Retorno da Brasiliana Fotográfica

Após os incidentes ocorridos no dia 11/04/2021 que afetaram diversos serviços da Biblioteca Nacional, incluindo a Brasiliana Fotográfica, foram empreendidos esforços para sanear e estabilizar o ambiente digital, bem como recuperar de forma mais completa possível tudo o que foi afetado.

Desta forma, retornamos agora com a Brasiliana Fotográfica ainda com algumas lacunas em seu acervo, a recuperação total ainda levará algum tempo.

Estamos cientes do impacto que a indisponibilidade de determinados acervos causa às pesquisas e aos trabalhos em andamento, mas gostaríamos de enfatizar que estamos trabalhando da forma mais rápida e segura possível.

Até o completo restabelecimento dos serviços podem ocorrer episódios de indisponibilidade, instabilidade, lentidão ou imprecisão na recuperação de informações. Contamos com a compreensão dos usuários de nossos serviços.

A foto em foco

Em nota publicada dia 27 de maio pelo jornal Folha de S.Paulo na coluna Painel das Letras, assinada por Maurício Meireles, a historiadora Lilia Moritz Schwarcz teria afirmado que houve uma montagem na fotografia de Antonio Luiz Ferreira, que registrou, em 17 de maio de 1888, a missa campal realizada no Rio de Janeiro para celebrar a Abolição da Escravatura. Foi dito na coluna que os rostos de personalidades, entre elas Machado de Assis, que aparecem no palanque onde estava a Princesa Isabel, foram encaixados “de forma artificial” pelo fotógrafo.

A mesma coluna Painel das Letras do dia 3 de junho faz correções. Numa delas a historiadora Lilia Schwarcz diz “não assegurar que a imagem tenha sido manipulada” ou que Machado de Assis tenha sido “incluído artificialmente ali”, pois o escritor “não é alvo de sua pesquisa”. A coluna relata também que o Instituto Moreira Salles, “detentor da imagem”, reagiu afirmando “não haver evidência de manipulação da fotografia”. E que “a inclusão de personagens nela seria impossível sem deixar vestígios”.

Esta imagem de Antonio Luiz Ferreira está desde 2008 no acervo do IMS – veio com a Coleção de Dom João de Orleans e Braganca – e foi publicada em 2015 no portal Brasiliana Fotográfica, parceria firmada entre o Instituto Moreira Salles e a Biblioteca Nacional.

Na verdade, o Instituto Moreira Salles disse mais do que está registrado na correção do jornal, que se trata de um resumo da nota enviada ao titular da coluna Painel das Letras. Leia a íntegra:

“É um sério erro afirmar que houve manipulação ou montagem na foto feita por Antonio Luiz Ferreira da missa em ação de graças pela Abolição da Escravatura no dia 17 de maio de 1888 no Campo de São Cristóvão, Rio de Janeiro. A foto está no acervo do Instituto Moreira Salles desde 2008 e junta-se a outras mais de 700 que fazem parte da Coleção de Dom João de Orleans e Bragança.

O original de época em papel, assinado pelo fotógrafo, tem 28,5cm x 51,5cm. A foto é panorâmica. Abarca a multidão de milhares de pessoas que compareceu à missa. Seu foco não é o palanque que está no canto esquerdo da imagem onde ficaram a Princesa Isabel e um conjunto de personalidades. Neste conjunto, figura o rosto de Machado de Assis, que mede no original aproximadamente 5 milímetros. Tomar a parte pelo todo leva a grave equívoco.

Para uso em exposições e no portal de internet Brasiliana Fotográfica, parceria firmada em 2015 entre o IMS e a Biblioteca Nacional, a imagem foi magnificada. Em 2015 percebeu-se, com uso de zoom, que entre os rostos de personalidades estava o de Machado de Assis.

A implantação no original da foto de vários rostos em corpos que supostamente não lhes pertenciam seria impossível sem deixar vestígios. E não há vestígios. A imagem mostra que todas as passagens e gradação de tons entre os rostos ali registrados são contínuas e sem nenhuma evidência de montagem.”

Detalhe da foto, com Machado de Assis ao centro

Detalhe da foto, com Machado de Assis ao centro

Equipe IMS

Nota originalmente publicada no Blog do IMS

Para uma história da Fotografia Médica, no Brasil

Como seria a nossa vida, hoje, sem os diagnósticos médicos por imagem?

E qual tem sido a contribuição da fotografia no processo de ensino e aprendizagem da medicina, no Brasil, desde o século XIX?

Cabe aos pesquisadores da história da imagem médica e, mais especificamente, da fotografia médica – no Brasil – respondê-la.

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O que se vê acima são detalhes de fotografias que integram um conjunto maior, já amplamente divulgado, a partir de 1997, quando iniciou-se a itinerância da exposição A coleção do imperador – fotografia brasileira e estrangeira no século XIX que, no Brasil, foi apresentada no Rio de Janeiro (Centro Cultural do Banco do Brasil)  e em São Paulo (Pinacoteca do Estado).

Mas as perguntas persistem: foram feitas a pedido de quem, e para que usos? Como funcionava o sistema local de produção de fotografias para o campo da medicina, ao final dos oitocentos?

Façamos uma leitura preliminar destas imagens, levando em conta o que se segue: em meados da década de 1880 e a pedido de um médico, supõe-se, o jovem cidadão compareceu ao estúdio fotográfico de João Xavier de Oliveira Menezes, instalado à rua da Quitanda, no Centro do Rio de Janeiro. O estabelecimento estava configurado para produzir retratos – vide o tapete, a cena campestre no fundo pintado e a coluna ornada, sobre a qual o paciente apoiou as suas calças e pousou, de braços cruzados, revelando certa deformidade nos membros inferiores. O formato da fotografia, uma carte-cabinet, ainda era popular, naqueles tempos em que a democratização do fazer fotográfico não havia se cumprido. Observe-se a marca do fotógrafo, incluindo as palavras-chave “portrait” e “álbum.”

Tempos depois de submetido a tratamento, supõe-se, o paciente voltou ao estúdio para novo registro – desta vez, o fotógrafo tomou certos cuidados (técnicos) e desprezou outros (estéticos), realizando uma fotografia mais fria e objetiva, montada em um cartão neutro; observe-se, ainda, a base de um aparelho de pose, atrás de seus pés. O instrumento era utilizado para conferir maior estabilidade ao retratado, no ato da tomada da foto. Quase nada sabemos acerca da atuação do fotógrafo J. Meneses no campo médico.

Segundo o Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro de Boris Kossoy, J. Menezes era então proprietário da “antiga casa Christiano Junior & Pacheco” o que nos leva a indagar: teria sido ele o sucessor de Christiano Junior no atendimento à classe médica da corte? Pois o álbum Elephantiasis (que também integra o repositório deste portal) mostra pacientes nus, com hipertrofia e espessamento de tecidos decorrentes dessa doença (a filariose) e teria sido realizado por Christiano Junior durante seu período de atuação no Rio de Janeiro, antes de prosseguir para Buenos Aires – onde realizou estupendo trabalho documental daquele país e de seu povo, já estudado por Abel Alexander e Luis Priamo.[1]

No catálogo da primeira exposição do Club Industrial de Buenos Aires, em 1877, Christiano Junior escreveu [acerca de suas fotos médicas, realizadas no Brasil] que “segundo o parecer dos médicos nacionais e estrangeiros, nenhum fotógrafo, até aquela data [1866] havia tirado do natural um trabalho semelhante.”

Entre a década de 1860 e a virada do século, há registros da atuação de José Christiano de Freitas Henriques Junior em Maceió AL (onde teria iniciado as suas atividades), Rio de Janeiro RJ, Desterro SC, Mercedes (Uruguai) e diversas cidades argentinas por onde passou, antes de vir a falecer em Assunção, Paraguai, em 1902. Foi um dos maiores e mais versáteis fotógrafos dos oitocentos, além de empresário atuante em diversos ramos.

 

Acessando o link para as fotografias médicas disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas. 

 

Voltemos à fotografia médica. É na coleção de fotografias formada pelo último imperador do Brasil, guardada em sua maior parte na Biblioteca Nacional e inscrita no programa Memória do Mundo, da Unesco, que encontra-se um dos possíveis pontos de partida a motivar mais investigação neste campo. “Nasci para consagrar-me às letras e às ciências”, anotou em seu diário, em 1862. Natural, assim, que a medicina estivesse entre os seus interesses. Na biografia de d. Pedro II por José Murilo de Carvalho, encontramos alguns desses indícios. As reuniões anuais da Academia de Medicina eram realizadas no Paço Imperial. Também gostava de assistir aos concursos públicos da Faculdade de Medicina. Doou 100 mil francos para a criação do Instituto Pasteur, em Paris.

Detalhes das fotomicrografias de sedimentos da urina humana, realizadas pelo dr. Ultzmann, de Viena – à esquerda, o ácido úrico “proveniente de cálculos urinários” e à direita, “precipitado pelo ácido clorídrico da urina normal.”

Os detalhes reproduzidos acima foram extraídos de fotomicrografias integrantes de um álbum de sua coleção. Foram realizadas pelo médico húngaro Robert Utzmann, importante referência mundial no campo da urologia, investigador e professor na Universidade de Viena. D. Pedro não perdia uma oportunidade para dialogar com a classe médica, aqui ou no exterior, mantendo-se a par dos progressos – inclusive das interseções com a fotografia. Bem sabemos que ele era dotado de profunda consciência e fascínio pelo conhecimento que certos aparatos de visão proporcionavam, tais como os telescópios e os microscópios, aproximando-o de outros mundos, invisíveis a olho nu.

No final de sua vida, exilado em Paris, d. Pedro II seguiu acompanhando de perto os progressos no campo das tecnologias da imagem (inclusive da fotografia a cores) mas não teve tempo de vivenciar o fascínio do “ver através’: quando Wilhelm Conrad Roentgen descobriu os raios-X, em 1895, ele havia falecido, havia poucos anos.

