903 – 2001), publicado em 6 de abril de 2021, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” IX – Mariana Coelho (1857 – 1954), a “Beauvoir tupiniquim”, publicado em 15 de junho de 2021, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” X – Maria Luiza Dória Bittencourt (1910 – 2001), a eloquente primeira deputada da Bahia, publicado em 25 de março de 2022, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” XI e série “1922 – Hoje, há 100 anos” VI – A fundação da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, publicado em 9 de agosto de 2022, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” XII e série “1922 – Hoje, há 100 anos” XI – A 1ª Conferência para o Progresso Feminino, publicado em 19 de dezembro de 2022, de autoria de Maria Elizabeth Brêa Monteiro, historiadora do Arquivo Nacional

Série “Feministas, graças a Deus!” XIII – E as mulheres conquistam o direito do voto no Brasil!, publicado em 24 de fevereiro de 2023, de autoria de Andrea C T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” XV – No Dia dos Povos Índígenas, Leolinda Daltro,”a precursora do feminismo indígena” e a “nossa Pankhurst, publicado em 19 de abril de 2023, de autoria de Andrea C T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” XVI – O I Salão Feminino de Arte, em 1931, no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica, publicado em 30 de junho de 2023

Série “Feministas, graças a Deus!” XVII – Anna Amélia Carneiro de Mendonça e o Zeppelin, equipe de Documentação da Escola de Ciências Sociais FGV CPDOC, em parceira com Andrea C.T. Wanderley, publicado em 5 de janeiro de 2024

Série “Feministas, graças a Deus!” XIII – E as mulheres conquistam o direito do voto no Brasil!

Com a publicação do 13º artigo da Série Feministas, graças a Deus!, a Brasiliana Fotográfica celebra a conquista do voto feminino no Brasil, a partir do Decreto nº 21.076, de 24 de fevereiro de 1932, que instituiu o Código Eleitoral Provisório, assinado pelo presidente Getulio Vargas (1882 – 1954), reconhecendo o direito de voto das mulheres.

 

“Art. 2º É eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste código”.

Decreto nº 21.076, 24 de fevereiro de 1932

 

A Constituição promulgada em 16 de julho de 1934 aprovou a igualdade de direitos políticos entre homens e mulheres, desde que maiores de 18 anos e alfabetizados:

 

Art. 108. São eleitores os brasileiros de um e de outro sexo, maiores de 18 anos, que se alistarem na forma da lei.

Parágrafo único. Não se podem alistar eleitores:

a) os que não saibam ler e escrever;

b) os praças-de-pré, salvo os sargentos, do Exército e da Armada e das forças auxiliares do Exército, bem como os alunos das escolas militares de ensino superior e os aspirantes a oficial;

c) os mendigos;

d) os que estiverem, temporária ou definitivamente, privados dos direitos políticos. 

Art. 109. O alistamento e o voto são obrigatórios para os homens e para as mulheres, quando estas exerçam função pública remunerada, sob as sanções e salvas as exceções que a lei determinar.

 

Era a vitória de décadas de mobilização em favor do sufrágio feminino no Brasil.

 

 

No artigo de hoje, estão destacadas as imagens do acervo fotográfico do portal relativas às feministas e a suas pautas – os registros são do acervo do Arquivo Nacional, uma de nossas instituições parceiras, e seus autores foram J. Bonfioti, a Photo Skarke, a Fotografia Alemã, Louis Piereck (1880 – 1931), o Serviço Photographico de Vida Doméstica, além de fotógrafos ainda não identificados. Também publicamos breves perfis de sufragistas brasileiras importantes na luta pelo voto feminino.

 

Acessando o link para as imagens relativas ao feminismo disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

A trajetória da conquista do voto feminino no Brasil, um marco fundamental na história da democratização do país, começou ainda no século XIX e tornou-se o principal tema do feminismo nas primeiras décadas do século XX, quando a feminista Bertha Lutz (1894 – 1976), fundadora da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, foi uma das mais importantes vozes na luta pela emancipação feminina, que também teve outras defensoras dedicadas e aguerridas.

 

Nísia Floresta Brasileira Augusta (1810 – 1885), 

 precursora dos ideais de igualdade e independência da mulher brasileira

 

 

“Nísia Floresta surgiu – repita-se–como uma exceção escandalosa. Verdadeira machona entre as sinhazinhas dengosas do meado do século XIX. No meio de homens a dominarem sozinhos todas as atividades extra domésticas, as próprias baronesas e viscondessas mal sabendo escrever, as senhoras mais finas soletrando apenas livros devotos e novelas que eram quase histórias do Trancoso. causa pasmo ver uma figura como a de Nísia”.

Gilberto Freyre, Sobrados e Mocambos (1936)

 

Ainda no Brasil Império, a escritora e educadora potiguar Nísia Floresta Brasileira Augusta (1810 – 1885), pseudônimo de Dionísia Gonçalves Pinto, foi a primeira mulher brasileira a defender o direito à educação científica para as meninas. A explicação do pseudônimo que criou para ela é a seguinte: “Nísia”, uma referência ao seu nome de batismo; depois, ao sítio Floresta onde nasceu; em seguida, ao seu país; e, finalmente, a Augusto, o nome do marido de quem ficou viúva. 

Nasceu, em 12 de outubro de 1810, em Papari, no Rio Grande do Norte, onde casou-se com Manuel Alexandre Seabra de Melo. Tinha apenas 13 anos, mas ainda no primeiro ano do casamento voltou para a casa dos pais, o advogado português Dionísio Gonçalves Pinto (17? – 1828) e a brasileira Antônia Clara Freire (17? – 1855). Seus irmãos eram Clara e Joaquim. Mudou-se com a família para  Pernambuco, onde morou em Goiana, Recife e Olinda. 

Em 1828, seu pai foi assassinado (Diário de Pernambuco, 22 de setembro de 1830, segunda coluna). No mesmo ano, Nísia passou a viver com Manoel Augusto de Faria Rocha, estudante de Direito da Faculdade de Olinda, natural de Goiana (Diário de Pernambuco, 16 de abril de 1829, segunda coluna), com quem teve três filhos na década de 1830: Lívia (1930-?), um filho, que viveu poucos meses (1831 – 1831 ou 1832); e Augusto Américo (1933-?). Era acusada de adúltera pelo ex-marido. 

Iniciou sua carreira literária, em 1931, publicando, com o pseudônimo de Brasileira Livre, artigos sobre a condição feminina no jornal pernambucano Espelho das Brasileiras, que pertencia ao francês Adolphe Emile de Bois Garin (Espelho das Brasileiras, 13 de maio de 1931). A defesa dos direitos das mulheres e dos indígenas no Brasil, e a crítica à escravidão foram temas recorrentes em sua produção literária.

 

“Esta foi, com certeza, uma das primeiras mulheres no Brasil a romper os limites do espaço privado e a publicar textos na grande imprensa, pois, desde 1830, seu nome era uma presença constante em periódicos nacionais, comentando questões polêmicas, como o direito das mulheres – e, também, dos índios e dos escravos – a uma vida digna e respeitável. Aliás, nesse gosto pela polêmica e no fato de viver sempre à frente de seu tempo, estariam, a nosso ver, também, traços de modernidade da autora”.

 Constância Lima Duarte sobre Nísia em Feminismo e literatura no Brasil (2003)

 

Em 1832, publicou, no Recife, o livro Direito das Mulheres e a Injustiça dos Homens, primeiro texto de uma brasileira a falar em direitos das mulheres. Existe uma polêmica em torno da autoria deste livro: alguns pesquisadores consideram o livro como uma tradução livre de A Vindication of the Rights of Woman, de Mary Wollstonecraft (1759-1797), e outros como a tradução de Woman not Inferior to Man, de Mary Wortley (1689-1762), que teria sido infuenciada pelo livro De l´egalité des deux sexes, de François Poullain de La Barre, publicado em 1673

 

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Em novembro de 1832, foi para o Rio Grande do Sul, com Lívia, sua filha; sua mãe viúva e com seu companheiro, Manoel Augusto, que, em agosto de 1833, poucos meses após o nascimento de Augusto Américo, em janeiro de 1833, faleceu. Manoel Augusto havia ocupado o cargo de juiz municipal de São Pedro do Rio Grande do Sul (Correio Official, 25 de outubro de 1833, primeira coluna). Ainda em 1833, Nísia publicou a segunda edição de Direito das Mulheres e a Injustiça dos Homens, em Porto Alegre, pela Typographia de V. F. Andrade. Escreveu para alguns jornais de Porto Alegre, dentre eles o Belano, que circulou entre 1832 e 1833. Entre 1834 e 1837, manteve uma escola. Segundo o professor Luis Carlos Freire, professor de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e um dos maiores pesquisadores de Nísia, provavelmente ela ensinava em casa, como era costume na época. 

Em 1837, foi para o Rio de Janeiro. Provavelmente, a tensão causada pela Guerra dos Farrapos contribuiu para essa mudança. Em 1838, fundou o Colégio Augusto, para meninas, que dirigiu com algumas interrupções até 1856. Posteriormente, o colégio, que existiu até 1894, foi dirigido por seu filho (Jornal do Commercio, 31 de janeiro de 1838, segunda coluna). Nísia tinha uma proposta de educação inclusiva para meninos e meninas, tanto na esfera pública, quanto na privada, e era influenciada pelo pensamento positivista do francês Auguste Comte (1798 – 1857), de quem era amiga. Em 1839, foi publicada, já no Rio de Janeiro, a terceira edição de Direito das Mulheres e a Injustiça dos Homens, pela Casa do Livro Azul.

 

 

 

Por ensinar Caligrafia, Dança, Desenho e Costura, Francês, Geografia, História, Inglês, Italiano, Latim, Matemática, Música, Português, Piano e Religião a suas alunas e não a fazer vestidos e camisas foi criticada (O Mercantil (MG), 17 de janeiro de 1947, primeira coluna).

 

 

Publicou, em 1847, três obras de caráter pedagógico: Fany ou o modelo das donzelasDiscurso que às suas educandas dirigiu Nísia Floresta Brasileira Augusta, um breve texto de seis páginas; e Daciz ou a jovem completa. 

Em 2 de novembro de 1849, acompanhada dos dois filhos, Nísia viajou pela primeira vez à Europa. Embarcaram, rumo a Havre, na galera francesa Ville de Paris. Ficou em Paris e em Lisboa, retornando ao Brasil em 1852 (Diário do Rio de Janeiro, 3 de novembro de 1849, última coluna). Nesse período, ela frequentou as conferências de Auguste Comte sobre História Geral da Humanidade no Palais Cardinal, em Paris. 

Em 1853, lançou o Opúsculo Humanitário, que dedicou a seu irmão, Joaquim Pinto Brasil. Nele a autora nos conta a história do papel das mulheres nas sociedades ocidentais, dando exemplos e refletindo sobre a condição feminina. Antes da primeira impressão reunida, parte dos textos foi publicada nos jornais Diário do Rio de Janeiro, sob  pseudônimo B.A.

“Dê-se ao sexo uma educação religiosamente moral, desvie-se dele todos os perniciosos exemplos que tendem a corromper-lhe, desde a infância, o espírito, em vez de formá-lo á virtude, adornem-lhe a inteligência de úteis conhecimentos, e a mulher será não somente o que ela deve ser — o modelo de família — mas ainda saberá conservar dignidade, em qualquer posição que porventura a sorte a colocar.”

Nísia Floresta em O Opúsculo Humanitário, 1853

 

Trabalhou como voluntária no combate a uma epidemia de cólera no Rio de Janeiro, em 1855 (Correio Mercantil, 4 de outubro de 1955, segunda coluna). Também entre este ano e 1856 publicou alguns artigos no Brasil Illustrado: Passeio ao Aqueduto Carioca, Páginas de Uma Vida Obscura, Um Improviso, na manhã de 1º do corrente, ao distinto literato e grande porta Antônio Castilho e O pranto Filial.

O último registro do Almanak Laemmert de Nísia como diretora do Colégio Augusto é de 1855 (Almanak Laemmert, 1855). Em 10 de abril de 1856, Nísia viajou no paquete a vapor Cadix com sua filha para a Europa, onde permaneceu até 1871.  Em 1872, um retrato e um pequeno perfil dela foi publicado no jornal ilustrado brasileiro publicado em Nova York, O Novo Mundo, fundado por José Carlos Rodrigues (Diário do Rio de Janeiro, 10 de abril de 1856, quarta colunaO Novo Mundo, 23 de maio de 1872)

 

 

Entre 1872 e 1875, Nísia esteve no Brasil. Retornou à Europa em 24 de março de 1875, rumo à Inglaterra, onde encontrou sua filha. Passaram um tempo em Londres e em Lisboa (Jornal do Commercio, 24 de março de 1875, terceira coluna). Em 1878, já morando na França, publicou seu último trabalho, Fragments d’un ouvrage inédit: Notes biographiques. Entre idas e vindas, Nísia morou na França e na Itália, visitando a Alemanha, Bélgica, Grécia, Inglaterra e Suíça. Enviava artigos para publicação em jornais cariocas (Correio do Brazil, 7 de janeiro de 1872, quinta coluna; Diário de S. Paulo, 11 de dezembro de 1875, última colunaA Reforma, 31 de dezembro de 1875, última coluna). 

Faleceu em 24 de abril de 1885, em Rouen, na França, de pneumonia. Foi enterrada no cemitério de Bonsecours (Jornal do Commercio, 26 de maio de 1885, quinta colunaNovo e Completo Indice Chronologico da Historia do Brasil (RJ) – 1842 a 1889, 1885; Jornal do Commercio, 31 de maio de 1885, quinta coluna).

 

 

 

Sua cidade natal, Papari, foi rebatizada com a aprovação da Lei n° 146, de 23 de dezembro de 1948, como Nísia Floresta. Em 1954, o Estado do Rio Grande do Norte repatriou seus restos mortais para a cidade (O Poti (RN), 22 de agosto de 1954).

 

 

A quarta edição do livro Direito das Mulheres e a Injustiça dos Homens saiu apenas em 1989, pela Cortez, com introdução posfácio de Constância Lima Duarte. Em 2012, foi inaugurado o Museu Nísia Floresta, em sua cidade natal.