Sobre o emprego dos raios-X no campo médico, vale lembrar, o Brasil também deu importante contribuição. Hoje um tanto esquecida – mas ainda cultuada – a abreugrafia, uma radiografia do tórax em dimensões reduzidas  idealizada em 1936 pelo dr. Manoel de Abreu – cujo nome integra o panteão dos indicados ao Prêmio Nobel de Medicina de 1946, 51 e 53 –  já foi exame obrigatório do trabalhador brasileiro, visando a detecção da tuberculose em indivíduos aparentemente sadios, já que a doença é assintomática, em sua fase inicial.

Encerro este texto com a firme esperança de que médicos e demais interessados na história da imagem médica no Brasil se manifestem – através deste blog – comentando, corrigindo ou acrescentando informações relacionadas a estas imagens históricas. Precisamos avançar neste campo, cuja constituição e trajetória pouco conhecemos.

Seleção de imagens de Fotografia Médica na Brasiliana Fotográfica

 

 

Joaquim Marçal Ferreira de Andrade

Curador, pela FBN, do portal Brasiliana Fotográfica

 

[1] Un país en transición : fotografías de Buenos Aires, Cuyo y el Noroeste, 1867/1883 – Christiano Junior. Buenos Aires [Argentina] : Ediciones Fundación Antorchas, 2000.

 

 

Panorama circular do Rio de Janeiro, visível do Morro de Santo Antônio

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Este Panorama circular da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, Brasil, visível do Morro de Santo Antônio foi publicado em 1917 pela Empresa de Propaganda Brasileira que, com justeza, denominou-o um ‘indicador’. Sua execução gráfica ficou a cargo das oficinas do Jornal do Brasil, uma das primeiras a equipar-se, desde a virada do século, para a realização de trabalhos de reprodução fotomecânica pelo processo de autotipia, também conhecido como similigravura, meio-tom ou meia-tinta: a partir de uma fotografia, preparava-se um clichê onde os tons contínuos da imagem eram reduzidos a uma trama de retícula – minúsculos pontos, de dimensões variadas que, impressos, nos dão a impressão de estarmos vendo “uma fotografia de verdade”.

Pois até os fins do século 19, a idéia de ‘fotografia’ estava, mesmo, vinculada a um objeto, um artefato fotográfico, uma fotografia original, produzida em laboratório. Mas a partir do advento da retícula, a fotografia se desvinculou do original, do artefato, tornando-se apenas uma imagem, multiplicada aos milhares em poucas horas, e rapidamente disseminada. Tornou-se onipresente, enfim.

Desta primeira edição do panorama, teriam sido produzidos oito mil exemplares. Trata-se de um painel fotográfico circular com uma visão de 360° do centro do Rio de Janeiro, tomada a partir do Morro de Santo Antônio. Foram feitas oito fotos e de cada uma delas aproveitou-se o campo abrangido pelo ângulo de 30 graus. Assim, temos doze seções na imagem, nitidamente marcadas por uma linha vertical.

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Esquema para montagem do panorama circular do Rio de Janeiro, acompanhado de instruções escritas, no verso do mesmo.

Esta é uma versão moderna das antigas rotundas, pintadas a mão, que tanto sucesso fizeram no passado. Os pintores Pedro Américo e Vítor Meireles foram mestres nesta técnica. O panorama giratório Baía e cidade do Rio de Janeiro de Vítor Meireles, apresentado em 1890 à população carioca, tinha 115 metros de comprimento e foi exibido inicialmente em uma rotunda na Praça 15. Dele só restaram alguns estudos em papel, que hoje integram o acervo do Museu Nacional de Belas Artes.

Voltemos ao nosso panorama. Segundo informa o texto impresso no verso, esta peça gráfica serviria de guia “aos visitantes do grande panorama, ora em via de execução.” Se este empreendimento (do grande panorama) foi levado a cabo, desconhecemos. Quem sabe algum leitor de nosso portal Brasiliana Fotográfica não disporá dessas informações, tão valiosas?

 

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No anúncio da loja de produtos fotográficos de Felix Ottersbach, estão listados alguns dos produtos então utilizados, no momento em que ampliava-se um novo mercado, voltado aos amadores da fotografia.

 

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A descoberta dos raios X deu-se nos fins do século 19 e a sua utilização, no campo da medicina, foi quase imediata. A radiografia, entre outras aplicações, desenvolveu-se com rapidez.

 

No trabalho apresentado em congresso e depois publicado na Revista do IHGB em 1984, Lygia Cunha discorreu sobre os “Panoramas e Cosmoramas. Distrações populares no Segundo Reinado.” A mais recente publicação deste ensaio deu-se no ano de 2010, em coletânea de estudos seus, integrantes do vol. 34 da Coleção Rodolfo Garcia, da Biblioteca Nacional, pp. 205-211:

Ali, a autora reproduz um anúncio dos antigos panoramas que foram exibidos em terras cariocas: “Panorama da rua do Teatro, n. 30. Faz-se ciente ao respeitável público que, durante os 9 dias da coroação, apresentará novas vistas, e igualmente o grande comboio que teve lugar em Paris pela morte do Grande Napoleão. Entrada 160 rs.” Jornal do Commercio, 18 e 19 de julho de 1841, p. 4 (segunda coluna, quase no meio da página).

Como se vê, o fascínio do ser humano pelas ‘experiências imersivas’ faz parte de sua natureza e sempre o acompanhou, do homem das cavernas aos apreciadores de videogames e filmes 3-D. Convidamos, então, os visitantes de nosso portal para desfrutar da potente ferramenta de zoom que têm à sua disposição, percorrendo este panorama quase centenário. Estamos comemorando o aniversário dos 450 anos da cidade; momento mais que oportuno para este passeio.

 

Panorama circular

Empresa de Propaganda Brazileira : Panorama circular da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, Brasil, visível do Morro de Santo-Antonio. Acervo FBN

 

Joaquim Marçal Ferreira de Andrade

Curador, pela Biblioteca Nacional, do portal Brasiliana Fotográfica

 

“Complemento indispensável…

 

 

 

 

…a toda biblioteca bem organizada”. Assim o bibliotecário João de Saldanha da Gama (desde 1822, designava-se assim a autoridade maior da Biblioteca Nacional) qualificou a antiga Seção de Estampas da instituição, em seu prefácio ao Catálogo da Exposição Permanente dos Cimélios da Biblioteca Nacional, publicado sob a sua direção em 1885.

Nesse catálogo, a parte referente às estampas ficou a cargo de José Zephyrino de Menezes Brum, chefe daquela seção desde 1876, quando foi posto em execução um plano de reforma da instituição a partir do qual “a Seção de Estampas […] começa a ter existência e história próprias […].”

Estamos no ano de 1885 e a Biblioteca Nacional já estava instalada no endereço da rua do Passeio desde 1858, quando se concluiu a mudança,“sem estrago nem perda”, desde seu primeiro endereço, no edifício do antigo Hospital do Carmo. Em 1881, abrira-se a grandiosa e inesquecível Exposição de História do Brasil, produzida sob a batuta do dirigente anterior, o barão de Ramiz Galvão e o pensamento curatorial de outro barão, Homem de Mello.

 

 

Desenvolvia-se então, no acervo de imagens, um trabalho apaixonado, apesar de todas as dificuldades impostas pela conjuntura – atividades estas, em certa sintonia com as que ocorriam nas bibliotecas nacionais da França e da Áustria e no Museu Britânico. Menezes Brum lamentava que “as acanhadas proporções do edifício em que funciona a Biblioteca Nacional não permitiram que a Seção de Estampas fosse melhor acomodada, pois que lhe couberam em partilha apenas duas pequenas salas do 3o andar, mal mobiliadas e insuficientes para as suas necessidades e serviços.” E “as riquezas da nossa coleção iconográfica continuavam desconhecidas, tanta era a quantidade que delas havia”, ele observava.

Mas a exposição permanente das estampas, um sonho antigo de Ramiz Galvão, haveria de acontecer, sob a direção geral de Saldanha da Gama. O chefe das estampas era um obstinado: “era preciso escolher, escolher sempre, examinar, comparar, tornar a comparar, até que as jóias, por seu pequeno número, e por mais preciosas, se pudessem acomodar nas caixas que lhes estavam destinadas.”

 

 

Depois de pronta a exposição permanente, o fotógrafo Antonio Luiz Ferreira, o mesmo que realizou as memoráveis fotografias das manifestações populares havidas após a assinatura da Lei Áurea – como aquela em que Machado de Assis aparece na missa celebrada no campo de São Cristóvão – foi contratado para documentar o edifício sede da Biblioteca Nacional, onde a instituição permaneceu até 1910.

O resultado está em dois álbuns; um, com as cópias em papel albuminado e outro, com as cópias produzidas em platina, que apresentam melhores atributos de estabilidade e permanência e figuram nesta galeria. As capas estão sofridas – ainda que o miolo, sua essência, resista bravamente – e refletem uma história. Muito nos revelam as suas imagens, admirável exemplo da fotografia de arquitetura praticada na época e – por que não dizê-lo – da fotografia museográfica, gênero proposto por Fox Talbot e inaugurado possivelmente no British Museum, por Roger Fenton.

O dia 29 de outubro é data a ser sempre lembrada. Hoje, quando a nossa Biblioteca Nacional comemora 205 anos de existência, essa instituição e o Instituto Moreira Salles, criadores deste portal, trabalham no sentido de acolher as primeiras das novas instituições que passarão a integrar a Brasiliana Fotográfica – cujo modelo de gestão pretende-se inclusivo, democrático e em dia com as principais questões referentes aos acervos de fotografia brasileira.

Menezes Brum concluiu assim o seu texto sobre as estampas no catálogo da célebre exposição: “Praza a Deus que curiosos e entendidos acolham este tentame da Biblioteca Nacional com benevolência e tirem dele o gozo e proveito que da sua realização possam advir.” Pois assim seguimos neste esforço coletivo para fazer da Brasiliana Fotográfica um espaço que suscite o aprendizado, a reflexão e o debate. E que seja, também, um espelho da Nação Brasileira.

Rio de Janeiro, 29 de outubro de 2015.

Joaquim Marçal Ferreira de Andrade
Curador, pela Biblioteca Nacional, do portal Brasiliana Fotográfica

 

 

Explore mais fotos da Biblioteca Nacional na Brasiliana Fotográfica

O editor e fotógrafo suíço Georges Leuzinger (1813 – 1892)

Retrato de George Leuzinger por Insley Pacheco, c. 1863

Retrato de Georges Leuzinger por Insley Pacheco, c. 1863 / Acervo IMS

Georges Leuzinger (1813-1892) nasceu em Mollis, cidade do cantão de Glarus, na Suíça, e foi um dos mais importantes fotógrafos e difusores para o mundo da fotografia sobre o Brasil no século XIX, além de pioneiro das artes gráficas no país. Grande empreendedor, montou um sofisticado e diversificado complexo editorial, a Casa Leuzinger, que se tornaria um polo de publicações e de produções fotográficas, alçando o Brasil ao mesmo nível da produção europeia do setor.

A Casa Leuzinger era formada por oficinas de litografia, encadernação e fotografia, além de papelaria, tipografia e estamparia de livros e gravuras. Foi referência em artes gráficas, impressão e divulgação de gravuras e fotografias.  Além de produzir suas próprias imagens, o estabelecimento comercializava obras de fotógrafos como Marc Ferrez (1843 – 1923) e Albert Frisch (1840 – 1918) , entre outros.

Como fotógrafo, Leuzinger realizou, durante a década de 1860, apenas cerca de 20 anos após a invenção da daguerreotipia, um importante e pioneiro trabalho de documentação do Rio de Janeiro, incluindo cenas urbanas, vistas de Niterói, da Serra dos Órgãos e de Teresópolis.

Georges Leuzinger chegou ao Rio de Janeiro, em 1832, aos 19 anos, falando apenas alemão, para trabalhar na firma de comissões e exportações de seu tio Jean-Jacques Leuzinger. Foi, em 1840, quando a firma de seu tio faliu, que ele iniciou seu próprio negócio. Nesse mesmo ano, em 27 de novembro, casou-se com Anne Antoinette du Authier (1822-1898), conhecida como Eleonore, na igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro. O casal teve 13 filhos.

Em 1845, a Casa Leuzinger publicou o Panorama circular da baía de Guanabara, em 6 partes, com litografias do francês Alfred Martinet (1821 – 1875). São as primeiras estampas por ele editadas. Leuzinger editou também vários jornais em alemão redigidos, segundo Ernesto Senna (1858 – 1913) em O velho commercio do Rio de Janeiro, de 1908, “por alguns revolucionários e socialistas que a revolução de 1848 havia feito fugir da Europa”. Ainda, segundo este autor, encarregou alguns desses forasteiros, que muitas vezes eram também artistas, de produzir imagens do Brasil e de seus costumes populares. Essas imagens eram adquiridas pelos estrangeiros que passavam pelo Brasil.

 

Ernesto Senna / O Rio de Janeiro do meu tempo, de Luiz Edmundo

Ernesto Senna / O Rio de Janeiro do meu tempo, de Luiz Edmundo

 

Na década de 1860, a Casa Leuzinger criou uma seção de fotografia, provavelmente dirigida por Franz Keller-Leuzinger (1835-1890), que era casado com uma das filhas de Leuzinger, Sabine Christine. Segundo Pedro Vasquez, Leuzinger foi “o primeiro marchand de fotografias do Brasil. Isso no sentido de distribuidor de fotografias e não no sentido moderno que damos ao termo, de galerista”. Possivelmente, o jovem Marc Ferrez (1843-1923) recebeu seus primeiros ensinamentos de fotografia de Franz Keller, na Casa Leuzinger. Em 1867, o trabalho do ateliê fotográfico de Leuzinger ganhou uma Menção Honrosa na Exposição Universal de Paris, com um panorama tomado da ilha das Cobras. Foi a primeira premiação internacional do Brasil em fotografia. No mesmo ano, Franz Keller, seu genro, e Joseph Keller, pai de Franz, foram encarregados pelo governo brasileiro para fazer os estudos preparatórios para a construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré. Leuzinger enviou, com eles, o fotógrafo alemão Christoph Albert Frisch (1840 – 1918), que trabalhava em seu ateliê. Dois anos depois, a Casa Leuzinger publicou o catálogo Resultat d’une expédition phographique sur le Solimões ou Alto Amazonas et Rio Negro, com as fotografias produzidas pelo fotógrafo alemão Christoph Albert Frisch (1840 – 1918) durante essa viagem à Amazônia.

O Catálogo da Exposição de História do Brasil, especialmente editado por Leuzinger para o evento realizado entre 1881 e 1882 pela Biblioteca Nacional, foi considerado pelo historiador José Honório Rodrigues (1913-1987) “o maior monumento bibliográfico da história do Brasil até hoje erguido”. Outros importantes trabalhos que editou foram uma série de fotografias da Amazônia de autoria do fotógrafo alemão Albert Frisch, o álbum Rio de Janeiro et ses environs, c. 1868, Caminho de Ferro de D. Isabel, 1875, dentre dezenas de outros.

 

 

 

Acessando o link para as fotografias de Georges Leuzinger disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

Cronologia de Georges Leuzinger (1813 – 1892)

 

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Georges Leuzinger. Folha de rosto do Álbum Rio de Janeiro e seus Arredores, c. 1868 / Acervo IMS

 

1813 – Georg Leuzinger nasceu, em 31 de outubro, no cantão de Glarus, na cidade suíça de Mollis, filho de Georg Leuzinger e Sabine Laager. Posteriormente, já no Brasil, adotou para seu nome a grafia francesa Georges.

1817 - Nasceu o único irmão de Leuzinger, Johannes, em 31 de dezembro.

1822 – Nasceu em Saint-Léonard, na França, a futura esposa de Georges Leuzinger, Anne Antoinette du Authier (1822-1898), filha do visconde Du Authier e de Marie-Anne Mounier. Curiosamente, era chamada de Eleonore pela família.

1832 – Em 30 de dezembro, sozinho, falando apenas alemão e com 19 anos, Leuzinger desembarca no Rio de Janeiro, após uma viagem de 54 dias desde o porto de Havre. No Diário do Rio de Janeiro, 2 de janeiro de 1833, terceira coluna, foi noticiada a chegada Bergantim Francez Les Drigas, que trouxe ao Brasil 56 suíços e oito franceses. Vem para trabalhar na Leuzinger & Cia, firma de exportação e importação que pertencia a seu tio, Jean-Jacques Leuzinger. Links para notícias de negócios realizados pela firma do tio: Diário de Rio de Janeiro, 3 de fevereiro de 1837, na primeira coluna, sob o título “Entradas no dia 31″; O Paquete do Rio, de 27 de maio de 1837, terceira coluna, sob o título “Entradas do dia 26 de maio”; Pharol do Imperio, de 20 e julho de 1837, sob o título “18 de julho – De portos estrangeiros”; O Sete d´abril, de 14 de março de 1839, na primeira coluna).

1839 – Eleonore, futura esposa de Leuzinger, veio morar no Brasil com a irmã, a baronesa de Geslin, dona  do Colégio de Meninas Francês, Português, no Rio de Janeiro. Posteriormente, Eleonore lecionou e dirigiu o estabelecimento.

1840  A firma do tio de Leuzinger foi liquidada.

Leuzinger comprou do também suíço Jean Charles Bouvier a papelaria e encadernação “Ao Livro Encarnado”, na rua do Ouvidor, 36, e abriu seu próprio negócio, em 1º de julho (Jornal do Commercio, 22 de julho de 1840, na terceira coluna). Ao longo das décadas seguintes, com a ampliação de seus negócios, tornou-se proprietário das seguintes firmas: Estamparia de G.Leuzinger, Litografia de G. Leuzinger e Officina Photographica de G.Leuzinger. Reunidas sob a marca G. Leuzinger, eram conhecidas como Casa Leuzinger.

Em 24 de novembro, Leuzinger e Eleonore se casaram, na igreja de Nossa Senhora da Glória do Outeiro. O casal, entre 1842 e 1862, teve 13 filhos: Sabine Christine (1842-1915), Anne Marie (1843-1911), Georges Henri (1845 -1908), Mathilde (1846-?), Eugenie (1847-?), Jean Edmond (1848-1916). Victor Ulrich (1849-1877), Léonie Emilie (1851-?), Gabrielle Marie (1853-1869), Paul Alphonse (1855-1927), Elise Georgianne (1856-1927), Georges (1858-1905), e Jules Adolf (1862-1889).

Anunciou a venda de “álbuns, pastas e carteiras de veludo e marroquim dourado, do gosto mais moderno de Paris; caixinhas ricas, contendo papéis diversos com cercaduras pintadas, para bilhetes de convites e cartas para senhoras, com todos os pertences de escrever e outros para pintura e desenho” (Jornal do Commercio, de 28 de dezembro de 1840, na terceira coluna).

1841- Anúncio da Leuzinger, com o endereço da rua do Ouvidor, 36, sobre a venda da Galeria Contemporânea Brasileira ou Colecção de Trinta Retratos de Brasileiros Célebres, desenhados e publicados pelo pintor e fotógrafo francês radicado no Rio de Janeiro, François-René Moreau (1807-1860) (O Despertador, 7 de outubro de 1841, na segunda coluna, sob o título “Annuncios”).

1842 - Leopoldo de Geslin, provavelmente o barão de Geslin, casado com a irmã de Leuzinger, tornou-se seu sócio (Jornal do Commercio, de 10 de maio de 1942, na primeira coluna sob o título “Objectos diversos”). Poucos meses depois, a sociedade terminou (Jornal do Commercio, de 5 de agosto de 1842, na terceira coluna).

1845 – Com litografias do francês Alfred Martinet (1821 – 1875), foram  publicadas as primeiras estampas editadas por Leuzinger, o Panorama circular da baía de Guanabara ( Jornal do Commercio, de 5 de março de 1845, na terceira coluna).

1846 – Leuzinger comprou a estamparia que pertencia a Eduardo Hulsemann (Jornal do Commercio, de 16 de janeiro de 1846, na primeira coluna).