Alguns de seus livros que não foram mencionados ao longo deste artigo são Conselhos a minha filha (1842), Lágrimas de um Caeté (1849) Itinerário de uma viagem à Alemanha (1857), Três anos na Itália, seguidos de uma viagem à Grécia (vol 1, em 1864, e vl 2, em 1872); e Cintilações de uma Alma Brasileira (1859). Publicou, ao todo, 15 livros.

 

 Izabel de Souza Matos ou Izabel de Mattos Dillon (1861 – 1920)

 

 

A sufragista Izabel de Souza Matos ou Izabel de Mattos Dillon (1861 – 1920) nasceu na Bahia, em 20 de janeiro de 1861 e concluiu o  curso de Cirurgia Dentária e Prótese pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, em maio de 1883 (Gazeta de Notícias, 1º de maio de 1883, sexta coluna). Exerceu a profissão de cirurgiã dentista na cidade de Pelotas, no Rio Grande do Sul, e participou de atividades abolicionistas no Rio Grande (Diário do Brazil, 21 de fevereiro de 1884, última colunaA Federação, 4 de dezembro de 1884, última coluna). Casou-se, em fevereiro de 1885, com o também cirurgião-dentista Thomas Cantrell Dillon (1861 – 1933), futuro cônsul da Grã-Bretanha no Rio Grande do Sul (Almanak Laemmert, 1926). 

 

 

Em 1886, quando ainda residia no Rio Grande do Sul, exigiu na Justiça o registro de eleitora, garantido pela Lei Saraiva a todos os brasileiros com título científico. Porém, José Vieira da Cunha, juiz municipal de Rio Grande, negou o pedido (Correio Paulistano, 21 de dezembro de 1886, terceira coluna). Segundo ela, posteriormente teve o título concedido e votou no candidato republicano Julio Mendonça Moreira (1853 -?), em São José do Norte, no Rio Grande do Sul. Ele havia sido promotor na comarca de Rio Grande e não foi eleito na ocasião – foi eleito deputado estadual de 1891 a 1895. O fato foi citado por Izabel em um artigo publicado no jornal A Rua, de 20 de janeiro de 1917; e também pelo deputado Mauricio de Lacerda (1888 – 1959), este último na sessão da Câmara de 22 de dezembro de 1916 e algumas outras vezes na imprensa (Diário Carioca, 18 de setembro de 1928, terceira coluna). Terá sido então Izabel Dillon, na verdade, a primeira eleitora do Brasil, ainda no século XIX?

 

 

Em 1888, anunciou que abriria um consultório de dentista no Rio de Janeiro, onde foi colaboradora das revistas O Corymbo e  A Família (A Verdade, 29 de novembro de 1888, segunda coluna).

Em 1890, Izabel solicitou a transferência de seu título de eleitor para o Rio de Janeiro, onde voltara a residir, mas José Cesário de Faria Alvim (1839 – 1903), ministro do Interior, julgou improcedente seu pleito e assim como o de outras mulheres (A Ordem (MG), 2 de abril de 1890, última coluna).

 

 

Ainda em 1890, Izabel concorreu a deputada pela Bahia, mas não se elegeu ( Gazeta de Notícias, 25 de agosto de 1890, terceira colunaPequeno Jornal (BA), 17 de setembro de 1890, segunda colunaA Família, 18 de setembro de 1890, última colunaA Lanterna, 22 de dezembro de 1916, segunda coluna; A Rua, 20 de janeiro de 1917).

 

 

 

Era opositora de Floriano Peixoto (1839 – 1895), participou da Revolta da Armada e foi presa (A Rua, 20 de janeiro de 1917). Foi membro do Centro do Partido Operário, criado em 1890 por José Augusto Vinhais (1858 – 1941); e do Partido Republicano Feminino, fundado em 1910, por Leolinda Daltro (1859 – 1935).

 

 

Em 1913, sua única filha, Niobe Elisabeth Gonçalves (1893 – 1913) morreu, grávida de seu quarto filho com o cirurgião-dentista Basílio Gonçalves, seu marido. Houve uma investigação policial por suspeitas de aborto autoinduzido por medicamentos ingeridos por Niobe e também de imperícia médica. O caso repercutiu na imprensa do Rio de Janeiro e ficou conhecido como o Caso da Rua Paraná (O Século, 11 de fevereiro de 1913, quarta colunaCorreio da Manhã, 12 de fevereiro de 1913, quinta colunaO Paiz, 25 de janeiro de 1913, quinta coluna). 

 

 

Izabel faleceu em 19 de junho de 1920 e foi enterrada como indigente no Cemitério de Inhaúma, no Rio de Janeiro. A educadora Mariana Coelho (1857 – 1854) mencionou tanto Nísia Floresta como Izabel Dillon em seu artigo O feminismo no Brasil, publicado no Correio da Manhã, 3 de janeiro de 1937.

 

Josephina Alvares de Azevedo (1851 – 1913),  fundadora do jornal A Família

 

 

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“O fundamento universal de todos os que opinam contra a nossa emancipação é esse — que a mulher não tem capacidade política. Porque? perguntamos nós, e a essa pergunta não nos dão resposta cabal. Em geral, os casos de incapacidade politica são estes — menoridade, demência, inhabilitações, restriccão de liberdade por pena cominada, etc. etc. A esses addusem os legisladores a «diferença de sexo». Mas em que essa diferença pode constituir razão de incapacidade eleitoral? A mulher educada, instruída, em perfeito uso de suas faculdades mentaes, exercendo com critério as suas funcções na sociedade, é uma personalidade equilibrada, apta para discernir e competente para escolher entre duas idéas aquella que melhor convém. Não pude por conseguinte estar em pé de igualdade com os dementes, com os menores, com os imbecis. Assim sendo, é absurdo o principio de sua incapacidade electiva.” 

Josephina Alvares de Azevedo

A Família, 21 de dezembro de 1889

 

Também no século XIX, destacou-se na luta pela emancipação feminina a jornalista e literata pernambucana Josephina Alvares de Azevedo (1851 – 1913), nascida em 5 de maio de 1851, no Recife. Existem até hoje várias lacunas e dúvidas em relação a sua vida pessoal. O local e a data de seu nascimento – pode ter sido Paraíba, Recife, em Pernambuco, ou Itaboraí, no Rio de Janeiro – assim como seu grau de parentesco com o do poeta Manoel Antônio Alvares de Azevedo (1831-1852), ainda são incertos. De acordo com Augusto Victorino Blake, autor do Dicionário Bibliográfico Brasileiro, ela seria filha de Ignácio Manoel Alvares de Azevedo (?-1873) e, portanto, irmã, pelo lado paterno, do referido poeta. Porém em um artigo em A Família, de 23 de fevereiro de 1889, Josephina se refere ao poeta como primo. Sua mãe era Amália Alvares de Azevedo Cunha (? – 1896) e, sua avó materna, Emília Amália de Azevedo Coutinho (? – 1892) (Gazeta de Notícias, 29 de fevereiro de 1892, penúltima colunaO Paiz, 16 de maio de 1896, quarta coluna).

O dia, mês e ano de seu nascimento aqui publicados baseiam-se em uma noticia referente a seu aniversário e nas notícias de seu falecimento, em 1913, onde está indicado que ela tinha 62 anos na ocasião (Gazeta da Tarde, 5 de maio de 1890, quinta colunaDiário de Notícias, 5 de maio de 1890, primeira coluna; A Família, 9 de maio de 1891, primeira colunaA Época, 3 de setembro de 1913, segunda colunaO Paiz, 5 de setembro de 1913, última coluna). Em relação ao local, acredito que ela tenha nascido no Recife, conforme seu próprio depoimento em A Família, 7 de dezembro de 1889, descrevendo seu retorno à sua terra natal em julho de 1889. Na ocasião foi à Photographia Ducasble, onde foi retratada. Ainda na cidade, publicou um número especial de A Família (Diário de Pernambuco, 23 de julho de 1889, penúltima coluna. De lá, seguiu para o Ceará, onde permaneceu cerca de 10 dias (A Família, 7 de dezembro de 1889, A Constituição (CE), 11 de agosto e 1891, segunda coluna).

Josephina viveu até 1877, no Recife. Foi fundadora do jornal semanal A Família, em 1888 (A Família, 18 de novembro de 1888), cuja atuação na imprensa brasileira foi importante no período de transição entre o regime monárquico e a República no país. 

 

 

Inicialmente editado em São Paulo e impresso pela tipografia União- São Paulo, o periódico mudou-se para o Rio de Janeiro, em maio de 1889, e circulou ininterruptamente até 1897 – ficava na Travessa do Barbosa, nº 12 (A Família, 18 de maio de 1889; O Jacobino, 5 de junho de 1897, primeira coluna; Almanak Laemmert, 1898). Provavelmente, voltou a circular em 1898, mas logo deixou de existir (A Mensageira, 15 de maio de 1898). Entre as colaboradoras do jornal estavam a escritora baiana Ignez Sabino (1853 – 1911) e Izabel Dillon (1861 – 1920), além de estrangeiras como as feministas Guiomar Torrezão (1844-1898), escritora portuguesa; e a francesa Eugénie Potonié Pierre (1844 -1898), fundadora da Federação Francesa das Sociedades Feministas; que enviavam seus textos de seus respectivos países.

 

 

Josephina escreveu para A Família diversos artigos em defesa da emancipação feminina a partir da educação, do trabalho, do voto feminino e pelo direito ao divórcio. Desde o início enfrentou resistência, inclusive de mulheres e de instituições católicas, como fica exemplificado na edição do periódico de 12 de janeiro de 1889; e também na notícia publicada pelo jornal O Apóstolo, 28 de março de 1890, primeira coluna.

 

 

Destacamos os artigos O Direito ao Voto, publicado em 7 de dezembro de 1889, O Divórcio, de 2 de outubro de 1890Emancipação da Mulher, de 18 de julho de 1891 e A Questão das Mulheres, de 30 de janeiro de 1892. Às vezes, os assinava como Zefa.

 

 

Com a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, as mulheres vislumbraram a possibilidade de terem mais participação política. A própria Josephina escreveu no editorial de A Família, de 30 de novembro de 1889:

“No fundo escuro e triste do quadro de provações a que votaram a mulher na sociedade, brilhará, com a fulgente aurora da República Brasileira, a luz deslumbradora da nossa emancipação?…Queremos o direito de intervir nas eleições, de eleger e ser eleitas, como os homens, em igualdade de condições. Ou estaremos fora do regime das leis criadas pelos homens, ou teremos também o direito de legislar para todas. Fora disso, a igualdade é uma utopia, senão um sarcasmo atirado a todas nós…”

Porém, em 1891, criticou muito o fato de que na primeira Constituição da República, promulgada em 24 de fevereiro de 1891, as mulheres continuarem sendo espectadoras da vida política do país (A Família, 5 de março de 1891), circunstância retratada no quadro Compromisso Constitucional de 1891 (1896), de Aurélio de Figueiredo (1854 – 1916), onde um grupo de mulheres aparece justamente nesta condição.

 

 

Em 1891, o jornal A Família passou a pertencer à Companhia Imprensa Familiar, mas Josephina permaneceu como sua diretora mental e redatora (A Família, 25 de abril de 1891; O Paiz, 11 de maio de 1891, penúltima coluna; Diário de Notícias, 19 de julho de 1891, última coluna).

Foi homenageada com a publicação de seu retrato na primeira página de A Família, de 9 de maio de 1891.

 

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Foi autora da comédia O Voto Feminino, que estreou no Rio de Janeiro, em 26 de maio de 1890, no Theatro Recreio Dramático, enérgica e vibrante peça de combate em favor dos direitos políticos do bello sexo. Foi encenada pelos atores Antonio Pereira Fontana e Castro, português radicado no Brasil; Germano, Bragança e Pinto; e pelas atrizes Elisa de Castro, Isolina Monclar e Luisa. A peça foi inspirada pelas constantes recusas de alistamento eleitoral feminino, já exemplificado neste artigo pelo caso de Izabel Dillon (A Família, 31 de maio de 1890, primeira coluna).  O Voto Feminino é uma peça emblemática do sufragismo brasileiro em fins do século XIX.

 

 

Também em 1890, foi encenada sua tradução livre da peça Os Companheiros do Sol, de Paul Jay (Gazeta de Notícias, 6 de agosto de 1890, penúltima coluna).

A partir de 1892, o número de colaboradoras de A Família e os artigos escritos por Josephina diminuíram muito. Em 1893, foi noticiado que ela estava doente, vitimada pela terrível influenza (A Família, 17 de maio de 1893). Ela residia na rua da Quitanda (Almanak Laemmert, 1893).

Em 1896, ofertou à biblioteca do Grêmio Dramático Arthur Azevedo, de São Paulo, 20 obras  (A Arte, 12 de outubro de 1896, segunda coluna).

Em 1904, foi citada como uma distintíssima escritora brasileira em uma carta aberta da escritora espanhola Eva Canel (1857 – 1932), Em defesa da mulher brasileira, uma resposta a um artigo da escritora e jornalista argentina Conception Gimeno del Flaquer (1850 – 1919) (Il Bersagliere, 5 de maio de 1904, segunda coluna).

Ao longo de sua vida, Josephina publicou três livros: Retalhos (1890), A Mulher Moderna: trabalhos de propaganda (1891), que dedicou em signal de admiração e respeito à Viscondessa de Leopoldina e à D. Maria José Paranhos Mayrink; Galleria illustre (Mulheres célebres) (1897) (O Paiz, 2 de fevereiro de 1890, sexta coluna; Diário do Commercio, 9 de fevereiro de 1891, penúltima coluna).

 

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Josephina faleceu em 1º de setembro de 1913, viúva, de acordo com as notícias veiculadas na época, no Rio de Janeiro, e foi enterrada no Cemitério de São Francisco Xavier, em 2 de setembro de 1913. Sua irmã, Maria Amelia de Azevedo Costa, e seus filhos, Alfredo e Moacyr Alvares de Azevedo, convidaram para a missa de Sétimo Dia, realizada na Igreja de Nossa Senhora da Conceição e Dores, em São Cristóvão. Residia na rua Luiz Barbosa, número 102 (A Época, 3 de setembro de 1913, segunda colunaO Paiz, 5 de setembro de 1913, última coluna).