1849 - O único irmão de Leuzinger, Johanes, mudou-se para Muscatine, no estado de Iowa, nos Estados Unidos.

Em parceria com o gravador (abridor) alemão R. Bollenberg, Leuzinger inaugurou uma oficina de estamparia. Oferecia, assim, dois serviços: o da “abrição”, que é a gravação da chapa em metal, e a sua impressão, função da estamparia (Jornal do Commercio, de 12 de julho de 1849, na segunda coluna).

Leuzinger publicou três projetos editoriais: um panorama da cidade, tomado do Corcovado em três partes; um conjunto de paisagem natural e outro de vistas da cidade. Este último foi impresso pela Maison Lemercier, em Paris.

1852 – Leuzinger comprou do francês Jean-Sébastian Saint-Amand uma tipografia, que ficava na rua São José, 64 (Jornal do Commercio, de 3 de novembro de 1852, na primeira coluna).

1853 - Leuzinger comprou uma oficina de litografia.

A Casa Leuzinger publicou o periódico semanal O Emigrado Alemão – Órgão para a colonização, Literatura, Ciências e Política  (Jornal do Commercio, de 18 de junho de 1853, na última coluna). 

A partir de daguerreótipos, Leuzinger publicou um conjunto de litografias da cidade do Rio de Janeiro. Anunciou no Jornal do Commercio, de 24 de dezembro de 1853, que as imagens poderiam ser “entregues em Paris, Londres, Hamburgo e Lisboa, conforme a vontade dos subscritores” (no topo da última coluna).

1854 - Imprimiu o periódico Courrier du Brésil, 5 de novembro de 1854..

1855 – Nasceu o décimo filho de Leuzinger, Paul, que teve como padrinho o pintor, escritor e jornalista dinamarquês Paul Harro-Harring (1798–1870)*, que foi um dos maiores ativistas e revolucionários europeus do século XIX. Era amigo de Leuzinger e esteve várias vezes no Brasil: em 1840, para denunciar a violência da escravidão; em 1842 e entre os anos de 1854 e 1855 como refugiado político (Correio Mercantil, de 21 de outubro de 1855, na terceira coluna, sob o título “Saíram ontem desse porto”) .

1856 - Foi aberta a oficina para escrituração da Casa Leuzinger.

1857 – Em dezembro, passou a imprimir o periódico Rio Commercial Journal.

1858 – Segundo registrado no volume XI dos Anais da Biblioteca Nacional, nesse ano, Leuzinger importou dos Estados Unidos “os primeiros prelos e tipos americanos, com que operou uma completa transformação na indústria tipográfica brasileira” (Annaes da Biblioteca Nacional, volume XI, de 1883).

1861 - Seus filhos Edmond e Victor foram estudar na Basiléia, na Suíça.

Leuzinger participou da Exposição Nacional com dois trabalhos na classe “Impressão, encadernação e objetos de escritório”. Recebeu a medalha de prata referente a “Livros grandes de encadernação”.

1862 – Leuzinger participou, pela primeira vez, de uma mostra internacional, a Exposição Universal de Londres.

Após  temporada de estudo, seu filho mais velho, Georges Henri, retornou da Europa e foi trabalhar na empresa do pai. Seria o gerente da Casa Leuzinger por mais de 40 anos.

Leuzinger ganhou a medalha de prata na categoria “Indústria fabril e manual”, da Exposição Nacional (Correio da Tarde, de 16 de março de 1862, na quinta coluna, sob o título “Collaboração”).

1865 – Foi aberto o ateliê de fotografia da Casa Leuzinger, especializado em “vistas da cidade, Tijuca, Petrópolis, Teresópolis e rio Amazonas”, como se lê no verso de uma de suas cartes de visite.

Em 1865 montou então Georges Leuzinger um completo ateliê fotográfico, com todos os aparelhos necessários para viagens para o interior do Brasil, tendo para esse fim contratado um habilíssimo artista fotógrafo para dirigi-lo, que em companhia de vários auxiliares fizeram excursões por essa capital, Petrópolis, Teresópolis, etc., tirando fotografias de tudo o que de mais interessante se encontra na pujante natureza daquelas blíssimas regiões“.

Ernesto Senna em O Velho Comércio do Rio de Janeiro

Algumas obras apontam que seu futuro genro, Franz Keller, trabalharia em seu ateliê fotográfico e que teria sido professor, no ateliê, do fotógrafo Marc Ferrez (1843 – 1923), recém chegado da França. Mas esses fatos nunca foram comprovados. Na verdade, durante a década de 1860, Keller ficou bastante ocupado com trabalhos na área de engenharia que realizou com seu pai, o também engenhero Joseph Keller.

1865 a 1875 – Nesse período, Leuzinger realizou a maior e mais importante parte de sua produção fotográfica, que pode ser dividida em cinco séries principais: panoramas e paisagens da cidade do Rio de Janeiro e de seu entorno imediato, vistas de Niterói, vistas da Serra dos Órgãos de Teresópolis e Petrópolis, documentação botânica e documentação etnográfica, botânica e paisagística da região amazônica.

1866 – Seus filhos, Victor e Edmond, já estavam no Brasil trabalhando em seu ateliê fotográfico.

De 19 de outubro a 16 de dezembro de 1866, realizou-se a II Exposição Nacional. A fotografia apareceu pela primeira vez como categoria específica, separando-se do grupo destinado às Belas Artes. Leuzinger ganhou a medalha de prata na categoria “Paisagem”, com nove vistas da cidade e arredores (Semana Illustrada, de 18 de novembro de 1866). Seu trabalho chamou a atenção do pintor Victor Meirelles (1833-1903) que comentou:

“Os trabalhos fotográficos desse senhor primam pela nitidez, vigor e fineza dos tons e também por uma cor muito agradável. Pode-se dizer desses trabalho, que são perfeitos, pois que representam fielmente com todas as minudências os diversos lugares pitorescos de nosso característico país. Algumas provas são obtidas com tanta felicidade que parece antes um trabalho artisticamente estudado e que neste ponto rivalizam com a mais perfeita gravura em talhe doce; direi que estas provas poderiam perfeitamente servir de estudo aos artistas que se dedicam a arte bela da pintura de paisagens. As formas são ali reproduzidas com toda a fidelidade da perspectiva linear, e o que sobretudo torna-se ainda mais digno de atenção é a perspectiva aérea, tão difícil de obter-se na fotografia sem grande alteração.

Aquela gradação dos planos que tão bem se destacam entre si e vão gradualmente desaparecendo no horizonte até o último é obtida de modo a não ter-se mais que desejar, sendo nesta parte notáveis as seguintes vistas:

Gavia do lado da Tijuca, Vale do Andarahy, Montanha dos Órgãos vista da barreira, Vista da Praia Grande, A planície abaixo da cascata na Tijuca, O rochedo de Quebra Cangalhas, Panorama da cidade do Rio de Janeiro, Montanha dos Órgãos do lado de Teresópolis, O Garrafão, e muitas outras que deixaremos de mencionar”.

1867 -Sua filha Sabine Christine  (1842-1915) casou-se com Franz Keller (1835-1890), que passou a assinar Franz Keller-Leuzinger.

Franz e seu pai, o também engenheiro Joseph Keller, foram encarregados pelo governo brasileiro de fazer os estudos preparatórios para a construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré. Leuzinger enviou, com eles, o fotógrafo alemão Christoph Albert Frisch (1840 – 1918), que trabalhava em seu ateliê. Partiram em 15 de novembro (Diário do Povo, de 15 de novembro de 1867, na primeira coluna).

Albert Frisch acompanhou os engenheiros somente até Manaus … percorreu 400 léguas pelo rio Amazonas e seus afluentes durante 5 meses…, num barco acompanhado por dois remadores, desde Tabatinga até Manaus. Produziu, na ocasião, uma pioneira série de 98 fotografias com os primeiros registros que chegaram até nós de índios brasileiros da região, além de aspectos de fauna e flora e de barqueiros de origem boliviana, que atuavam como comerciantes itinerantes nos rios amazônicos. Segundo o livro de Ernesto Senna, O velho commercio do Rio de Janeiro, a expedição fotográfica de Frisch à Amazônia foi fruto de uma solicitação feita pelo suíço Louis Agassiz (1807 – 1873) a Leuzinger.

Satisfazendo ao pedido de Agassiz, fez Leuzinger tirar vistas até Tabatinga, na fronteira do Amazonas com a República do Peru, vistas que serviram não só para os trabalhos científicos daqule sábio, como também para ilustrações europeias. Quando o engenheiro Keller foi em comissão explorar os rios Madeira e Mamoré, Georges Leuzinger mandou um fotógrafo d casa acompanhar a expedição, que trouxe depois daquelas incomparáveis regiões graande cópia de clichês, da flora, da fauna, de paisagens, e fotograafias de silvícolas e de suas tabas, aldeamentos, instruentos, armas, etc. Estas coleções, de graande valor para estudos etnográficos, eram muito interessantes sob qualquer ponto de vista e muito procuradas por viajantes estrangeiros”.

Agassiz havia, entre 1865 e 1866, comandado a Comissão Thayer no Brasil, que percorreu boa parte do território brasileiro entre o Rio de Janeiro e a Amazônia, viagem que deu origem ao livro A journey in Brazil, editado em Boston, em 1868. A comissão foi financiada pelo empresário e filantropo norte-americano Nathaniel Thayer, Jr. (1808-1883), ex-aluno de Agassiz no Museu de Zoologia Comparada, em Harvard.

Vale lembrar que Charles Frederick Hartt (1840 – 1878), o futuro chefe da Comissão Geológica do Império (1875 – 1878), integrada pelo fotógrafo Marc Ferrez (1843-1923), participou da Comissão ou Expedição Thayer – foi a primeira vez que esteve no Brasil.

Leuzinger adquiriu a loja número 33 da rua do Ouvidor, posteriormente renumerada para 31, onde passou a funcionar sua papelaria.