 

 

Comentando sobre a conquista do direito ao voto pelas mulheres inglesas, Antenor Thibau lembrou, em um artigo no Jornal do Brasil, a atuação de Josephina em prol da emancipação feminina no Brasil (Jornal do Brasil, 27 de fevereiro de 1918, segunda coluna).

 

 

Leolinda Daltro (1859 – 1935), Mariana de Noronha Horta (18? – 19?) e Mietta Santiago (1903 – 1995)

 

Outra sufragista importante foi a professora, feminista e indigenista baiana Leolinda Daltro (1859 – 1935), fundadora do Partido Republicano Feminino, em 1910. Ela será tema de um artigo futuro da Brasiliana Fotográfica.

 

 

A professora de Belo Horizonte Mariana de Noronha Horta (18? – 19?) também teve um atuação relevante na luta pelo voto feminino: em agosto de 1916, encaminhou um requerimento pedindo aos deputados que aprovassem o sufrágio feminino. No acervo de documentos da Câmara Federal, esta é a primeira manifestação formal de uma mulher solicitando direitos políticos (Correio Paulistano, 17 de agosto de 1916; Site da Câmara dos Deputados).

 

 

Eleitora pioneira em Minas Gerais, a escritora e advogada Mietta Santiago (1903 – 1995), como ficou conhecida Maria Ernestina Carneiro Santiago Manso Pereira, nasceu em Varginha, em 1903, e, aos 11 anos, foi viver na capital mineira, onde estudou na Escola Normal de Belo Horizonte. Casou-se, em 1923, após passar cerca de seis meses na Europa, com o médico João Manso Pereira.

Com apenas 25 anos, em 1928, impetrou um mandado de segurança alegando que o veto ao voto das mulheres seria contrário ao artigo 70 da Constituição Brasileira de 24 de fevereiro 1891, então em vigor (O Paiz, 16 de setembro de 1928, quarta coluna; (Diário Carioca, 18 de setembro de 1928, terceira colunaO Paiz, 23 de setembro de 1928).

 

 

Tornou-se eleitora e candidatou-se a deputada federal, mas não conseguiu se eleger. O fato, uma verdadeira audácia para a época, mereceu versos do poeta, também mineiro, Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987):

 

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Além disso, Mietta fundou a Liga de Eleitoras Mineiras. Era amiga de políticos como Getulio Vargas (1882 – 1954) e Tancredo Neves (1910 – 1985) e de escritores como o memorialista Pedro Nava (1903 – 1984) e o poeta Carlos Drummond de Andrade (1902 – 1987). Como escritora, publicou as obras Namorada da Deus (1936), Maria Ausência (1940); e, em 1981, Uma consciência unitária para a humanidade e As 7 poesias. Faleceu, em 1995, no Rio de Janeiro.

Em 2017, foi instituída a Medalha Mietta Santiago, condecoração concedida anualmente pela Secretaria da Mulher e pela Presidência da Câmara de Deputados (Site da Câmara de Deputados).

 

Outras sufragistas brasileiras de destaque

 

Outras feministas destacadas na luta pelo voto feminino foram a urbanista, arquiteta e engenheira mato-grossense Carmen Portinho (1903 – 2001), a sindicalista alagoana Almerinda Farias Gama (1899 – 1999), a advogada mineira Elvira Komel (1906 – 1932)Maria Prestia (? – 1988), líder de um minoritário grupo de feministas de São Paulo; Júlia Augusta de Medeiros (1896 – 1972), uma das pioneiras no jornalismo, na educação e no feminismo no Rio Grande do Norte; e a advogada gaúcha Natércia da Cunha Silveira (1905 – 1993). Todas já foram temas de artigos publicados na Brasiliana Fotográfica.

 

 

 

 

 

Meses após à conquista do voto das mulheres no Brasil, ainda em 1932, Natércia e Bertha foram nomeadas para integrar a comissão para elaborar o anteprojeto da nova Constituição (Correio da Manhã, 14 de julho de 1932, terceira colunaCorreio da Manhã, 19 de julho de 1932, primeira colunaBrasil Feminino, dezembro de 1932). Em 1934, o sufrágio feminino estava contemplado na Constituição Federal.

 

 

Sobre a importância da conquista do sufrágio feminino, em entrevista, Carmen Portinho declarou que ela deveria ser um estímulo para outros avanços: “Obtivemos a nossa emancipação política, mas esse direito assim isolado, de que nos serve?” (A Noite, 17 de agosto de 1933, última coluna).

Cerca de seis meses antes da assinatura do Decreto nº 21.076, o jornal A Batalha, de 13 de setembro de 1931, publicou uma reportagem intitulada A nova legislação eleitoral e o voto feminino, com a história do movimento feminista no Brasil, onde a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, dirigido por Bertha, a União Universitária Feminina, sob a direção de Carmen Portinho (1903 – 2001); e a Aliança Nacional de Mulheres, liderado por Natércia da Cunha Silveira (1905 – 1993), foram citadas como importantes iniciativas para a emancipação da mulher no país. Na matéria foi publicada também a lista dos países onde as mulheres já possuíam direito ao voto e comentada a liderança do Rio Grande do Norte na concessão de direitos políticos às mulheres, por intermédio do governador Juvenal Lamartine de Faria (1874 – 1956). Foi transcrito também o discurso proferido por Ruy Barbosa (1849 – 1923) no Teatro Lyrico em apoio à causa feminina (A Batalha, 13 de setembro de 1931).

 

 

Em 1933, houve eleição para a Assembleia Nacional Constituinte, e as mulheres puderam votar e terem seus votos reconhecidos pela primeira vez. A primeira mulher eleita foi Carlota Pereira de Queiróz (1892 – 1992), em São Paulo.

 

 

Outra pioneiras, eleitas um ano depois, em 1934, foram Bertha Lutz (1894 – 1976), no Rio de Janeiro; Lili Lages (1907 – 2003), em Alagoas; Maria Luiza Bittencourt Dória (1910 – 2001), na Bahia; Quintina Diniz de Oliveira (1878 – 1942), em Sergipe; e Maria de Miranda Leão (1887 – 1976), no Amazonas.

 

 

 

 

 

 

Nas eleições de outubro de 2022 no Brasil, o número de mulheres que tiveram suas candidaturas registradas junto à Justiça Eleitoral foi de 9.415, 33,28% do total de políticos elegíveis – 91 mulheres foram eleitas a deputadas federais e quatro para o Senado. As mulheres representavam 53% do eleitorado do país – 82 milhões de votantes. Há ainda um longo caminho a percorrer.

 

 

 

O Rio Grande do Norte e a vanguarda do voto feminino

 

 

Em 1927, houve uma eleição no Rio Grande do Norte e Juvenal Lamartine de Faria (1874 – 1956), que havia renunciado ao Senado, concorreu ao governo de seu estado e venceu o pleito. Tomou posse em 1º de janeiro de 1928. Foi necessário realizar eleições complementares para a escolha de um novo senador. Juvenal apoiava a causa do voto das mulheres. Em 25 de outubro de 1927, ainda durante o governo de José Augusto Bezerra de Medeiros, passou a vigorar a Lei Estadual nº 660, com a emenda Regular o Serviço Eleitoral do Estado, que estabelecia a não distinção de sexo para o exercício do sufrágio e, tampouco, como condição básica de elegibilidade.

Há uma polêmica em torno da primeira eleitora do Brasil na historiografia do feminismo no Brasil no século XX: a natalense e professora Júlia Alves Barbosa Cavalcanti (1898 – 1943) requereu seu alistamento eleitoral no dia 22 de novembro de 1927, porém, dada à sua condição de solteira, o juiz da 1ª vara da Capital retardou o deferimento de seu pleito, que só foi publicado, no Diário Oficial do Estado, no dia 1º de dezembro do mesmo ano. Em 25 de novembro de 1927, a professora Celina Guimarães Viana (1890 – 1972), de Mossoró, deu entrada em uma petição, requerendo sua inclusão na lista de eleitores, que foi aprovada rapidamente, pelo fato de ser casada com um advogado e professor (O Paiz, 2 de dezembro de 1927, primeira coluna). Reivindicando o voto das mulheres, a escritora cearense Rachel de Queiroz (1910 – 2003), com apenas 17 anos, escreveu o artigo Essa questão do voto feminino, publicado no jornal A Jandaia, em 14 de janeiro de 1928. As eleições municipais foram realizadas no dia 5 de abril de 1928, mas os votos das eleitoras foram anulados porque o Senado não reconheceu o direito de voto das mulheres.

 

Júlia Alves Barbosa Cavalcanti foi eleita para a Câmara Municipal de Natal.

 

 

Apesar de, do ponto de vista eleitoral, o estado do Rio Grande do Norte ter reconhecido esta igualdade, faltava, porém, a concretização do “voto de saias”, o que ocorreu nas eleições municipais realizadas no dia 05 de abril de 1928. Em Natal votaram Antônia Fontoura, Carolina Wanderley, Júlia Barbosa e Lourdes Lamartine. Em Mossoró, além de Celina Guimarães, votaram Beatriz Leite e Eliza da Rocha Gurgel. Em Apodi as primeiras eleitoras foram Maria Salomé Diógenes e Hilda Lopes de Oliveira. Em Pau dos Ferros, Carolina Fernandes Negreiros, Clotilde Ramalho, Francisca Dantas e Joana Cacilda Bessa. Ainda em Caicó e Acari, respectivamente, Júlia Medeiros e Martha Medeiros. Além de votar, algumas mulheres, a exemplo de Júlia Alves Barbosa em Natal e Joana Cacilda de Bessa em Pau dos Ferros,  foram também eleitas para o cargo de intendente municipal, equivalente a vereador atualmente.

Centro de Memória do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte

 

 

 

Acesse aqui a linha do tempo da conquista do voto feminino publicada no portal da Câmara dos Deputados

 

 

Alguns países e o ano da aprovação do voto feminino

 

1893 – Nova Zelândia

1902 – Austrália

1906 – Finlândia

1907 –  Noruega

1915 - Dinamarca e Islândia

1917 - Rússia

1918 – Áustria, Alemanha, Polônia, Lituânia, Reino Unido e Irlanda

1920 - Estados Unidos

1929 – Equador

1931 – Espanha e Portugal (com limitações). Na Espanha, o direito foi suspenso em 1936 e só voltou a vigorar em 1977.

1932 – Brasil e Uruguai

1934 - Turquia

1944 - França

1945 – Itália e Japão

1947 - Argentina e Índia

1952 – Grécia

1953 - China e México

1955 – Honduras

1956 - Egito

1962 - Bahamas e Mônaco

1970 – Andorra

1971 – Suíça

1980 – Iraque

1994 – Omã

2015 – Arábia Saudita

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

BARBOSA, Lia Pinheiro; MAIA, Vinicius Madureira. Nísia Floresta e ainda a controvérsia da tradução de Direitos das mulheres e injustiça dos homens. Revista Estudos Feministas, 28 (2), 2020.

BARP, Guilherme. A luta de Josefina Álvares de Azevedo pelos direitos das mulheres em A mulher moderna (1891). Nau Literária, Vol. 18, n. 01 (2022) – Dossiê: Racismo, sexismo e Direitos Humanos. Organizado pela Profa. Dra. Regina Zilberman (UFRGS), 5 de setembro de 2022.

CAMPOI, Isabela Candeloro. O livro “Direitos das mulheres e injustiça dos homens” de Nísia Floresta: literatura, mulheres e o Brasil do século XIX. História (São Paulo) v.30, n.2, p. 196-213, ago/dez 2011.

Centro de Referências em Educação Integral

COELHO, Catarina Alves. Direito das Mulheres e Injustiça dos Homens: a tradução utópico-feminista de Nísia Floresta. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de filosifia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 2019.

CORREA E SILVA, Laila. O direito ao voto feminino no século XIX brasileiro: a atuação política de Josephina Álvares de Azevedo (1851-1913). Aedos, Porto Alegre, v. 10, n. 23, p. 114-131, Dez. 2018

DUARTE, Constância Lima. As viagens e o discurso autobiográfico de Nísia Floresta. Matraga, Rio de Janeiro, v.16, n.25, jul./dez. 2009.

DUARTE, Constância Lima. Imprensa feminina e feminista no Brasil: século XIX . Belo Horizonte: Autêntica, 2016.

DUARTE, Constância Lima. Narrativas de viagem de Nísia Floresta. Via Atlântica, n. 2 jul. 1999.

DUARTE, Constância Lima. Nísia Floresta: Incompreensão em relação à sua genialidade. Ciência & Trópico, Recife, v. 26, n. 2, p. 253-260,julho /dez, 1998. 

DUARTE, Constância Lima. Nísia Floresta: a primeira feminista do Brasil. Florianópolis: Editora Mulheres, 2005.

DUARTE, Constância Lima. Nísia Floresta: vida e obra. Natal: Editora Universitária/UFRN, 1995.  

FLORESTA , Nísia. Opúsculo humanitário / Nísia Floresta ; prefácio Maria da Conceição Lima Alves ; notas Maria Helena de Almeida Freitas, Mônica Almeida Rizzo Soares. – Brasília : Senado Federal, 2019

HAHNER, June E. A mulher brasileira e suas lutas sociais e políticas: 1850-1937. São Paulo: Brasiliense, 1981.

HALLEWELL, Laurence. (2005). O livro no Brasil: sua historia. São Paulo : Edusp, 2055.

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

ITAQUI, Antônio Carlos de Oliveira. Nísia Floresta: ousadia de uma feminista no Brasil do século XIX. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial à obtenção do grau de Licenciatura Plena em História, do Departamento de Humanidades e Educação da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, 2013.

KARAWEJCZYK, Monica. Mulher Deve Votar? O Código Eleitoral de 1932 e a Conquista do Sufrágio Feminino através das páginas dos jornais Correio da Manhã e A Noite. São Paulo : Paco Editorial, 2019.

LEMES, Camila Assis. O jornal Familia e o debate sobre o voto feminino nos primeiros anos da república brasileira. XIV Encontro Regional de História. UEPR, 2014.

LUCA, Leonora de. A mensageira: uma revista de mulheres escritoras na modernização bra-sileira. 1999. 581 f. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Curso de Mestrado em Sociologia, Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1999.

MARQUES, Teresa Cristina de Novaes. O voto feminino do Brasil. Brasília : Edições Câmara, 2019.