O trabalho do ateliê fotográfico de Leuzinger ganhou uma Menção Honrosa na Exposição Universal de Paris, com um panorama tomado da ilha das Cobras. Foi a primeira premiação internacional do Brasil em fotografia.

O imperador Pedro II (1825 – 1891) pediu a Leuzinger que fotografasse o quadro Os funerais de Atahualpa, do pintor peruano Luiz Montero (1826-1869), que estava fazendo uma exposição no Rio de Janeiro (Jornal do Commercio, de 1º de setembro de 1867, sob o título “Gazetilha”, na sexta coluna).

1869 – A filha de Leuzinger, Gabrielle Marie (1853 – 1869), faleceu em 23 de abril de 1869 (Jornal do Commercio, 29 de abril de 1869, última coluna).

Após sua morte, ela estava quase sorridente, uma figura de anjo e tão branca quanto os lençóis de seu leito. Franz Keller fez seu retrato de perfil para nosso espanto o perfil perfeito de Mathilde quando tinha sua idade, 16 anos, 6 dias e 21 horas e meia” (Carta de Georges Leuzinger para seu filho Paul, que estava vivendo na França, de 2 de junho de 1969).

A obra Flora Brasiliensis, iniciada por Carl Friedrich Phillip von Martius (Erlanger, Alemanha, 1794 – Munique, Alemanha, 1868), renomado naturalista do século XIX, e concluída pelos também alemães August Wilhelm Eichler (1839 – 1887) e Ignatz Urban (1848 – 1931), com a ajuda de 65 especialistas de vários países, foi publicada entre 1840 e 1906. A imagem Silva Montium Serra dos Orgâos Declivia Obumbrans, in Prov. Rio de Janeiro, publicada no fascículo de 1869, foi baseada em uma fotografia de Leuzinger.

 

 

Publicação do catálogo Resultat d’une expédition phographique sur le Solimões ou Alto Amazonas et Rio Negro, com as fotografias produzidas pelo fotógrafo alemão Christoph Albert Frisch (1840 – 1918) durante sua viagem pela Amazônia, em 1867.

 

 

1872 – A Casa Leuzinger estava em seu auge. Já tinha recursos como 19 mil quilos de tipos americanos para impressão, um motor a gás com potência de quatro cavalos e dez prelos mecânicos, além de empregar 50 funcionários (Annaes da Biblioteca Nacional, volume XI de 1883).

Em julho, Franz Keller (1835-1890) estava na Suíça.

Em 1º de novembro, concedeu aos três filhos mais velhos a sociedade na Casa Leuzinger, passando a firma a se chamar G. Leuzinger & Filhos (Jornal do Commercio, de 8 de maio de 1873, na segunda coluna).

1873 – Leuzinger voltou pela primeira vez à Europa.

A Casa Leuzinger  ocupava um prédio de três andares da rua Sete de Setembro, 35, além do segundo andar do número 37 da mesma rua. Nesses endereços funcionavam as oficinas de pautação, encadernação, douração, e livros para escrituração. A tipografia continuava na rua do Ouvidor, 36.

Com dois panoramas litografados do Rio de Janeiro, Leuzinger participou da Exposição Nacional. Ganhou Menção Honrosa na Exposição Universal de Viena nas duas categorias em que enviou trabalhos: “Fotografia” e “Livros de contabilidade e encadernação”.

1874 – Seu genro e funcionário, Franz Keller (1835-1890) que já havia retornado à Alemanha, publicou o livro ilustrado Do Amazonas ao Madeira (Jornal do Commercio, de 31 de janeiro de 1874, na última coluna).

 

 

Polêmica em torno da vitória de Leuzinger em uma concorrência para a impressão de trabalhos da repartição geral de estatística (Jornal do Commércio, 1º de setembro, na última coluna; dois artigos no dia 2 de setembro, na quinta coluna da primeira página e na terceira coluna da segunda página; de 3 de setembro, na última coluna; de 4 de setembro, na sexta coluna; e de 5 de setembro, na terceira coluna).

Provavelmente nesse ano, Leuzinger imprimiu o Censo Geral do Império, de 1872, o primeiro da história do Brasil.

1875 – Seu filho Edmond casou-se com Leocádia de Faria e passou a trabalhar na firma do sogro, a Faria, Cunha e Cia.

A Casa Leuzinger participou da IV Exposição Nacional com um álbum composto de quatro fotogravuras impressas pela Casa Goupil, de Paris, e com fotografias de índios e paisagens da Amazônia.

1876 – A Casa Leuzinger participa da Exposição Universal da Filadélfia com material de encadernação. Imprime o primeiro volume dos Anais da Bibliotheca Nacional .

1878 a 1879 - Publicou O Besouro, jornal que trazia litografias impressas a vapor por Ângelo Agostini (1843 – 1910) e Paul Théodore Robin (? – 1897), a maioria de autoria do português Bordalo Pinheiro(1846 – 1905).

1881 – Para preservar seu trabalho como editor de estampas, Leuzinger doou para a Seção de Iconografia da Biblioteca Nacional um conjunto de 114 imagens de gravuras e desenhos.

No Rio Grande do Sul, a Casa Leuzinger participou da Exposição Provincial Brasileira-Alemã.

1882 – Foi realizada a Exposição Continental de Buenos Aires, com a participação da Casa Leuzinger.

1885 - Leuzinger participou da Exposição Internacional de Antuérpia. Foi fundada, em 23 de novembro, a Sociedade Beneficente dos Empregados da Casa Leuzinger.

1889 – A Casa Leuzinger participou da Exposição Universal de Paris.

1892 – Georges Leuzinger morreu em 24 de outubro (Gazeta de Notícias, 25 de outubro de 1892, na quinta coluna e Revista Illustrada, novembro de 1892, na terceira coluna). A família agradeceu às manifestações de pesar (O Tempo, 27 de outubro de 1892, no topo da quarta coluna).

1898 – Morte de Eleonore Leuzinger (Gazeta de Notícias, de 18 de outubro de 1898, no topo da quinta coluna).

Para a elaboração dessa cronologia, a Brasiliana Fotográfica pesquisou em várias fontes, principalmente no Cadernos de Fotografia Brasileira – Georges Leuzinger, do Instituto Moreira Salles, e em diversos jornais da Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora-assistente e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

*Para conhecer mais sobre Paul Harro-Harring, acesse o artigo Paul Harro-Harring, um viajante abolicionista, publicado em 18 de outubro de 2013, na Brasiliana Iconográfica.

 

Bibliografia

Cadernos de Fotografia Brasileira – Georges Leuzinger, IMS. Rio de Janeiro: Bei Comunicação, junho de 2006.

COSTA FERREIRA, Orlando da. Imagem e letra: introdução à bibliologia brasileira: a imagem gravada. São Paulo: Edusp, 1994.

KOSSOY, Boris. Dicionário histórico-fotográfico brasileiro: fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910). São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2002. 408 p., il. p&b.

LAGO, Bia Corrêa do;LAGO, Pedro Corrêa do. Coleção Princesa Isabel: fotografia do século XIX. Rio de Janeiro: Capivara, 2008.432p.:il., retrs.

LAGO, Bia Corrêa do;LAGO, Pedro Corrêa do. Os Fotógrafos do Império. Rio de Janeiro: Capivara, 2005. 240p.:il

MEIRELLES, Victor. “Photographia” In BRASIL. Exposição Nacional. Relatório da Segunda Exposição Nacional de 1866, publicado […] pelo Dr. Antonio José de Souza Rego, 1o secretário da Commissão Directora. Rio de Janeiro: Typ. Nacional, 1869, 2ª parte, pp. 158-170

SANSON, Maria Lucia David de; AIZEN, Mario; VASQUEZ, Pedro. O Rio de Janeiro do fotógrafo Leuzinger 1860-1870. Rio de Janeiro: Editora Sextante Artes, 1998.

SENNA, Ernesto. O Velho Comércio do Rio de Janeiro. 2ª edição. Rio de Janeiro: G Ermakoff, 2006.

TURAZZI, Maria Inez. Poses e trejeitos: a fotografia e as exposições na era do espetáculo – 1839/1889 / Maria Inez Turazzi – Rio de Janeiro: Rocco, 1995. 309p. : il

VASQUEZ, Pedro. O Brasil na fotografia oitocentista/ [pesquisa e texto]Pedro Karp Vasquez; [reproduções fotográficas Cesar Barreto, Rosa Gauditano].–São Paulo: Metalivros, 2003.

O pintor Antonio Parreiras (20/01/1860, Niterói, RJ – 17/10/1937, Niterói, RJ)

 

A Brasiliana Fotográfica oferece a seus leitores algumas fotos do niteroiense Antonio Parreiras ( 1860 -1937), um dos maiores pintores brasileiros do final do século XIX e das primeiras décadas do século XX.  Foi justamente em um estabelecimento fotográfico, do português Joaquim Insley Pacheco (c. 1830-1912), um dos mais importantes retratistas do século XIX no Brasil e fotógrafo da Casa Imperial, que Parreiras realizou a sua primeira grande mostra artística, em 27 de maio de 1886 (O Paiz, 28 de maio de 1886, na sétima coluna). Não raramente havia uma colaboração próxima entre pintores e fotógrafos: foi justamento no ateliê de um fotógrafo, Félix Nadar (1820-1910), que foi realizada a primeira exposição dos impressionistas em Paris, entre 15 de abril e 15 de maio de 1874. Na época, os pintores impressionistas, dentre eles Claude Monet, Pierre-Auguste Renoir, Camille Pissarro, Alfred Sisley, Paul Cézanne, Berthe Morisot e Edgar Degas, eram rejeitados pela crítica.

>Antonio Parreiras foi eleito, em 1925, o maior artista do país no Grande Concurso Nacional realizado entre os leitores da revista Fon-Fon (Revista Fon-Fon, 28 de março de 1925). Os segundo e terceiro lugares ficaram para Rodolfo Bernardelli e Baptista da Costa, respectivamente. Em outras categorias, brasileiros ilustres também se destacaram: Epitácio Pessoa, maior estadista; Guiomar Novaes, maior musicista; Coelho Netto, maior escritor; e Leopoldo Froes, maior ator; dentre outros. Mas não foi sempre uma uninimidade: o escritor Lima Barreto (1881 – 1922) o criticou duramente no artigo publicado Os pintores (Correio da Noite,  5 de março de 1915, última coluna).