MELO, Ezilda. Nísia Floresta: uma mulher à frente de seu tempo. Empório do Direito, 19 de novembro de 2015.

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MUZART, Zahidé Lupinacci (Org.). Escritoras brasileiras do século XIX: antologia. 2. ed. vol. II. Florianópolis: Editora Mulheres; Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2000.

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Portal da Câmara dos Deputados

Portal do Senado

RIBEIRO, Antônio Sérgio. A mulher e o voto. São Paulo: ALESP, 2012.

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Site Geledés

Site Insider

Site Superior Tribunal Eleitoral

Site Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte

Site Uvesp

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TRINDADE, Hélgio; NOLL, Maria Izabel. Subisídios para a história do Parlamento Gaúcho (1890-1937). Porto Alegre : CORAG, 2005.

Wikipedia

 

Acesse aqui os outros artigos da Série “Feministas, graças a Deus!

Série “Feministas, graças a Deus!” I – Elvira Komel, a feminista mineira que passou como um meteoro, publicado em 25 de julho de 2020, de autoria da historiadora Maria Silvia Pereira Lavieri Gomes, do Instituto Moreira Salles, em parceria com Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” II  – Natércia da Cunha Silveira (1905 – 1993), o jequitibá da floresta, publicado em 20 de agosto de 2020, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” III  – Bertha Lutz e a campanha pelo voto feminino: Rio Grande do Norte, 1928, publicado em 29 de setembro de 2020, de autoria de Maria do Carmo Rainha, doutora em História e pesquisadora do Arquivo Nacional

Série “Feministas, graças a Deus!” IV  – Uma sufragista na metrópole: Maria Prestia (? – 1988), publicado em 29 de outubro de 2020, de autoria de Claudia Heynemann, doutora em História e pesquisadora do Arquivo Nacional

Série “Feministas, graças a Deus!” V – Feminista do Amazonas: Maria de Miranda Leão (1887 – 1976), publicado em 26 de novembro de 2020, de autoria de Maria Elizabeth Brêa Monteiro, mestre em História e pesquisadora do Arquivo Nacional

Série “Feministas, graças a Deus!” VI – Júlia Augusta de Medeiros (1896 – 1972) fotografada por Louis Piereck (1880 – 1931), publicado em 9 de dezembro de 2020, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” VII – Almerinda Farias Gama (1899 – 1999), uma das pioneiras do feminismo no Brasil, publicado em 26 de fevereiro de 2021, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” VIII – A engenheira e urbanista Carmen Portinho (1903 – 2001), publicado em 6 de abril de 2021, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” IX – Mariana Coelho (1857 – 1954), a “Beauvoir tupiniquim”, publicado em 15 de junho de 2021, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” X – Maria Luiza Dória Bittencourt (1910 – 2001), a eloquente primeira deputada da Bahia, publicado em 25 de março de 2022, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” XI e série “1922 – Hoje, há 100 anos” VI – A fundação da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, publicado em 9 de agosto de 2022, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” XII e série “1922 – Hoje, há 100 anos” XI – A 1ª Conferência para o Progresso Feminino, publicado em 19 de dezembro de 2022, de autoria de Maria Elizabeth Brêa Monteiro, historiadora do Arquivo Nacional

Série “Feministas, graças a Deus!” XIV – No Dia Internacional da Mulher, Alzira Soriano, a primeira prefeita do Brasil e da América Latina, publicado em 8 de março de 2023, de autoria de Andrea C T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” XV – No Dia dos Povos Índígenas, Leolinda Daltro,”a precursora do feminismo indígena” e a “nossa Pankhurst, publicado em 19 de abril de 2023, de autoria de Andrea C T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica

Série “Feministas, graças a Deus!” XVI – O I Salão Feminino de Arte, em 1931, no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, pesquisadora e editora do portal Brasiliana Fotográfica, publicado em 30 de junho de 2023

Série “Feministas, graças a Deus!” XVII – Anna Amélia Carneiro de Mendonça e o Zeppelin, equipe de Documentação da Escola de Ciências Sociais FGV CPDOC, em parceira com Andrea C.T. Wanderley, publicado em 5 de janeiro de 2024

Dia Nacional da Consciência Indígena

O Dia Nacional da Consciência Indígena é celebrado desde 20 de janeiro de 2013 e relembra a morte do cacique Aimberê (15? – 1567), considerado uma grande liderança da Confederação dos Tamoios ou Guerra dos Tamoios, ocorrida entre 1554 e 1567, no sul fluminense e no litoral norte do estado de São Paulo – um combate dos povos originários contra a colonização dos portugueses no Brasil. Em 20 de janeiro de 1567, aconteceu a Batalha de Uruçumirim, na atual região das praias do Flamengo e da Glória, que arrasou o reduto dos tamoios no Rio de Janeiro.

 

 

A Brasiliana Fotográfica comemora a data com a publicação de uma seleção de imagens de indígenas presentes em seu acervo fotográfico. Os índios brasileiros foram retratados por diversos fotógrafos do século XIX, muitos representados no acervo do portal. Os identificados são todos não indígenas. São registros produzidos por Albert Frisch (1840 – 1918), Dana B. Merril (1887 – 19?), Felipe Augusto Fidanza (c.1847 – 1903), Franz Keller (1835 – 1890), Hercule Florence (1804 – 1879), Marc Ferrez (1843 – 1923), Vincenzo Pastore (1865 – 1918), Walter Garbe (18? – 19?) e também por fotógrafos ainda não identificados.

É essencial que indígenas participem dos processos de catalogação, arquivamento e identificação das imagens dos acervos históricos de fotografias e também da forma de expô-las, criando novas narrativas para esses registros e gerando novos olhares sobre a história dos povos originários no Brasil. Nos últimos anos, este processo tem se intensificado significativamente.

 

 

Acessando o link para as fotografias de indígenas selecionadas e disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá visualizar e magnificar as imagens.

 

 

Foi em 20 de janeiro de 2013, em meio a uma polêmica em torno da demolição do antigo Museu do Índio, no Maracanã, (Jornal do Commercio, 17 de janeiro18,19 e 20 de janeiro; 29 de janeiro; 21 de fevereiro; 25 de março; 1 de agosto; 6 de agosto, 13 de agosto e 14 de agosto de 2013), no Rio de Janeiro  que os representantes indígenas da aldeia Maracanã, liderados por Carlos Tukano, lançam oficialmente o ” DIA NACIONAL DA CONSCIÊNCIA INDÍGENA’, depois de lerem um texto de Caetano Veloso em apoio à luta dos representantes dos povos Indígenas do Brasil, que querem construir uma Embaixada Indígena na Aldeia Maracanã no Rio de Janeiro (MamaPress).

O prédio abrigou o Museu do Índio de 1953 a 1977, e, após a polêmica de 2013, foi tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (INEPAC), em 13 de agosto de 2013.

Assista aqui o vídeo do lançamento do Dia Nacional da Consciência Indígena:

 

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O GLOBO, 20 de janeiro de 2013

O GLOBO, 20 de janeiro de 2013

 

A criação da data era uma idéia que estava germinando na cabeça de Marcos Terena desde 1985, quando subiu a Serra da Barriga, acompanhando o Movimento Negro Brasileiro, que comemorava o tombamento da montanha em que Zumbi dos Palmares enfrentou os colonialistas escravizadores e morreu defendendo a liberdade e igualdade de todos no Brasil (MamaPress).

 

 

 

No Censo 2010 do IBGE, 896.917 pessoas declararam-se indígenas, pertencentes a 305 etnias que falam 274 línguas diferentes, dos quais 572.083 viviam na zona rural e 324.834 habitavam as zonas urbanas brasileiras. Ainda segundo o Censo 2010, as comunidades indígenas estão presentes nas cinco regiões do Brasil, sendo que a Região Norte é aquela que concentra o maior número de indivíduos, 305.873 mil – aproximadamente 37,4% do total. Na Região Norte, o estado com o maior número de indígenas é o Amazonas, representando 55% do total. O conjunto dos 10 municípios com maior população indígena reúne 126,6 mil indígenas, correspondendo a 15,5% do total de indígenas do país, e metade possui população superior a 10 mil indígenas. À época, os cinco municípios mais populosos desse conjunto eram os seguintes: São Gabriel da Cachoeira (Amazonas), São Paulo de Olivença (Amazonas), Tabatinga (Amazonas), São Paulo e Santa Isabel do Rio Negro (Amazonas).

 

Uma curiosidade: o quadro abaixo, O Último Tamoio, foi pintado por Rodolfo Amoedo (1857 – 1941), em 1883, e retrata justamente o cacique Aimberê com o padre José de Anchieta (1534 – 1597). Foi pintado em Paris, onde participou da Exposição de Belas Arte (Ministério do Império, 1883). Foi exibida pela primeira vez ao público brasileiro em 1884, na Exposição Geral de Belas Artes no Rio de Janeiro (Gazeta de Notícias, 4 de setembro de 1884, quinta coluna). No catálogo distribuído pela Academia Imperial de Belas Artes foi descrito assim: “O padre Anchieta encontra em deserta praia o cadáver de Aimberê, o chefe dos Tamoios, e o contempla comovido antes de prestar-lhe os últimos deveres de sacerdote cristão”.

 

 

A Brasiliana Fotográfica agradece a colaboração de Sérgio Burgi, Coordenador de Fotografia do IMS, e um dos curadores do portal.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

CAVALCANTI, Ana Maria Tavares. O último tamoio e o último romântico. In: Revista de História da Biblioteca Nacional. Nov.2007.

Depoimento da jornalista Renata Tupinambá

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

História do Rio Para Todos

O GLOBO

Mamapress

MultiRio

Portal Câmara dos Deputados

Portal Fundação Nacional dos Povos Indígenas

Portal MultiRio

Portal UOL

Site Aldeia Maracanã

Site Instituto Estadual do Patrimônio Cultural

Série “1922 – Hoje, há 100 anos” VIII – A abertura da Exposição Internacional do Centenário da Independência do Brasil e o centenário da primeira grande transmissão pública de rádio no país

 

“Uma exposição universal era um inventário das regiões do mundo e do conhecimento humano, contemplava o ‘novo’ e também o ‘exótico’. Participar da exposição era como existir sobre a face da Terra; percorrê-la era como dar uma volta ao mundo”.

Portal da Biblioteca Nacional

 

A Exposição Internacional do Centenário da Independência, um dos maiores eventos internacionais já realizados no Brasil, é o assunto do oitavo artigo da Série 1922 – Hoje, há 100 anos. Foi uma espécie de vitrine do progresso nacional e mundial. Essa era a tradição característica das exposições universais, cuja primeira foi realizada, em 1851, em Londres: eram espetáculos da civilização industrial e do trabalho, feiras de negócios e de estímulo à cultura, que colocavam os centros urbanos como os pólos da modernidade.

 

A Exposição de 1922 foi a primeira exposição universal realizada após a Primeira Guerra Mundial e o mundo estava mobilizado por uma vontade de renovação. Mobilização evidenciada pelo envolvimento da população em geral e também da intelectualidade brasileira com o evento. Avaliações sobre os cem anos do Brasil como país independente eram feitas e havia a percepção de que o país ainda não havia se constituido como nação. Formava-se então a geração intelectual dos anos 20 cujo compromisso era criar a nação, forjar a identidade nacional e construir o Brasil moderno (APUD MOTTA, 1992:18).

 

“O Centenário de nossa Independência veio  encontrar-nos com a máscara do século em nosso rosto”

Careta, 9 de setembro de 1922

 

Foi a primeira exposição universal sediada no Brasil, cuja primeira participação nessas exposições aconteceu em 1862, em Londres, com o apoio e subsídio de dom Pedro II (1825 – 1891) como forma de colocar o país, a partir da exibição de avanços científicos e de sua estabilidade política, no patamar dos países civilizados.

 

 

A Exposição de 1922 foi inaugurada no Rio de Janeiro em 7 de setembro de 1922, há exatos 100 anos, e terminou em 24 de julho do ano seguinte (O Paiz, 25 de julho de 1923). Seu fim estava previsto para 31 de março de 1923, mas foi prorrogada até julho. Segundo o último número da revista A Exposição de 1922, órgão de divulgação do evento, entre 7 de setembro de 1922 e 2 de julho de 1923, foi visitada por 3.626.402 pessoas, uma média de 12.723 visitantes por dia (A Exposição de 1922, edições 17 e 18) Na edição do Jornal do Commercio, de 2 e 3 de julho de 1923, foi publicado um artigo intitulado As lições da exposição.

Por tudo o que aconteceu no Rio de Janeiro durante a Exposição Internacional do Centenário da Independência do Brasil, ela é considerada um marco do encontro do Brasil com a modernidade.

Também em 2 de julho de 1923, comemorou-se o centenário da independência da Bahia (Jornal do Commercio, 2 e 3 de julho de 1923, penúltima coluna).

 

 

Com fotografias realizadas ao longo do evento foi produzido o Álbum Internacional do Centenário da Independência  de autoria de Carlos Bippus, Thiele & Kollien e Lopes. 

 

 

Muitos anos depois, em 1987, um dos exemplares deste álbum foi apresentado ao Conselho Deliberativo do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, durante uma homenagem ao presidente da White Martins, Félix de Bulhões, que havia feito uma doação de 200 mil dólares à instituição para a compra de, além do álbum citado, mais três – um sobre Salvador, de 1933; um sobre a Estrada de Ferro Sorocabana, com fotos do suíço Guilherme Gaensly (1843 – 1928), de 1908; e um com fotos do Rio de Janeiro, produzidas por Marc Ferrez (1843 – 1923), no início do século XX -, 11 quadros, uma escultura e uma sequência de fotos que forma o Panorama 360º da cidade de Petrópolis, de autoria do alemão Jorge Henrique Papf (1863 – 1920), de 1898 (Jornal do Brasil, 23 de outubro de 1987, última coluna).

 

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Acessando o link para as fotografias do Álbum Internacional do Centenário da Independência disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

Em algumas fotografias do Álbum Internacional do Centenário da Independência pode-se admirar a iluminação feérica do evento, organizada pelo engenheiro inglês W. D´Arcy Ryan (1870 – 1934), que havia sido o responsável pela iluminação da Exposição de São Francisco, na Califórnia, em 1916. Esteve no Rio de Janeiro, em dezembro de 1921, quando expôs seu plano de iluminação para a Exposição de 1922 (Correio da Manhã, 14 de dezembro de 1921, quarta coluna). A execução da instalação foi realizada pela General Electric, com a supervisão de um engenheiro da empresa, J. W. Shaffer. O Engenheiro Chefe Eletricista da Comissão Organizadora, Roberto Marinho de Azevedo, e seu auxiliar, o engenheiro Eugênio Hime, também participaram da instalação. “Essa iluminação é reputada igual senão superior a tudo que se tem feito de mais grandioso até hoje” (Revista da Exposição de 1922, outubro de 1922).

 

 

Destacamos também imagens realizadas por Augusto Malta (1864 – 1957), fotógrafo oficial da prefeitura do Rio de Janeiro, pelo amador Guilherme Santos (1871 – 1966), por Jorge Kfuri (1893 – 1965), autor das primeiras fotos aéreas do Rio de Janeiro; por Marc Ferrez (1843 – 1923), com registros coloridos e em preto e branco; e por fotógrafos ainda não identificados.

 

 

São imagens dos pavilhões dos Estados e dos países, do Chalé Moça, da Nestlé; do Pavilhão Matarazzo, do Parque de Diversões, do Palácio das Festas, do Palácio do Calabouço, do Bar da Cervejaria Antártica, do restaurante, de marinheiros do navio de guerra norte-americano Nevada, de aspectos da demolição do Morro do Castelo, e do Hotel Glória, primeiro hotel cinco estrelas do Brasil e também o primeiro prédio em concreto armado da América do Sul, projetado pelos arquitetos francês Joseph Gire (1872 – 1933) e alemão Sylvio Riedlinger e construído pela família Rocha Miranda especialmente para a ocasião.

 

 

Dois outros hotéis de grande porte foram construídos devido à realização da exposição: o Hotel Sete de Setembro ou Hotel do Centenário, na Avenida do Contorno do Morro da Viúva, atual Avenida Rui Barbosa e inaugurado em 15 de julho de 1922; e o Hotel Copacabana Palace, cuja inauguração, em 13 de agosto de 1923, aconteceu após o término da exposição. Foi projetado pelo arquiteto francês Joseph Gire (1872 – 1933) e construído por Otávio Guinle. Um hotel de menor porte, também construído na época, foi o Hotel Regina, inaugurado em 3 de setembro de 1922, na rua Ferreira Vianna, nº 29, onde funciona até os dias atuais.

 

 

 

 

 

Acessando o link para as fotografias da Exposição do Centenário da Independência produzidas por Augusto Malta, Guilherme Santos, Jorge Kfuri, Marc Ferrez e por fotógrafos ainda não identificados disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

 

Fotos do mesmo pavilhão realizadas por diferentes fotógrafos:

 

Palácio das Festas por Carlos Bippus, Guilherme Santos e Marc Ferrez

Parque de Diversões por Augusto Malta, Marc Ferrez e Thiele & Kollien

Pavilhão da Inglaterra por Guilherme Santos, Marc Ferrez e Thiele & Kollien

Pavilhão da Itália por Augusto Malta, Marc Ferrez e Thiele & Kollien

Pavilhão da Tchecoslováquia por Augusto Malta, Marc Ferrez e Thiele & Kollien

Pavilhão de Caça e Pesca e Pavilhão de Estatística por Augusto Malta e Marc Ferrez

Pavilhão de Portugal por Guilherme Santos e Photo Lopes

Pavilhão do Japão por Guilherme Santos e Thiele & Kollien

Pavilhão do México por Augusto Malta, Marc Ferrez e Thiele & Kollien

Pavilhão ou Palácio dos Estados por Augusto Malta, Carlos Bippus e Marc Ferrez 

Pavilhão Matarazzo por Marc Ferrez e Thiele & Kollien

 

Breve perfil da Exposição Internacional do Centenário da Independência

 

 

“Qualquer coisa de grande nos levanta o peito ao arfar das esperanças novas e muita coisa de ingênuo, de cândido, de infantil nos toca as fibras mais íntimas adoçando-nos a alma no seguir com os olhos o caminho do passado”.

O Paiz, 7 de setembro de 1922

 

 

Já no primeiro número da Revista do Brasil, em janeiro de 1916, chamava-se atenção para a necessidade de se comemorar o centenário da independência, classificado como o primeiro marco glorioso da existência nacional. Na edição de setembro de 1917 do periódico Eu sei tudo foi publicado o artigo Noventa e cinco anos de independência, de Mario Bhering, onde o autor afirmava que com “a aproximação do Centenário da nossa Independência parece que se afervora o culto cívico, o ardor patriótico pelo 7 de setembro, ganhando de intensidade ano para ano”.

 

 

“…que momento poderia ser mais adequado do que este em que festejamos o centenário da nossa independência política? Precisamos demarcar as fronteiras do espírito nacional como já se fixaram as do território”.

Francisco Pontes de Miranda (1892 – 1979), jurista e intelectual brasileiro

 

 

A grandiosa Exposição Internacional do Centenário da Independência foi imaginada bem antes de sua realização. Em maio de 1920,  o representante de um grupo de capitalistas estrangeiros no Brasil, Ralph Cobham, sugeriu ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio que se realizasse no país em terrenos de Copacabana uma exposição internacional de comércio e indústria para a comemoração do Centenário da Independência. Em outubro, ele foi nomeado cônsul em Durban, na África do Sul (Correio Paulistano, 30 de maio de 1920, quarta coluna; O Paiz, 18 de outubro de 1920, terceira coluna). O deputado Paulo de Frontin (1860 – 1933) propôs, em julho do mesmo ano, que o governo liberasse uma verba de 100 mil contos de réis para o evento (Jornal do Brasil, 16 de julho de 1920, penúltima colunaRevista da Semana, 1º de janeiro de 1921).

O Decreto nº 4.175, de 11 de novembro de 1920, determinou a realização de uma Exposição Nacional na Capital da República integrando o programa de comemorações do Centenário da Independência.

 

Decreto nº 4.175, de 11 de novembro de 1920

 

Autoriza o Poder Executivo a promover, conforme melhor convier aos interesses nacionaes, a commemoração do Centenario da Independencia Politica do Brasil

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil:
Faço saber que o Congresso Nacional decretou e eu sancciono a resolução seguinte:

Art. 1º Fica o Poder Executivo autorizado a promover desde já e conforme melhor convier aos interesses nacionaes, a commemoração do Centenario da Independencia Politica do Brasil, acceitando a cooperação ou concurso de todas classes sociaes, observadas as seguintes condições: 1ª Constituição de uma commissão idonea, que ficará directamente subordinada ao Presidente da Republica, para organizar o programma que resultar do exame e coordenação dos projectos que forem formulados pelos membros e commissões do Congresso, Ministros, Prefeitura do Districto Federal, Estados, municipalidades ou particulares; 2ª Observação do criterio de preferencia para a realização de uma Exposição Nacional na Capital da Republica.

Art. 2º O Governo organizará o programma da commemoração, submettendo-o ao conhecimento do Congresso, com o pedido de credito necessario para a execução da presente lei.

Art. 3º Revogam-se as disposições em contrario.

Rio de Janeiro, 11 de novembro de 1920, 99º da Independencia e 32º da Republica.

EPITACIO PESSÔA.
Alfredo Pinto Vieira de Mello.

 

A regulamentação oficial das atividades comemorativas foi determinada pelo Decreto nº 15.066, de 24 de outubro de 1921. O Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, sob a chefia do engenheiro José Pires do Rio (1880 – 1950), foi o responsável pela organização da exposição, que, segundo o programa para a comemoração do 1º Centenário da Independência Política do Brasil, deveria compreender as principais modalidades do trabalho no Brasil, atinentes à lavoura, à pecuária, à pesca, à indústria extrativa e fabril, ao transporte marítimo, fluvial, terrestre e aéreo, aos serviços de comunicação telegráficos e postais ao comércio, às ciências e às belas artes (apud MOTTA, 1992: 67).

 

Decreto nº 15.066, de 24 de outubro de 1921

 

Dá execução ao Decreto Legislativo n. 4.175, de 11 de novembro de 1920.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil, tendo em vista o que dispõe o Decreto Legislativo n. 4.175, de 11 de novembro de 1920,

DECRETA:

Art. 1º A Commissão, de que trata o n. 1 do art. 1º do citado decreto, ficará constituida do Ministro da Justiça e Negocios Interiores, do Ministro da Agricultura, Industria e Commercio e do Prefeito do Districto Federal.

Art. 2º A Commissão providenciará para a execução do programma da Commemoração do Centenario da Independencia Politica do Brasil, já organizado, com as modificações que se tornarem necessarias.

Art. 3º As attribuições dos membros da Commissão e a discriminação dos serviços a cargo de cada um delles, serão reguladas pelo Regimento Interno que, para esse fim, deverá ser organizado pela mesma Commisão.

Art. 4º Revogam-se as disposições em contrario.

Rio de Janeiro, 24 de outubro de 1921, 100º da Independencia e 33º da Republica.

EPITACIO PESSÔA.
Joaquim Ferreira Chaves.

 

 

A realização de uma “Exposição Universal” no Rio de Janeiro, então capital federal, destacou-se como a mais ambiciosa das atividades comemorativas então programadas. Desde a primeira exposição internacional em Londres (1851), cujo símbolo foi o Palácio de Cristal, as chamadas “vitrines do progresso” sempre apresentaram alguns aspectos em comum, entre os quais se destacavam, entre outros, as motivações comerciais, o afluxo de divisas e turistas, o impacto sobre a infraestrutura urbana, e a difusão de valores e de padrões de conduta. O mais importante, e ainda hoje é assim, era a afirmação do prestígio nacional, representado pelos pavilhões de cada país que constituíam a ossatura das exposições.

Atlas Histórico do Brasil – FGV – CPDOC

 

 

 

 

Em julho de 1922, foi lançada pelo Órgão da Comissão Organizadora da Exposição do Centenário a revista A Exposição de 1922, dirigida por Antônio Assis de Pádua Rezende. Foram publicados 18 edições (Revista da Exposição de 1922, julho de 1922).  A comissão Organizadora era presidida pelo ministro interino da Agricultura Indústria e Comércio e também ministro da Viação e Obras Públicas, José Pires do Rio (1880 – 1950), sendo Antônio Olintho dos Santos Pires (1860 – 1925) o primeiro vice-presidente e Antônio Assis de Pádua Rezende o segundo vice-presidente. Delfim Carlos da Silva era o secretário-geral e Mário Barbosa Carneiro, tesoureiro.

 

 

No dia 7 de setembro de 1922, as comemorações do centenário foram abertas. O presidente da República, Epitácio Pessoa (1865 – 1942), assistiu na Praça Deodoro o desfile das tropas, vendo-se em primeiro lugar os contingentes estrangeiros em fraternal solidariedade com as forças nacionais. Depois o presidente assistiu ao Juramento da Bandeira, realizado pelos alunos das escolas públicas municipais, na Prefeitura.

Às 14 horas, no Palácio do Catete, Epitácio Pessoa recebeu os cumprimentos das Embaixadas Estrangeiras, do Corpo Diplomático, de Comissários Gerais, de membros do Congresso Nacional, de oficiais de terra e mar, e do alto funcionalismo público.

Finalmente, às 16h, no Palácio das Festas, Epitácio inaugurou solenemente a exposição. O evento ocupou uma grande área – do Passeio Público à Ponta do Calabouço e, de lá, se estendia pelo espaço aberto com a demolição do Morro do Castelo (O Paiz, 8 e 9 de setembro de 1922).

 

“Nenhuma linhagem falará melhor do que o certame que hoje inauguramos. Ele não se realiza como pretexto para festins, mas como demonstração de esforços extraordinários de inteligência consumidos num século de atividade, em quase todos os ramos de trabalho. Haverá aí mostras desse passado. Umas servirão para acentuar como os povos devem guardar certos patrimônios legados por seus maiores; outras servirão para  abrir os olhos aos que se aferram à rotina, e hão de constituir, pela comparação com os produtos aperfeiçoados aqui expostos, benéfico estímulo para melhorar e progredir”.

Trecho do discurso proferido por Joaquim Ferreira Chaves (1852 – 1937),ministro da Justiça,

na inauguração oficial da Exposição de 1922

 

 

 

À noite, o presidente recebeu convidados, dentre eles todos os membros das representações oficiais no Theatro Municipal, onde foi apresentada a ópera O Guarany, de autoria de Carlos Gomes (1836 – 1896).

 

 

 

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 O Paiz, 8 de setembro de 1922

 

Dentre as comemorações civis do Centenário teve um destaque sem par a inauguração da Exposição.

Do que é, ou melhor, do que vae ser esse certamen internacional póde-se ter uma idéia pelo qual já está prompto. Num esforço colossal, cuja gloria cabe ao governador da cidade, conquistou-se á Guanabara o alargamento da Avenida Wilson e derrubou-se boa parte do innominavel bairro da Misericórdia, para se fazer surgir em todo esse terreno um conjunto suprehendente de palácios e pavilhões , que, uma vez concluídos com todos os seus detalhes fará a maior honra á nossa engenharia civil. E não se trata de construções ligeiras. A maioria do que está ali existe é para ficar: é para fazer parte do novo bairro – que o arrasamento do Morro do Castelo ampliará até o coração da cidade.

Sem falar nos pavilhões estrangeiros, quasi todos muito notáveis, temos o Palácio das Festas que é verdadeiramente grandioso, e o Palácio das Industrias, que é um assombro de transformação e aproveitamento do velho Arsenal de Guerra – obra que, sem favor, se pode chamar genial. Todo aquelle antigo aspecto sinistro da penitenciaria e convento, parece-nos agora numa feição architetonica severa, mas risonha, relembrando a origem colonial, mas com requintes de arte, que se torna encantadora. E a Torre das Jóias corôa essa obra de maneira deslumbranteDentro de algumas semanas, quando tudo estiver concluído e nos seus logares, veremos confirmado o juízo que alguém já externou de ser a Exposição do Centenário e mais bella desses últimos tempos. E será também o attestado mais evidente do nosso arrojo e da nossa capacidade de trabalho, subordinada aos dictames da arte.”