Em seu ateliê, que hoje faz parte do Museu Antonio Parreiras, em Niterói, inaugurado em 21 de janeiro de 1942,  mandou esculpir em seu pórtico a epígrafe “Trabalhar é viver”. Segundo o próprio Parreiras, ao longo de uma carreira de cerca de 55 anos, realizou 850 pinturas, das quais 720 em solo brasileiro. Inicialmente, dedica-se à paisagem, mas após uma temporada de cerca de dois anos na Europa, entre 1888 e 1890, começa a se interessar pela figura humana. A partir de 1899, executa painéis em alguns palácios e prédios públicos. O renomado pintor Victor Meirelles (1832-1903) o estimula a pintar cenas históricas para o governo. Dentre elas, destacam-se Morte de Estácio de Sá”, “Prisão de Tiradentes” e “Proclamação da República”. Foi também o decorador do Instituto Nacional de Música e do Conservatório de Belo Horizonte.

 

Acessando o link para as fotografias de autoria de Antonio Parreiras disponíveis na Brasiliana Fotográfica, o leitor poderá magnificar as imagens e verificar todos os dados referentes a elas.

 

Cronologia da vida de Antonio Parreiras

 

1860 – Em 20 de janeiro, nascimento de Antonio Diogo da Silva Parreiras, em Niterói. Seu pai era o ourives Jacinto Antonio Diogo Parreiras, e sua mãe era Maria Rosa da Silva Parreiras. Quando criança estudou no Liceu Tintori e no Colégio Guilherme Briggs.

1875 – Com a morte do pai, em 12 de dezembro de 1874, interrompeu seus estudos e começou a trabalhar como balconista no comércio.

1878 – Solicitou inscrição no curso noturno de desenho da Academia Imperial de Belas Artes.

1881- Casou-se com Quirina Ramalho da Silva. Nessa época, empregou-se como escriturário na Estrada de Ferro de Cantagalo, em Nova Friburgo. Tornou-se sócio do sogro em uma sapataria.

1882 - Nascimento de Egídio, primeiro filho do casal, que faleceu 4 meses depois.

1883- Matriculou-se  como aluno amador na Academia Imperial de Belas Artes e estudou com o paisagista Georg Grimm (1846-1887). Realizou sua primeira pintura a óleo: “Meu primeiro estudo a óleo”. Fez duas exposições: uma em sua casa, em Niterói, na rua Santa Rosa, 12; e outra na Casa Moncada, no Rio de Janeiro.

1884 – Executou com Frederico de Barros e Orestes Coliva a pintura do pano de boca do Teatro Santa Teresa, atual Teatro Municipal João Caetano, em Niterói.

Tornou-se aluno efetivo da Academia Imperial de Belas Artes.

Recebeu uma crítica positiva por seus trabalhos expostos em Teresópolis (Gazeta de Notícias, de 15 de dezembro de 1884, na sexta coluna sob o título “Um túmulo no alto da serra de Theresópolis”).

1884 / 1885 - Em decorrência da proibição imposta ao professor Grimm para que não ministrasse suas aulas ao ar livre, Parreiras abandonou a academia com os pintores Giovanni Castagneto (1851 – 1900), Hipólito Boaventura Caron (1862 – 1892), Domingos Garcia y Vasquez (1859 – 1912), Joaquim José de França Junior (1838 – 1890), Francisco Joaquim Gomes Ribeiro (c. 1855 – c. 1900) e Thomas Driendl (1849 – 1919). Formaram então o Grupo Grimm, que representou uma renovação na pintura da paisagem no Brasil.

Nascimento de sua filha, Olga, em 19 de maio.

Parreiras realizou exposições individuais na loja “A Photografia”, em Niterói, e na “Casa de Wilde” e na “Casa Katele”, no Rio de Janeiro. Seus quadros, “Maruhy Pequeno”, “Um lago em S. Vicente” e “Foz do Icarahy’ são elogiados (O Fluminense, 7 de junho de 1885). Também expôs em sua casa, em Niterói.

1886 - Em 27 de maio, inaugurou  sua maior mostra artística, até então, no estabelecimento fotográfico de Joaquim Insley Pacheco, fotógrafo da Casa Imperial, na Rua do Ouvidor, no Rio de Janeiro (O Paiz, 28 de maio de 1886, na sétima coluna) e recebeu a visita do imperador Dom Pedro II. A exposição rendeu-lhe uma crítica do colega França Júnior (O Paiz, 1º de junho de 1886, sob o título “O Paisagista Parreiras”, na quinta coluna). O imperador Dom Pedro II comprou o quadro “Foz do Icarahy”.

Expôs também em Angra dos Reis e em Rezende.

1887 – Encontrou-se pela última vez com Georg Grimm, que retornou à Europa, e faleceu em Palermo, na Itália, em 24 de dezembro.

As obras de Parreiras “A Tarde” e “Efeitos da Tempestade” foram adquiridas pela Academia Imperial de Belas Artes, o que possibilita sua primeira viagem à Europa.

Foi noticiado que seria publicado o primeiro livro de versos de Olavo Bilac, “Via-Láctea”, e que traria na capa um desenho de Parreiras (Novidades, 27 de março de 1887).

A Semana, de 18 de junho de 1887 , publicou uma matéria elogiosa à carreira do pintor.

1888 - Em 27 de janeiro, uma nova exposição na Casa Insley Pacheco, na Rua do Ouvidor, foi inaugurada com 22 estudos de paisagem. Duas foram adquiridas pela própria princesa Isabel: “Ocaso no Arraial” e “Aldeia do Pontal” ( O Paiz, 29 de janeiro de 1888, sob o título “Noticiário“, e Revista Illustrada, 4 de fevereiro de 1888).

Nascimento de sua segunda filha.

Viajou para a Itália (Revista Illustrada, 10 de março de 1888, terceira coluna, última notícia) e durante dois anos frequentou a Academia de Belas Artes de Veneza, tornando-se discípulo de Filippo Carcano (1840-1910).

Em 17 de março, foi publicado na Pacotilha, uma poesia de Rodrigo Otávio dedicada a Parreiras. Expõs, com sucesso, um quadro que retratava um campo romano, no Salão Permanente de Belas Artes em Veneza.

Foi noticiado que uma fotografia da referida obra seria exposta em breve na galeria Leite Ribeiro, na rua do Ouvidor (Gazeta de Notícias, 19 de agosto de 1888, na sexta coluna).

Um artigo da Gazeta de Notícias elogiava fotografias de obras de Parreiras, que ainda estava em Veneza, e citou críticas favoráveis ao artista feitas por jornais italianos (Gazeta de Notícias, 27 de dezembro de 1888).

1889 – Nos salões do sr. Narciso e Artur Napoleão, com sucesso, foram expostos dez pinturas enviadas por Antonio Parreiras, de Veneza (Gazeta de Notícias, 20 de fevereiro de 1889, na sétima coluna, e Gazeta de Notícias, de 24 de fevereiro de 1889, quarta coluna), que foi visitada pelo conde d´Eu, marido da princesa Isabel (Gazeta de Notícias, 10 de março de 1889, última notícia da terceira coluna).

1890 – Em 5 de janeiro, retornou ao Brasil.

Foi nomeado professor interino na cadeira de Paisagem na Academia de Belas Artes e adotou o método de ensino do professor Grimm (Novidades, 7 de junho de 1890, sexta coluna, última notícia).

Ganhou medalha de ouro na Exposição Geral de Belas Artes (Cidade do Rio, 10 de outubro de 1890, quarta coluna, última notícia).

1891- Rompeu com a Academia Imperial de Belas Artes, quando a cadeira de Paisagem foi extinta, devido à reforma curricular proposta por Rodolfo Bernardelli (1852-1931) e Rodolfo Amoedo (1857-1941). Escreveu sobre sua demissão e foi apoiado (Novidades, 27 de janeiro de 1891 e Novidades, 30 de janeiro de 1891). O nome da instituição foi alterado para Escola Nacional de Belas Artes – Enba.

Parreiras foi para Teresópolis e Friburgo.

Fundou, em 6 de julho, em Niterói, a Escola de Pintura ao Ar Livre, seguindo os ensinamentos de Grimm.

1892 - Em maio, comandou uma exposição dos membros da Escola ao Ar Livre, no salão do jornal Cidade do Rio, de José do Patrocínio (1853 – 1905). Das 92 obras exposta, 68 foram vendidas. A mostra foi um sucesso, tendo sido visitada por cerca de 10 mil pessoas, dentre elas os pintores Victor Meirelles (1832 – 1903) e Eliseu Visconti (1866 – 1944) (O Paiz, 30 de maio de 1892, na primeira coluna).

Em agosto, morte de sua filha caçula.

1893 – Em seu ateliê, exposição da pintura Panorama de Niterói.

Realizou outra exposição com os discípulos com o qual formou a Escola de Pintura ao Ar Livre, no salão do jornal Cidade do Rio (Cidade do Rio, 5 de fevereiro de 1893, na quarta coluna).

Em junho, realizou no Salão do Banco União, sua primeira exposição em São Paulo, um grande sucesso de vendas, público e crítica. Foi visitada por cerca de 4 mil pessoas e teve 24, dos 43 quadros expostos, vendidos (Cidade do Rio, 19 de junho de 1893, primeira coluna).

Conheceu o engenheiro e arquiteto Francisco de Paula Ramos de Azevedo (1851-1928), de quem encomenda o projeto de sua residência, atualmente, parte do Museu Antônio Parreiras. Ramos de Azevedo foi o grande construtor da cidade de São Paulo em fins do século XIX e nas primeiras décadas do século XX.

Realizou várias obras encomendadas por fazendeiros paulistas.

1894 –  O general Argollo, comandante-chefe da guarnição de Niterói  visitou o ateliê de Parreiras e admira o quadro Viva a República!, que retratava a esquadra legal, no dia 13 de março de 1894, durante a Revolta da Armada (O Paiz, 6 de abril de 1894).