 

 

O objetivo da Exposição de 1922 era exibir um país moderno, atualizado em termos de ciência, avanços industriais e tendência das artes e da moda. Para tal, o Congresso liberou uma verba considerada exorbitante. Mais de 20 chefes de Estado e, acredita-se, em torno de 3,5 milhões de pessoas a visitaram ao longo de seus quase 11 meses de celebrações. Cerca de cinco mil pessoas trabalharam no evento. Foram realizadas as primeiras exibições de cinema durante uma exposição com filmes elaborados para a ocasião. O de maior sucesso foi No país das Amazonas (1922), do português Silvino Santos (1886 – 1970), que louvava as belezas da região e recebeu a medalha de ouro do júri da Exposição.

Segundo a historiadora Marly Motta, “Se as reluzentes máquinas eram o orgulho maior dos expositores do século XIX, no século XX, quem dava as cartas era a ciência, expressa na confiabilidade dos dados estatísticos, nas maravilhas da química e nas luzes da eletricidade”. Esse seria era o traço que diferenciava as exposições universais do século XIX das do século XX, incluindo a de 1922, no Rio de Janeiro. Se nas exposições do século XIX o objetivo principal era a venda de produtos e a conquista de novos mercados, no século XX o objetivo principal desses eventos passou a ser a difusão e venda de idéias que, além de expostas, eram debatidas a partir da realização de conferências e congressos sobre diversos temas e a exibição de filmes.

 

 

Sua inauguração, com o comparecimento de cerca de 200 mil pessoas, contou com a realização de paradas militares e discursos do presidente da República e das maiores autoridades do país. A área da exposição estava, como já mencionado, feericamente iluminada por luz elétrica.

A área da exposição possuia 2.500 metros de extensão e seu percurso tinha duas partes. A percorrida a partir do portão na Praça Floriano Peixoto e que correspondia à Avenida das Nações e “que abrigava os pavilhões de honra de treze nações estrangeiras (Portugal tinha ali também seu Pavilhão Industrial) 3 , o parque de diversões, o cinema, bares de cervejarias, lanchonetes, restaurante oficial, pavilhões de indústrias independentes, além de vários pequenos quiosques de produtos alimentícios. A segunda parte era a área da Praça do Mercado, onde os onze pavilhões nacionais foram localizados. O acesso a esta área se dava pelo portão neocolonial, sendo também neocoloniais os pavilhões da Fiação, da Caça e Pesca, das Pequenas Indústrias e o das Grandes Indústrias, onde seria inaugurado, ainda durante a exposição, o Museu Histórico Nacional” (Reconstituição Histórico Temporal da Exposição Internacional do Centenário da Independência).

“A Exposição Nacional exibiu 25 seções relacionadas a educação e ensino; letras, ciências e artes; mecânica; eletricidade; engenharia civil e transporte; agricultura; horticultura e arboricultura; florestas e colheitas; indústria alimentar; indústrias extrativas e metalurgia; decoração e mobiliário; fios, tecidos e vestuários; indústria química; indústrias diversas; economia social; higiene e assistência; ensino prático, instituições econômicas e trabalho manual da mulher; comércio; economia geral; estatística; forças de terra e esportes. Em paralelo, foram oferecidas atividades como exibição de filmes e conferências” (Fiocruz – Brasiliana – a divulgação científica no Brasil).

A Porta Monumental do evento ficava ao lado do Palácio Monroe, no final da avenida Rio Branco. As reações em relação à abertura da exposição variaram: foi considerada um sucesso por alguns períódicos e, já outros, criticaram o acontecimento. Na verdade, na ocasião, poucos pavilhões estavam abertos ao público. A revista  Careta chamou atenção para o fato antes e depois da inauguração.

 

 

 

 

 

 

Além do Brasil, os seguintes países montaram pavilhões – Argentina, Bélgica, Dinamarca, Estados Unidos, França, Inglaterra, Itália, Japão, México, Noruega, Portugal, Suécia e Tchecoslováquia. Ficavam na avenida das Nações. Uma curiosidade: Portugal possuía dois pavilhões e o maior foi transferido e reconstruído em Lisboa.

 

 

Foram construídos especialmente para a ocasião e instalados em uma extensa área proveniente de aterros e outras intervenções, dentre as quais o desmonte do Morro do Castelo, iniciativa saudada por personalidades importantes como o sanitarista Belisário Pena e criticada por outras, dentre elas, os escritores Monteiro Lobato (1882 – 1948) e Lima Barreto (1881 – 1922). 

 

 

O desmonte integrava a reforma urbana implementada, entre 1920 e 1922, pelo prefeito Carlos Sampaio (1861 – 1930).

 

 

Surgia então a nova Esplanada do Castelo, onde foram edificados os pavilhões da Exposição. No fim do evento, a área tornou-se muito valorizada e foi loteada. Mas antes, algumas revistas ironizaram a escolha do local para a realização da Exposição de 1922 devido ao perigo de ressacas e alagamentos.

 

 

Sobre o estilo dos prédios, a arquiteta e museóloga Nina Levy escreveu:

“Entre as principais construções nacionais na Exposição que seguem a linguagem do ecletismo teríamos a Porta Principal (Mario Fertin e Edgar Viana), o Pavilhão do Distrito Federal (Sylvio Rebecchi), o Pavilhão da Estatística (Gastão Bahiana) o Palácio dos Estados (H . Pujol Junior), o Palácio das Festas (Archimedes Memória e Francisque Cuchet), o Pavilhão da Música e a Fachada do Pavilhão das Indústrias Particulares (Nestor de Fi gueiredo) e a Fachada do Parque de Diversões (Morales de Los Rios).

Já dentro do espírito neocolonial estariam a Porta Norte (Raphael Galvão), o Palácio da Fiação (Morales de Los Rios Filho), o Pavilhão de Caça e Pesca (Armando de Oliveira), o Pavilhão das Pequenas Indústrias (Nestor de Figueiredo e C. S. San Juan) e a curiosa obra de restauração e adaptação do antigo Arsenal de Guerra, da Casa do Trem e do Forte do Calabouço para compor o Palácio das Grandes Indústrias (Archimedes Memória e Francisque Cuchet)”.

 

Augusto Malta, Sentados, da esquerda para a direita: Nestor de Figueiredo, Adollpho Morales de los Rios (pai) e Francisco Cuchet. Em pé, na mesma ordem: Arquimedes Memoria, Adolpho Morales de los /rios (filho), Celestino Severo de Juan e Edgar Vianna, de 7 de setembro de 1922. Rio de Janeiro, RJ / Rio antigo, por Charles Dunlop.

Augusto Malta. Sentados, da esquerda para a direita: Nestor de Figueiredo, Adolpho Morales de los Rios (pai) e Francisque Cuchet. Em pé, na mesma ordem: Archimedes Memória, Adolpho Morales de los Rios (filho), Celestino Severo de Juan e Edgar Viana, 7 de setembro de 1922. Rio de Janeiro, RJ / Rio Antigo, por Charles Dunlop.

 

 

Somente seis prédios da Exposição de 1922 ainda existem: no Rio de Janeiro, o Pavilhão da Administração e do Distrito Federal, atual Museu da Imagem e do Som; o Palácio da França, uma réplica do Petit Trianon, residência de campo de Maria Antonieta em Versalhes, atual Academia Brasileira de Letras; o Palácio das Indústrias, atual Museu Histórico Nacional; o Pavilhão de Estatística, órgão do Ministério da Saúde; o do Pavilhão das Indústrias Particulares, o restaurante Albamar – que já existia antes da exposição e abrigava o Mercado Municipal; e o do Pavilhão das Indústrias de Portugal, que foi transferido para Lisboa.

 

 

 

 

 

 

“Foram mais de seis mil expositores, entre nacionais e estrangeiros, que disputavam em muitas categorias a preferência da comissão encarregada de julgar os produtos e atribuir as cobiçadas medalhas e diplomas de Grande Prêmio, Medalha de Ouro e Prata, que valorizariam seus artigos, seus nomes e as marcas de suas firmas. Durante o evento, também foram realizadas várias conferências e palestras sobre temáticas afins e, no curso do ano de 1922, foram ainda lançados diversos tipos de publicações, periódicos, programas, revistas, edições comemorativas de jornais, o Livro de Ouro, o Guia da Exposição (catálogo), cronogramas de atividades, publicações de outros estados e outras que não versavam sobre a exposição em si, mas que foram preparadas para a ocasião de celebrar a Independência do Brasil, como a Carta Geográfica do Brasil ao Milionésimo, elaborada pelo Clube de Engenharia para integrar a Carta Internacional do Mundo ao Milionésimo”.

O Rio do morro ao mar – A Exposição de 1922: Memória e Civilização

 

Ficha de identificação dos produtos expostos na Exposição de 1922. NO alto, à esquerda, o brasão imperial; e, à direita, o brasão da República

Ficha de identificação dos produtos da Seção Brasileira da Exposição de 1922. No alto, à esquerda, o brasão imperial; e, à direita, o brasão da República

 

A Exposição Nacional exibiu 25 seções relacionadas a educação e ensino; letras, ciências e artes; mecânica; eletricidade; engenharia civil e transporte; agricultura; horticultura e arboricultura; florestas e colheitas; indústria alimentar; indústrias extrativas e metalurgia; decoração e mobiliário; fios, tecidos e vestuários; indústria química; indústrias diversas; economia social; higiene e assistência; ensino prático, instituições econômicas e trabalho manual da mulher; comércio; economia geral; estatística; forças de terra e esportes. Em paralelo, foram oferecidas atividades como exibição de filmes e conferências.

 

Foi oferecido aos visitantes da exposição um serviço de passeios aéreos sobre a Baía de Guanabara em hidroplanos de dois passageiros, partindo da Ponta do Calabouço, perto do restaurante da exposição, onde foi construída uma ponte flutuante para embarque e desembarque.

 

 

Também na Baía de Guanabara fundearam diversos navios estrangeiros: o Moreno, da Argentina; o Maryland e o Nevada, dos Estados Unidos; o Hood e o Repulse, da Inglaterra; o Azuma, o Isuno e o Iwate, do Japão; o República e o Carvalho Araújo, de Portugal; e o Uruguai, do país homônimo.

No estande do Exército foi exposta a Carta Topográfica do Distrito Federal, hoje Município do Rio de Janeiro, na escala de 1:50.000, impressa em sete cores e contendo curvas de nível, cujo levantamento foi o primeiro trabalho do Serviço Geográfico Militar.

 

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Outro destaque da Exposição de 1922 foi a mostra de Saúde Pública do Departamento Nacional de Saúde Pública, que já foi tema de um artigo da Brasiliana Fotográfica.

 

 

Foi durante a realização da exposição que, por iniciativa da Câmara de Comércio Norte-Americana no Brasil, foram angariados cerca de 40 mil dólares para a confecção de um monumento que simbolizasse a amizade entre o Brasil e os Estados Unidos. Foi presenteada ao Brasil uma escultura de bronze de uma mulher, em pé, sustentando na mão esquerda os pavilhões norte-americano e brasileiro ornados com folhas de louro e, na direita, uma palma de louros, inaugurada em 4 de julho de 1931.

 

 

Uma série de outros eventos aconteceram durante a exposição, dentre eles uma missa campal, diversos congressos, dentre eles o Congresso Internacional de História da América, promovido pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro; e o primeiro Congresso Feminista no país, que será tema de um artigo aqui na Brasiliana Fotográfica, em dezembro; uma sessão solene no Congresso Nacional, um desfile de cerca de 4.600 alunos na avenida Rio Branco, a inauguração do monumento de Cuauhtemoc, oferecido pelo México; além de inúmeros bailes, banquetes, conferências, corridas de cavalo, excursões, recepções e até uma festa veneziana na Enseada de Botafogo (Gazeta de Notícias, 14 de setembro de 1922; O Paiz, 16 de setembro de 1922, terceira coluna; Fon-Fon, 23 de setembro de 1922).

 

 

Em setembro de 1923, foi publicado o Livro de Ouro da Exposição do Centenário, editado pela casa editorial Almanak Laemmert, criada em 1844, pelos irmãos Eduard e Heinrich Laemmert (Correio da Manhã, 25 de novembro de 1923, primeira coluna).

 

 

 

A primeira grande transmissão pública de rádio do Brasil

 

 

Na abertura da Exposição Internacional do Centenário da Independência, foi realizada a primeira grande transmissão pública de rádio do Brasil. Outras transmissões radiofônicas já haviam sido realizadas no país – pelo padre gaúcho Roberto Landell de Moura (1861 – 1928), em 16 de julho de 1899, em São Paulo (Commercio de São Paulo, 17 de julho de 1899, terceira coluna); e pela Rádio Clube de Pernambuco, fundada em 6 de abril de 1919 (Jornal do Recife, 25 de abril de 1919, última coluna).

 

 

 

Mas esta, realizada em 7 de setembro de 1922, é considerada a primeira transmissão radiofônica oficial brasileira.

Em maio de 1922, a Delegação dos Estados Unidos para a Exposição de 1922 já anunciava as demonstrações que seriam realizadas por empresas norte-americanas (A Noite, 20 de maio de 1922, terceira coluna). Uma estação de 500 watts, montada no alto do Corcovado pela Westinghouse Eletric International em combinação com a Companhia Telefônica Brasileira, irradiou o discurso do presidente Epitácio Pessoa  (1865 – 1942), surpreendendo os visitantes da Exposição Internacional do Rio de Janeiro, através de 80 receptores vindos dos Estados Unidos, instalados em pontos centrais da cidade. A transmissão também foi realizada para Niterói, Petrópolis e São Paulo. Pelo mesmo sistema, à noite, a ópera O Guarany, de Carlos Gomes, encenada no Teatro Municipal, também foi irradiada (Correio da Manhã, 8 de setembro de 1922, quinta coluna; A União (RJ), 14 de setembro de 1922, quarta coluna).

 

 

A Western Electric Company em colaboração com a Companhia Telefônica também esteve presente à exposição onde fez demonstrações do telefone Alto-Falante que funcionando em comum com a radiofonia possibilitava ouvir-se trechos de música e de óperas executados a considerável distância (Jornal do Brasil, 16 de setembro de 1922, sexta coluna).

 

 

Pixinguinha (1897 – 1973), em entrevista, disse que havia tocado também durante as primeiras transmissões radiofônicas oficiais no Brasil. “Toquei num estudiozinho que havia lá e a Zaíra de Oliveira cantou”. O estúdio foi montado no pavilhão dos Estados Unidos.

Segundo Edgar Roquette Pinto (1884 – 1954), considerado o pai da radiofusão no Brasil, durante a Exposição de 1922:

“… muito pouca gente se interessou pelas demonstrações experimentais de radiotelefonia então realizadas pelas companhias norte-americanas Westinghouse, na estação do Corcovado, e Western Electric, na Praia Vermelha. […]. Creio que a causa desse desinteresse foram os alto-falantes instalados na exposição. Ouvindo discurso e música reproduzidos no meio de um barulho infernal, tudo distorcido, arranhando os ouvidos, era uma curiosidade sem maiores consequências”. (BBC, 1988).

 

 

O fato é que no ano seguinte foi fundada, em 20 de abril de 1923, aquela que é considerada a primeira emissora radiofônica do Brasil, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, por inúmeros associados influenciador pelo engenheiro e astrônomo Henrique Morize (1860 -1930), com quem o fotógrafo Marc Ferrez (1843 – 1923) havia no final do século XIX realizado experiências cinematográficas e radiográficas; e por seu principal idealizador, justamente Edgar Roquette-Pinto. Seu o slogan era “Trabalhar pela cultura dos que vivem em nossa terra e pelo progresso do Brasil”. Em caráter experimental, a primeira transmissão da Rádio Sociedade aconteceu em 1º de maio de 1923, Dia do Trabalho, utilizando o prefixo PR1– A e, após, PRA-A e PRA-2. Em 1936, foi doada ao governo por Roquette-Pinto e, em 1953, virou Rádio Ministério da Educação, com a criação da pasta.

 

Uma curiosidade: neste mesmo dia, 7 de setembro de 1922, nascia, no Rio de Janeiro, o ator Paulo Autran (1922 – 2007), que se tornaria um dos ícones da cultura brasileira.

 

Links para publicações sobre a Exposição de 1922

Links para as edições da Revista da Semana dedicadas à comemoração do Centenário da Independência:  9 de setembro16 de setembro23 de setembro30 de setembro; 7 de outubro14 de outubro; 21 de outubro; e 28 de outubro de 1922.

 

 

 

Link para o Álbum da Cidade do Rio de Janeiro comemorativo do  1ºCentenário da Independência do Brasil, cuja iniciativa da publicação foi do engenheiro Luiz Raphael Vieira Souto (1849 – 1922)

 

nações14

 

Link para o Guia Official Exposição Internacional do Rio de Janeiro 1922

 

 

Link para o número do centenário da revista Fon-Fon, 7 de setembro de 1922

 

 

Link para o filme 1922 – A Exposição da Independência (1970), filme com imagens resgatadas do documentário realizado por Silvino Santos (1893 – 1970), em 1922,  dirigido por Roberto Kahane e Domingos Demasi.

 

Cena do filme

Cena do filme 1922 – A Exposição da Independência

 

Link para 60 fotos de aspectos da Exposição de 1922 que fazem parte do álbum Exposição Internacional do Centenário da Independência – Rio de Janeiro – Brasil – 1922/1923, do acervo iconográfico do Acervo Público Mineiro.

 

 

Link para o artigo A apresentação do Departamento Nacional de Saúde Pública na Exposição Internacional do Centenário da Independência, de autoria de Ricardo Augusto dos Santos, publicada na Brasiliana Fotográfica, em 13 de abril de 2020.

 

 

 

Link para o artigo A independência do Brasil pelos olhos de Debret, publicado no portal Brasiliana Iconográfica, em 31 de agosto de 2022.

 

 

Link para o programa Os 100 (ou mais) anos do rádio no Brasil, com roteiro e apresentação da jornalista Helena Aragão, publicado em 2 de setembro de 2020, na Rádio Batuta.

 

Os 100 (ou mais) anos do rádio no Brasil

 

 

Link para o artigo BRAVA GENTE: NA VOZ DE VICENTE CELESTINO, UM ‘HIT’ BICENTENÁRIO DE D. PEDRO I E EVARISTO DA VEIGA, de Pedro Paulo Malta. Discografia Brasileira / Instituto Moreira Salles.

 

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Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

ALMEIDA, Hamilton. Padre Landell: o brasileiro que inventou o wireless. Santa Catarina: Editora Insular, 2022.

Atlas Histórico do Brasil – FGV – CPDOC

Biblioteca Nacional. A Exposição Universal de Londres de 1851 e o Palácio de Cristal, 1º de maio de 2020.

BRITISH BROADCASTING CORPORATION. O rádio no Brasil. Londres: Serviço Brasileiro da BBC, 1988. Série de programas de rádio.

CÂMARA, Renato Phaelante da. Fragmentos da história do Rádio Clube de Pernambuco. 2.ed. Recife: Cepe, 1998.

Correio do Cidadão, 1º de junho de 2022.

COSTA, Júlia Fúria. O “Culto da Saudade” nas Comemorações do Centenário da Independência do Brasil: A Criação do Museu Histórico Nacional, 1922Em Tempo de Histórias – Publicação do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade de Brasília PPG-HIS, nº. 18, Brasília, jan/jul. 2011. ISSN 1517-1108.

DRAGO, Niuxa; VILAS BOAS, Naylor; GUEDES, Sebastião. Reconstituição Histórico Temporal da Exposição Internacional do Centenário da Independência. VI Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, 2020.

DUNLOP, Charles. Rio Antigo, volume III. Rio de Janeiro : Editra Rio Antigo Ltda, 1960.

FERRARETTO, Luiz Artur. De 1919 a 1923, os primeiros momentos do rádio no BrasilRevista Brasileira de História da Mídia (RBHM) – v.3, n.1, jan.2014-jun/2014.

FERREIRA ROSA. O Centenário.

Fiocruz – Brasiliana – a divulgação científica no Brasil

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

HEYNEMANN, Claudia B. Café Brasil: o Império na Exposição Internacional de Filadélfia in Brasiliana Fotográfica, 4 de dezembro de 2019.

JUNQUEIRA, Julia Ribeiro. As comemorações do Sete de Setembro em 1922: uma re(leitura) da História do Brasil.  Versão modificada de um dos capítulos apresentados na dissertação Jornal do Commercio: cronista da História do Brasil em 1922, defendida, em maio de 2010, no Programa de Pós-Graduação em História Política da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

LEVY, Ruth. A exposição do centenário e o meio arquitetônico carioca no início dos anos 1920. Rio de Janeiro : EBA/UFRJ, 2010.

MARTINS, Angela Maria Moreira. A Exposição Internacional de 1922 no Rio de Janeiro: um espaço urbano turístico na jovem república brasileira. In: DEL RIO, Vicente (Org.). Arquitetura: pesquisa e projeto. Rio de Janeiro: UFRJ, FAU; São Paulo: ProEditores, 1998. (Coleção PROARQ). p.121-146.

MOTTA, Marly Silva da. A nação faz cem anos: a questão nacional no centenário da independência. Rio de Janeiro: Editora FGV: CPDOC, 1992.

MOTTA, Marly Silva da. Ante-sala do paraíso”, “vale de luzes”, “bazar de maravilhas” – a Exposição Internacional do Centenário da Independência (Rio de Janeiro – 1922). Rio de Janeiro: CPDOC, 1992. 22f. Trabalho apresentado no Seminário “Cenários de 1922″, promovido pelo CPDOC, Rio de Janeiro, 19-20 nov. 1992.

MOURÃO, Alda; GOMES, Ângela de Castro. A experiência da Primeira República no Brasil e em Portugal. Rio de Janeiro : Editora FGV, 2011.

RIBEIRO, Fernanda de Azevedo. A Exposição Internacional do Centenário da Independência de 1922: processo de modernização e legado para a cidade do Rio de Janeiro. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Arquitetura e Urbanismo, 2014.

RIBEIRO, Fernanda de Azevedo. Representações da Exposição Internacional do Centenário da Independência do Brasil de 1922 e da cidade do Rio de Janeiro nas mídias19&20, Rio de Janeiro, v. XV, n. 2, jul.-dez. 2020.

ROBICHON, François. Les panoramas en France au XIXe siecle. Paris/Nanterre, 1982. Tese de Doutorado – Universidade de Paris X-Nanterre.

SANTOS, Araci Alves do. Terra encantada – A Ciência na Exposiçao do Centenário da Independência do Brasil. Dissertação de Mestrado apresentada ao corpo docente do Programa de Pós-Graduação de História da Ciência, das Técnicas e Epistemologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2010.

SILVA, Eliane Alves da. 90 Anos da Missão Cartográfica Imperial Militar Austríaca no Exército Brasileiro – Relato Histórico da Fotogrametria (1920-2010). 1º Simpósio Brasileiro de Cartografia Histórica. Parati, 10 a 13 de maio de 2012.

Site Empresa Brasileira de Comunicação

Site Exposições Virtuais – Arquivo Nacional – O RIO DO MORRO AO MAR A Exposição de 1922: Memória e Civilização

Site Histórias e Monumentos

Site IHGB

VAZ FILHO, Pedro Serico. A centenária Rádio Clube de Pernambuco Registros em meios impressos documentam a origem da emissora pernambucana em 06 de abril de 1919. XII Encontro Nacional de História da Mídia, Rio Grande do Norte, junho de 2019.

 

 

Links para os artigos publicados da Série 1922 – Hoje, há 100 anos

Série 1922 – Hoje, há 100 anos I – Os Batutas embarcam para Paris, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, publicado em 29 de janeiro de 2022

Série 1922 – Hoje, há 100 anos II- A Semana de Arte Moderna, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, publicado em 13 de fevereiro de 2022, na Brasiliana Fotográfica

Série 1922 – Hoje, há 100 anos III – A eleição de Artur Bernardes e a derrota de Nilo Peçanha, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, publicado em 1º de março de 2022, na Brasiliana Fotográfica

Série 1922 – Hoje, há 100 anos IV – A primeira travessia aérea do Atlântico Sul, realizada pelos aeronautas portugueses Gago Coutinho e Sacadura Cabral, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, publicada em 17 de junho de 2022, na Brasiliana Fotográfica

Série 1922 – Hoje, há 100 anos V – A Revolta do Forte de Copacabana, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, publicada em 5 de julho de 2022, na Brasiliana Fotográfica

Série 1922 – Hoje, há 100 anos VI e série Feministas, graças a Deus XI – A fundação da Federação Brasileira para o Progresso Feminino, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, publicado em 9 de agosto de 2022, na Brasiliana Fotográfica

Série 1922 – Hoje, há 100 anos VII – A morte de Gastão de Orleáns, o conde d´Eu (Neuilly-sur-Seine, 28/04/1842 – Oceano Atlântico 28/08/1922), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, publicado em 28 de agosto de 2022, na Brasiliana Fotográfica.

Série 1922 – Hoje, há 100 anos IX – O centenário do Museu Histórico Nacional, de autoria de Maria Isabel Lenzi, historiadora do Musseu Histórico Nacional, publicado em 12 de outubro de 2022, na Brasiliana Fotográfica.

Série 1922 – Hoje, há 100 anos X –  A morte do escritor Lima Barreto (1881 – 1922), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, publicado em 1º denovembro de 2022, na Brasiliana Fotográfica.

Série 1922 – Hoje, há 100 anos XI e série Feministas, graças a Deus XII 1ª Conferência pelo Progresso Feminino e o “bom” feminismo, de autoria de Maria Elizabeth Brêa Monteiro, antropóloga do Arquivo Nacional, publicado em 19 de dezembro de 2022, na Brasiliana Fotográfica.

 

Links para os artigos sobre exposições nacionais ou internacionais publicados na Brasiliana Fotográfica

O pintor Victor Meirelles e a fotografia na II Exposição Nacional de 1866, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 17 de agosto de 2017.Motr

A festa do progresso: o Brasil na Exposição Continental, Buenos Aires, 1882, de autoria de Maria do Carmo Rainho, Arquivo Nacional, publicado em 29 de março de 2018.

Série “O Rio de Janeiro desaparecido” II – A Exposição Nacional de 1908 na Coleção Família Passos, de autoria de Carla Costa, Museu da República, publicado em 5 de abril de 2018.

Marc Ferrez, a Comissão Geológica do Império (1875 – 1878) e a Exposição Antropológica Brasileira no Museu Nacional (1882), de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora da Brasiliana Fotográfica, publicado em 29 de junho de 2018.

Paris, 1889: o álbum da exposição universal, de autoria de Claudia B. Heynemann, Arquivo Nacional,publicado em 27 de julho de 2018.

Café Brasil: o Império na Exposição Internacional de Filadélfia, de autoria de Claudia B. Heynemann, Arquivo Nacional, publicada em 4 de dezembro de 2019.

Festa das Artes e da Indústria Segunda Exposição Nacional, 1866, de autoria de Claudia Beatriz Heynemann e Maria Elizabeth Brêa Monteiro, Arquivo Nacional, em 5 de abril de 2020.

A apresentação do Departamento Nacional de Saúde Pública na Exposição Internacional do Centenário da Independência, de Ricardo Augusto dos Santos, Fiocruz, publicado em 13 de abril de 2020.

A Exposição Internacional de Higiene de Dresden, de Cristiane d´Avila, Fiocruz, publicado em 5 de janeiro de 2022.

Três álbuns fotográficos da Exposição Nacional de 1908 no Museu Histórico Nacional: Boscagli, Malta e Musso, de autoria de Maria Isabel Ribeiro Lenzi, historiadora do Museu Histórico Nacional, publicado em 25 de agosto de 2023, na Brasiliana Fotográfica.

Fotografias da Gripe Espanhola do fundo Moncorvo Filho, da Casa de Oswaldo Cruz

Hoje, data que marca os dois anos da caracterização da Covid-19 como uma pandemia, pela Organização Mundial da Saúde, a Brasiliana Fotográfica traz para seus leitores fotografias da pandemia de Gripe Espanhola, em 1918, descobertas, em meados de março de 2020, no arquivo do médico Moncorvo Filho. Os autores do artigo Fotografias da Gripe Espanhola são Ricardo Augusto dos Santos, Felipe Almeida Vieira e Francisco dos Santos Lourenço, pesquisadores Departamento de Arquivo e Documentação da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, uma das instituições parceiras do portal.