Parreira terminou o segundo quadro de sua autoria sobre a Revolta da Armada, Bons dias a Villegaignon ( O Paiz, 19 de abril de 1894, na primeira coluna).

Entre 15 e 29 de agosto, realização de outra exposição de sucesso de Parreiras, em São Paulo, desta vez no Club dos Tenentes de Plutão.

No dia 24 de novembro, nascimento de seu filho e pupilo, Dakir (1894 – 1967).

Expôs em São Paulo, na Casa Steidel e no Salão Paulicéia.

As pinturas Panorama de NiteróiPaisagem e Noite foram apresentadas no Pavilhão Brasileiro da Exposição Universal de Chicago ( O Paiz, 11 de janeiro de 1895, penúltima notícia da quinta coluna). Em dezembro, Parreiras, Aurélio Figueiredo (1856 – 1916), Pedro Américo (1843 – 1905) e Victor Meirelles publicaram um manifesto e retiraram suas obras do julgamento do evento.

1894 / 1895 - Como correspondente do Estado de São Paulo escreveu textos críticos sobre diversos pintores, dentre eles Pedro Alexandrino (1856 – 1942) e Berthe Worms (1868 – 1937), e também sobre a reforma de ensino da Escola Nacional de Belas Artes.

1895 – Inaugurou em 11 de agosto sua residência-ateliê, projeto de Ramos de Azevddo, na rua Tiradentes, em Niterói, com a exposição de 45 trabalhos.

Publicou no Jornal do Commercio, um artigo contra a orientação da Escola Nacional de Belas Artes (Jornal do Commercio, 23 de dezembro de 1895, quarta e quinta colunas).

1896 – Após dois anos, terminou a pintura “Sertanejas” (O Paiz, 22 de setembro de 1896, na quinta coluna).

Em novembro, fez uma exposição em seu ateliê com seus alunos Alberto Silva, Cândido de Souza Campos e Álvaro Castanheda no Pavilhão da Lapa, dedicada a Georg Grimm. A mostra foi um sucesso e no seu catálogo constavam poesias e textos de Olavo Bilac (1865-1918) e Coelho Neto (184-1934), dentre outros. Crítica de Oscar Guanabarino ( O Paiz, 6 de novembro de 1896).

1897 – Sua obra Sertanejas foi adquirida pelo governo federal para ser colocada no Palácio do Catete, inaugurado em 22 de fevereiro, no Rio de Janeiro. Três anos depois, a pintura, danificada, foi transferida para a Escola Nacional de Belas Artes.

1898 – Foi contratado pelo presidente da República, Campos Salles (1841 – 1913), para produzir obras para oo Supremo Tribunal Federal.

Realizou suas duas primeiras pinturas históricas: Os Desterrados e Suplício de Tiradentes.

1902 – Expôs 23 telas em Santos.

Criou o estandarte para o jornal O Fluminense.

1903 - Realizou uma exposição de trabalhos de suas alunas, que frequentavam um curso feminino de pintura que criou em seu ateliê no ano anterior ( O Fluminense, 11 de janeiro de 1903).

1905 - Contratado pelo governador do Pará, Augusto Montenegro, Parreiras visitou Belém para executar A conquista do Amazonas (O Paiz, 6 de junho de 1905, na terceira colunaO Paiz, 13 de julho de 1905, segunda coluna). Expôs em Belém, no Teatro da Paz, e, em Manaus, no Palácio do Rio Negro.

Contraiu malária.

1906 - Em fevereiro, segunda viagem à Europa. Permaneceu em Lisboa por cerca de um mês, onde conheceu o pintor José Malhôa (1855-1933). Seguiu para Paris, onde instalou seu ateliê na rue Boissonade, 30 (O Paiz, 19 de junho de 1906). Encontrava-se frequentemente com o casal de artistas plásticos Lucílio de Georgina de Albuquerque, dentre outros. Posteriormente, transferiu seu ateliê para a Rue Le Goff (1908) e, depois, para a Rue Val de Grace (1913).

1907 - Retornou ao Brasil a bordo do navio Magellan (O Paiz, 8 de julho de 1907, terceira coluna).

1908 – Foi para Belém (Gazeta de Notícias, 3 de janeiro de 1908) e, de lá, com seu filho Dakir e sobrinho Edgard, seguiu para Paris, onde os iniciou na pintura.

1909 -  Sua pintura de nu, Fantasia, foi muito elogiada pela imprensa parisiense e foi noticiada sua iminente volta ao Brasil (Gazeta de Notícias, 21 de junho de 1909, sob o título “Notas e Notícias). Devido ao sucesso da obra, tornou-se associado da Societé Nationale de Beaux Arts et Lettres de Paris (Gazeta de Notícias, 21 de junho de 1909, na última coluna).

Retornou ao Brasil (Gazeta de Notícias, 5 de julho de 1909, sob o título “Notas e Notícias“).

Década de 10 - Vai várias vezes a Paris, onde tem um ateliê.

1910 - Inscreveu no Salon de la Societé Nationale de Beaux Arts a pintura Frineia. Apresentou posteriormente Dolorida (1911), Flor Brasileira(1913), Nonchalance (1914), e Modelo em Repouso (1920).

1911 – Seu sobrinho, Edgard, voltou de Paris.

Parreiras participou da exposição de Turim (O Paiz, 22 de junho de 1911).

Com a presença do presidente da República, marechal Hermes da Fonseca, inauguração da exposição do quadro Morte de Estácio de Sá, no edifício da Associação dos Empregados do Comércio (O Paiz, 2 de julho de 1911). Crítica à exposição de Parreiras (O Paiz, 31 de agosto de 1911, na segunda coluna).

1913 – Terminou de pintar o quadro Flor brasileira.

 

 

 

1915 – Na Escola de Belas Artes, exposição de Antônio Parreiras, e de seu filho, Dakir (Revista da Semana, 27 de fevereiro de 1915).

Década de 20 – Prosseguiu na realização de pinturas históricas, mas é menor o número de paisagens.

1922 – Após a morte de sua primeira esposa, Parreiras casou-se com Laurence Palmire Martignet e retornou ao Brasil. Laurence foi a guardiã da obra de Parreiras. Ela foi a modelo dos quadros Dolorida e Flor Brasileira.

1923 – Recebeu a medalha de honra de ouro na 30ª Exposição Geral de Belas Artes, quando apresentou 79 trabalhos.

1925 – No concurso nacional Os maiores brasileiros vivos, promovido pela revista Fon-Fon, foi eleito o maior artista, com cerca de 19.827 mil votos, seguido por Rodolfo Bernardelli e Baptista da Costa (Fon-Fon, 14 de março de 1925, na segunda coluna, Fon-Fon, 28 de março de 1925, e Fon-Fon, 4 de abril de 1925).

1927 - Notícia sobre a publicação de seu livro de memórias, História de um pintor contada por ele mesmo (1926), que o conduziu à Academia Fluminense de Letras (Revista da Semana, de 8 de janeiro de 1927, na seção “Novos Livros”).

Esculpido em Paris por Marc Robert (1875 – ?), foi inaugurado um busto de Parreiras na Praça Getulio Vargas, em Niterói (O Fluminense, 25 de janeiro de 1927).

 

 

 

1929 – Em outubro, fundou o Salão Fluminense de Belas Artes.

No Salão Ibero-Americano de Sevilha e na Exposição Universal de Barcelona foi premiado com medalha de ouro.

1936 – Parreiras realizou com dificuldades, pois já estava doente e debilitado, a sua última grande obra, o tríptico Fundação da Cidade do Rio de Janeiro, encomendado pelo prefeito Pedro Ernesto (1884-1942).

1937 - Suas últimas telas foram “A Tarde” e “O Fogo”.

Em 17 de outubro, faleceu, aos 77 anos, em Niterói (Correio da Manhã, de 19 de outubro de 1937).

1942 - Inauguração, em 21 de janeiro, do Museu Antonio Parreiras, em Niterói. Instituído pelo Decreto-Lei nº 219, de 24 de janeiro de 1941, foi o primeiro museu brasileiro dedicado a um só artista (O Fluminense, de 22 de janeiro de 1942). O conjunto arquitetônico e paisagístico é tombado pelo Instituto do Patrimônio Artístico Nacional.

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora-assistente e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Antonio Parreiras, pinturas e desenhos / curadoria Ana Paula Nascimento; textos de Ana Paula Nascimento e Telma Mösken; apresentação Ivo Mesquita et al. São Paulo: Pinacoteca de Estado, 1913

Enciclopédia Itau Cultural

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

NASCIMENTO, Ana Paula; TARASANTCHI, Ruth Sprung. Família Parreiras: Antonio, Edgar e Dakir. José Oswaldo de Paula Santos e Fundação Maria Luisa e Oscar Americano (Apresentação); Ana Paula Nascimento e Ruth Sprung Tarasantchi (Curadoria). São Paulo: SOCIARTE, 2013. 100p.:il.

PARREIRAS, Antonio. História de um pintor contada por ele mesmo. Brasil-França/1881-1939. 3.ed. Niterói (RJ): Niterói Livros, 1999. (1.ed.1926)

PONTUAL, Roberto. Dicionário de Artes Plásticas no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1969.

Site da Associação Brasileira dos Críticos de Arte

Site do Museu Antônio Parreiras

Retratos

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Marc Ferrez. Menino Índio, c. 1880 Mato Grosso / Acervo IMS

O retrato (ou portrait) é o mais popular dentre todos os gêneros de fotografia, desde os primórdios desta invenção – a tal ponto que a expressão “tirar um retrato” é, ainda hoje, confundida com a expressão “tirar uma fotografia”, de designação bem mais genérica.

Explorado por seus inventores e experimentado em todos os processos e formatos, foi o retrato que celebrizou alguns dos mais importantes nomes da história da fotografia, que dele se valeram para documentar, encenar, idealizar, conhecer e dar a conhecer, provocar e refletir, através das mais diversas estratégias.