Fotografias da Gripe Espanhola 

Ricardo Augusto dos Santos, Felipe Almeida Vieira e Francisco dos Santos Lourenço*

 

“Grande vozerio, gritos e gemidos de repente ouvi que partiam do saguão da entrada e contiguo à minha sala. Corro a ver o que era. Uma onda humana invadia o prédio de nossa sede: eram homens, mulheres e crianças, em sua maioria andrajosos, comprimindo-se para entrar e agasalhar-se em todas as salas do nosso estabelecimento. Havia gente de todas as classes sociais, indivíduos brancos e de cor, velhos, moços e crianças, carregados uns pelos outros, alguns que entravam a cambalear, esquálidos, ardendo em febre, outros a vomitar e finalmente alguns encontrados já a expirar na via pública…” (Moncorvo Filho, 1924:49)

 

Em meados de março de 2020, durante o início da quarentena imposta pela epidemia de Covid-19, encontramos imagens inéditas da Gripe Espanhola no arquivo do médico Moncorvo Filho. Sabíamos da importância deste acervo, entretanto, não possuíamos a real dimensão do inestimável patrimônio que estava em nossas mãos. Apresentamos algumas das imagens neste breve trabalho.

 

Acessando o link para as fotografias inéditas da Gripe Espanhola no arquivo do médico Moncorvo Filho disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

 

Em setembro de 1918, no Rio de Janeiro, os habitantes começaram a apresentar febre alta. Era a Gripe Espanhola, doença que vinha da Europa pelos navios que ancoravam nos portos brasileiros. Numa cidade com um milhão de habitantes, morreram, segundo os registros oficiais, quase 15 mil pessoas. Os médicos receitavam canja e limão. Não que o Brasil não estivesse avisado. A gripe estava dizimando na Europa e mataria, de acordo com as estimativas mais cautelosas, trinta milhões de pessoas em todo o mundo.

Médicos e autoridades não sabiam como proceder e que atitudes tomar diante da pandemia. As instituições governamentais de saúde concentraram sua atuação no atendimento aos doentes. O que melhorou um pouco a trágica situação foram as ações isoladas. Hospitais e enfermarias provisórias foram montadas. Toda ajuda era bem-vinda, mas era pouca. Alguns círculos operários também contribuíram fornecendo auxílio.

 

“Morrer na cama era um privilégio abusivo e aristocrático. O sujeito morria nos lugares mais impróprios, insuspeitados: – na varanda, na janela, na calçada, na esquina, no botequim… Muitos caíam, rente ao meio-fio, com a cara enfiada no ralo. E ficavam, lá, estendidos, não como mortos, mas como bêbados. Ninguém os chorava, ninguém. Nem um vira-latas vinha lambê-los. Era como se o cadáver não tivesse nem mãe, nem pai, nem amigo, nem vizinho e, nem ao menos, inimigo.” (, 1967:72)

 

Os cariocas morriam em casa, na rua, no trabalho, sendo recolhidos pelos funcionários da Prefeitura. Estes jogavam os corpos nas carroças da companhia de limpeza pública. Conta-se que quando descobriam alguém dado como morto e ainda vivo, acabavam de matá-lo com as pás. Nos cemitérios, coveiros abriram valas, onde eram despejadas dezenas de mortos. E, quanto mais corpos acumulados, mais a situação piorava.

Frente ao desconhecimento ou ineficácia das medidas que pudessem impedir o contágio ou cuidar dos doentes, as autoridades públicas inicialmente restringiram-se a orientar a população a evitar aglomeração. A cidade transformou-se num caos, faltavam alimentos e ocorriam saques aos armazéns. Para completar este quadro tenebroso ainda havia o problema dos cadáveres insepultos. Não havendo pessoal suficiente para enterrar os mortos, foram utilizados os presidiários. O cenário de corpos amontoados pelos cemitérios ou abandonados pelas ruas era desolador.

 

 

Com o desenrolar dos fatos, aumentava o temor coletivo. No período mais crítico, a população ficou desesperada. A divulgação pela imprensa do número de óbitos, da ausência de assistência médica e das atrocidades cometidas intensificava o clima de medo. A todo esse cenário podemos acrescentar o ar fétido, emanado das covas, casas e ruas, onde os corpos permaneciam à espera de sepultamento. Outro aspecto que deve ser considerado diz respeito às atitudes desencadeadas a partir do terror instalado com a gripe. Narrativas terríveis falam de atos insensatos cometidos por pessoas transtornadas com a situação.

A interrupção das atividades econômicas e outras adversidades inerentes aos fenômenos epidêmicos não foram evitadas e tampouco houve planejamento para aplacar os efeitos da espanhola. A doença inicialmente apresentou-se aos habitantes do país como um mal distante. Tanto órgãos da imprensa quanto os responsáveis pelos serviços de saúde pública colocavam em dúvida a existência da espanhola no Brasil. Os casos observados poderiam ser moléstias ainda não identificadas. Para além da discussão científica, um fator deve ser observado: a aceitação de que a epidemia havia invadido o país evidenciaria a fragilidade das políticas públicas de saúde.

A gripe é transmitida por contágio direto, tendo como sintomas principais febre, prostração e dores musculares. Embora não seja incorreta a ideia do caráter “democrático” das doenças contagiosas, que atacam de forma indiferenciada as classes sociais, as observações mostram que enfermidades epidêmicas podem ser fulminantes em organismos debilitados por condições de sobrevivência precárias.

Embora os políticos e administradores do Rio de Janeiro não acreditassem, ou não quisessem aceitar, a epidemia foi dominando a cidade. Em outubro, a imprensa noticiou a existência de doentes em quartéis, fábricas e escolas. Por volta da segunda semana era enorme a quantidade de casos. Nesse momento, o número de pessoas atingidas havia crescido, deixando a população apavorada. A violência da gripe transformava a cidade, paralisando vários setores das atividades urbanas.

“Nas habitações coletivas, em estado grave caiam quase fulminados pelo terrível morbo inúmeros de seus moradores. A população estava muito justamente alarmadíssima e todos os serviços públicos já se mostravam em 10 de outubro sensivelmente desfalcados do seu pessoal, por doença afastado de seus misteres, sendo em número assaz elevado as guias extraídas pelas Delegacias de Polícia para o internamento de gripantes no Hospital da Misericórdia. Os miseráveis e mendigos, como sempre sucede, eram os que primeiro caiam vítimas do devastador morbo e nos quais a doença de maior gravidade era desde logo emprestada.” (Moncorvo Filho, 1924:52)

 

 

Nos primeiros dias de novembro, a situação era alarmante. A epidemia forçara o fechamento do comércio e indústrias, bem como a interrupção dos serviços públicos. A cidade estava paralisada. O governo passou a distribuir quinino. Sem esclarecer o valor terapêutico dessa substância no combate à gripe ou o perigo da sua ingestão sem controle. Surgiam na imprensa receitas peculiares, que prometiam curar a doença. Além disso, os produtos – galinhas, ovos e limão – supostamente eficazes no combate ao mal, sofreram intensa especulação comercial.

A desorganização das atividades comerciais provocou uma grave crise de abastecimento. Se nas áreas próximas do centro urbano havia dificuldade em conseguir alimentos, nas áreas suburbanas eles eram extremamente escassos. Para amenizar a situação, o governo passou a distribuir leite, sopa e pão para a população. Entretanto, noticiadas pela imprensa, as reclamações de moradores dos subúrbios deixam evidente que essa medida foi inoperante.

 

“Era apavorante a rapidez com que ela ia da invasão ao apogeu, em poucas horas, levando a vítima às sufocações, às diarréias, às dores lancinantes, ao letargo, ao coma, à uremia, à síncope e à morte em algumas horas ou poucos dias. Aterravam a velocidade do contágio e o número de pessoas que estavam sendo acometidas. Nenhuma de nossas calamidades chegara aos pés da moléstia reinante: o terrível não era o número de casualidades, mas não haver quem fabricasse caixões, quem os levasse ao cemitério, quem abrisse covas e enterrasse os mortos. O espantoso já não era a quantidade de doentes, mas o fato de estarem quase todos doentes, a impossibilidade de ajudar, tratar, transportar comida, vender gêneros, aviar receitas, exercer, em suma, os misteres indispensáveis à vida coletiva.” (Pedro Nava, 1976:201)

 

 

Acreditava-se que um corpo bem alimentado resistiria melhor à doença. Até galinhas foram distribuídas à população. Para auxiliar o atendimento dos cariocas acometidos pela gripe, associações filantrópicas tomaram providências para tratar os doentes. Uma das instituições que participaram dessa mobilização foi o Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro (IPAI). Em suas dependências, funcionou um dos postos de socorros criados.

 

 

 

O instituto fora criado pelo médico Arthur Moncorvo Filho (1871-1944), em 1899. Dedicava-se ao auxílio de crianças, mas, durante a epidemia, transformou-se num local de assistência emergencial, onde as pessoas atingidas pela espanhola, recebiam atendimento médico. Suas dependências ficaram lotadas e formaram-se filas para a distribuição de produtos alimentícios. Além disto, grupos de médicos e enfermeiras eram enviados aos bairros mais populares. Chamadas de Caravanas do Bem, saíam do IPAI em direção ao Morro do Salgueiro, Morro do Andaraí, Morro do Telégrafo (Mangueira), Engenho de Dentro, Cascadura e Ramos.

As imagens que retratam o cotidiano do IPAI durante a pandemia de Gripe de 1918 podem ser encontradas no acervo da Casa de Oswaldo Cruz. São registros originais que documentam o período da Gripe Espanhola no Rio de Janeiro. Elas pertencem ao Arquivo Arthur Moncorvo Filho. Além destas imagens documentando a pandemia, este arquivo reúne mais de mil itens, entre fotografias, cartas, relatórios, publicações e recortes de jornais acumulados pelo médico, gestor e membro de associações científicas, tanto no Brasil quanto no exterior.

Nascido em 13 de setembro de 1871, na cidade do Rio de Janeiro, Arthur Moncorvo Filho viveu na Europa, onde Carlos Arthur Moncorvo de Figueiredo (1846-1901) estagiava em Paris com os professores Eugène Bouchut (1818-1891) e Henri-Louis Roger (1809-1891). Retornando ao Brasil, seu pai o convenceu a estudar medicina. Terminou o curso em 1897 na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, diplomando-se com a tese Das linfangites na infância e suas consequências. Durante o curso, trabalhou na Policlínica Geral do Rio de Janeiro, instituição fundada por Carlos Arthur Moncorvo em 1881. Com seu falecimento, em 1901, o filho ocuparia seu lugar no serviço de moléstias de crianças da policlínica.

 

  

Criado em 1899, o IPAI funcionava na casa da família, localizada na rua da Lapa. Neste mesmo local, seu pai criara, em 1881, a Policlínica Geral. Dois anos depois, o instituto foi instalado em prédio alugado, à rua Visconde do Rio Branco. Em 1914, o presidente da República, Hermes da Fonseca, doou o terreno onde foi construída a sede do instituto, na rua do Areal, atual rua Moncorvo Filho. Hoje, funciona no local o Hospital Moncorvo Filho, nomeado em sua homenagem.

Moncorvo Filho foi membro de várias sociedades médicas. Em 1919 foi eleito membro honorário da Academia Nacional de Medicina. Em 1921 tornou-se sócio da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro. Em 1933 veio a ser presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria. Publicou obras de referência para a história da pediatria no Brasil: Hygiene infantil (1917), Formulário de doenças das creanças (1923) e Histórico da protecção à infância no Brasil (1926).

As muitas atividades associativas contribuíram para a influência de Moncorvo Filho. Reconhecido como um pioneiro pelos membros do campo da pediatria, participou de encontros científicos nacionais e internacionais em cargos de coordenação. Por exemplo, foi encarregado da organização do 1º Congresso Americano da Criança, realizado em julho de 1916 na cidade de Buenos Aires. No 1º Congresso Brasileiro de Proteção à Infância, em 1922, ocupou o cargo de presidente. Nesses eventos defendia ideias de proteção à saúde das crianças, como a proibição da fabricação de chupetas, até ações de saneamento das cidades. Desde o início de sua carreira, Moncorvo Filho fazia críticas às instituições de amparo à infância. Para ele, a saúde das crianças dependia de condições de higiene, da exposição a luz solar, além de boa alimentação. Seus pronunciamentos nos congressos médicos eram publicados na imprensa, alimentando o debate político do período.

 

 

 

* Ricardo Augusto dos Santos, Felipe Almeida Vieira e Francisco dos Santos Lourenço são pesquisadores do Departamento de Arquivo e Documentação da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz.

 

Fontes:

MONCORVO FILHO, Arthur. O Pandemônio de 1918: subsídio ao histórico da epidemia de grippe que em 1918 assolou o território do Brasil. Rio de Janeiro: Departamento da Criança no Brasil, 1924.

NAVA, Pedro. Chão de ferro. Memórias/3. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1976.

RODRIGUES, Nelson. Memórias. Rio de Janeiro: Ed. Correio da Manhã, 1967.

SANTOS, Ricardo Augusto dos. O Carnaval, a Peste e a Espanhola.  História, Ciências, Saúde-Manguinhos. vol.13, no.1. Rio de Janeiro, 2006.https://www.scielo.br/j/hcsm/a/Z9Lr5HqtjXzFsTD5FFvGFBQ/?lang=pt

FREIRE, Maria Martha de Luna; LEONY, Vinícius da Silva. A caridade científica: Moncorvo Filho e o Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro (1899-1930). História, Ciências, Saúde-Manguinhos. vol.18, supl. 1. Rio de Janeiro, 2011.https://www.scielo.br/j/hcsm/a/pMzXR6Xv9xBJgG9gyc4ZrZv/?lang=pt

VENANCIO JUNIOR, André Luiz & MIGNOT, Ana Chrystina. O Pandemônio de 1918: Testemunho de um médico para a posteridade. Revista Educação em Questão, Natal, v. 58 n. 58, out./dez. 2020. https://periodicos.ufrn.br/educacaoemquestao/article/view/21540/13358

 

Link para o artigo E o ex e futuro presidente do Brasil morreu de gripe…a Gripe Espanhola de 1918, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, publicado em 23 de março de 2020, na Brasiliana Fotográfica.