Das cartes de visite e dos álbuns de família do século 19 até aos atuais álbuns virtuais da internet, passando pelas suas inúmeras apropriações (nas artes, nas ciências médicas e sociais, no sistema judiciário etc.), há um longo e complexo trajeto a ser passado em revista.

A propensão da câmera fotográfica de combinar verossimilhança com metáfora sempre favoreceu o uso da fotografia no jogo de aparências que define o universo do retrato.

Como indica Gisele Freund em seu livro Fotografia e Sociedade, (Lisboa, Dom Quixote, 1986), se por um lado o advento da fotografia permitiu a democratização do retrato, em função de seus custos reduzidos em relação aos tradicionais retratos de pintura a óleo, muitas camadas da sociedade buscaram também no retrato fotográfico a emulação de um estamento social privilegiado ao qual não pertenciam, através dos trajes, cenários e aparatos de estúdio que constroem a linguagem do retrato naquele período.

Pode-se contra-argumentar, entretanto, que nos retratos fotográficos de estúdio do século XIX, o olhar e a pose do retratado também apresentam, constroem e defendem sua identidade perante o fotógrafo. Ainda não havia ocorrido naquele momento a larga difusão dos processos fotomecânicos que ganharia força na virada do século XIX para o século XX, trazendo a avassaladora presença das revistas ilustradas como principal veículo de comunicação visual de massa, na sociedade do espetáculo que se estruturaria ao longo do século XX. Naquele contexto, a “pose”, – tomada no sentido contemporâneo do processo de construção de uma persona artificial que despista e dissimula a identidade do retratado –, ainda não é a regra nos retratos do século XIX e início do século XX, o que, portanto, permite uma leitura mais direta do olhar e da expressão dos retratados.

Entremeiam-se, assim, poses solenes com olhares espontâneos e diretos. Esses retratos podem, portanto, ser entendidos como registros que lidam simultaneamente com as aparências relacionadas à liturgia dos códigos do retrato de estúdio da época e também com o olhar, expressão e pose que estabelecem a identidade dos indivíduos diante do fotógrafo e do mundo.

Fotógrafos com Joaquim Insley Pacheco, Alberto Henschel, Justiniano José de Barros, entre outros, constituiram o grande grupo de fotógrafos de estúdio na capital do Império que realizaram o registro das primeiras poses dos moradores da cidade. Na passagem do século XIX para o XX, o retrato começaria a ser modificado pela fotografia amadora e seus registros espontâneos de indivíduos e grupos.

Assim, o que propomos aqui é um breve passeio pela nossa “Galeria Virtual de Retratos”, que mescla alguns dos mais apreciados retratos fotográficos de nossa história com outros, nem tão conhecidos mas igualmente significativos para historiar os usos deste gênero, em nosso país.

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Curadoria de Sergio Burgi/IMS e Joaquim Marçal Ferreira de Andrade/FBN

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Cenas de rua: da paisagem arquitetônica à paisagem social e humana

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Marc Ferrez. Centro do Rio de Janeiro. c. 1890 / Acervo IMS

No século XIX, fotógrafos como Marc Ferrez registram a paisagem urbana em grandes panoramas. Ferrez documentou sistematicamente o Rio de Janeiro, cidade onde viveu e produziu a maior parte de seu trabalho fotográfico, fortemente influenciado em seu processo criativo pela deslumbrante paisagem da cidade e de seu entorno. Suas imagens da arquitetura da cidade e das grandes vistas urbanas, feitas em negativos de vidro de grande formato, permitem hoje o exame de detalhes das imagens que incluem os elementos registrados no nível das ruas, nas calçadas, revelando importantes informações de um tempo onde ainda a fotografia de caráter mais jornalístico não era comumente praticada, em função de restrições técnicas do processo fotográfico.

Com o aumento da sensibilidade à luz dos materiais fotográficos, tanto o fotojornalismo, como a fotografia amadora, expandem-se significativamente na virada do século XIX para o XX. A imagem fotográfica passa a frequentar o cotidiano das pessoas através das revistas ilustradas e das fotografias realizadas no âmbito das próprias famílias, aumentando o repertório imagético e a intensidade da comunicação visual na sociedade.

A fotografia instantânea, capturando cenas em frações de segundo, como mostra o trabalho de Eadweard Muybridge sobre o movimento de homens e animais, foi precursora do registro cinematográfico. O cinema, tal como o conhecemos hoje, é resultado destes desenvolvimentos tecnológicos no campo da fotografia, ocorridos nas três últimas décadas do século XIX. A introdução das emulsões de gelatina e brometo de prata, com alta sensibilidade à luz, e a introdução de bases flexíveis que permitiram a produção de filmes em rolo para filmagem e projeção, revolucionaram também o campo da própria fotografia.

No Rio de Janeiro, fotógrafos como Augusto Malta, Lopes, Thiele Kholien, Bippus e outros produziram uma intensa e variada documentação fotográfica da cidade. Incluem-se aqui as primeiras fotografias aéreas, registrando suas transformações e seus grandes eventos, com a as exposições de 1908 e 1922, a remoção do Morro do Castelo, as obras da Avenida Beira-mar e da área portuária, entre outras. Guilherme Santos (1871-1966) produziu uma vasta documentação em estereoscopia da cidade e do país, que disponibilizou na forma de coleções temáticas com forte viés documental e jornalístico. Fotógrafo amador dedicado à fotografia de efeito tridimensional, registrou os hábitos e cotidiano dos cariocas, os eventos sociais e políticos e a paisagem da cidade. A empresa Rodrigues & Co. produziu igualmente coleções significativas sobre o Rio de Janeiro e Marc Ferrez, juntamente com seus filhos Júlio e Luciano, deixou também um legado muito rico em imagens estereoscópicas preto e branco e coloridas.

Em outras regiões do país, fotógrafos como Militão Augusto de Azevedo em São Paulo, Francisco du Bocage em Recife, e também registros anônimos em Belém, compõem um amplo registro da vida nas cidades, que evolui dos primeiros registros em longos tempos de exposição, onde as pessoas aparecem muitas vezes sem definição por estarem se deslocando durante a realização da fotografia, até os registros instantâneos, em frações de segundo, realizados já a partir dos anos 1910 e 1920.

É, portanto, muito significativa para os estudos da paisagem humana e social do Brasil do século XIX e início do século XX a possibilidade hoje de exame destas imagens em uma plataforma como esta Brasiliana Fotográfica, que dispõe de recursos de magnificação que permitem uma navegação sobre detalhes das imagens que revelam conteúdos e informações relevantes para a pesquisa da vida do país. As imagens aqui selecionadas e reunidas na galeria de vistas urbanas de diversas cidades brasileiras permitem um olhar sobre a vida nas ruas e nas calçadas, que informam sobre muitos aspectos da dinâmica social daquele período.

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Curadoria de Sergio Burgi/IMS

 

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Para uma história social da reprodução fotomecânica

A. Ribeiro. Urca e Pão d’Assucar. c. 1905. Rio de Janeiro / Acervo FBN

No início do século 19, antes mesmo do anúncio das primeiras variantes do processo fotográfico – que empregaram a camera obscura para a obtenção das imagens – diversos de seus pioneiros estiveram envolvidos em esforços para multiplicar ‘fotograficamente’ as estampas (ou gravuras) que ofereciam, até então, a melhor possibilidade de disseminação/circulação de imagens, reproduzidas a partir de matrizes cuja confecção demandava muito trabalho, habilidades específicas e uma série de cuidados.

Mas apenas ao final do século 19, quando aperfeiçoou-se a ‘reprodução fotomecânica’, é que foram viabilizados os primeiros processos de impressão gráfica que possibilitaram a reprodução em massa, com fidelidade e qualidade — através das páginas das revistas, dos livros e depois dos cartões postais — das imagens originalmente obtidas através de processos fotográficos. A fotografia deixa de ser um objeto, um artefato, para tornar-se apenas uma superfície, uma imagem impressa. Foi esta a grande revolução que tornou a imagem fotográfica onipresente — o que foi ainda mais intensificado em tempos recentes, através da revolução digital.

No Brasil, até aqui, avançamos pouco no estudo deste universo específico, tão crucial para que a fotografia viesse a cumprir integralmente o seu papel, em nossa sociedade. Quase nada sabemos sobre os desafios enfrentados pelos empresários e gráficos de então, ao optar por tais processos, seja em seus aspectos tecnológicos, econômicos e de recursos humanos. E tampouco acerca da recepção dos mesmos que, em boa parte, acabaram esquecidos.

Aqui, pretendemos lançar luz sobre um processo que se fez presente no Brasil, com relevo, na virada do século 19 para o 20: a ‘colotipia’ ou ‘fototipia’, um processo de impressão fotomecânica planográfica – na verdade, uma variante da fotolitografia – também baseado na descoberta feita por Poitevin, em 1855, da propriedade que a gelatina bicromatada tem, quando úmida, de absorver mais ou menos tinta de impressão, segundo os graus diversos de endurecimento que adquire, proporcionalmente à quantidade de luz recebida através de um negativo fotográfico. Foi experimentada na pedra, no cobre e consolidou-se quando a matriz de impressão passou a ser produzida sobre uma espessa chapa de vidro.

A colotipia ou fototitpia também foi denominada colografia, gelatinografia ou heliotipia. Ocorrem, ainda, variantes deste processo denominadas por albertipia ou albertotipia, artotipia, aquatone, helioplastia, entre outras.

Importantes empresários e fotógrafos do período (como Henrique Lombaerts, Marc Ferrez e A. Ribeiro) editaram publicações ilustradas, imagens publicitárias e séries de cartões postais fotográficos em colotipia. Este processo proporciona uma impressão de qualidade, com bom contraste, boa gradação tonal e que aparenta tratar-se mesmo de uma imagem fotográfica de tom contínuo, cujo padrão de retícula só pode ser visualizado sob o exame de uma lupa.

Segundo Frederico Porta, em seu indispensável Dicionário de Artes Gráficas, “apesar da perfeição das cópias fototípicas, o processo ficou circunscrito a uns poucos trabalhos especializados, como a impressão de postais, por dois poderosos motivos: tiragem demorada, não ultrapassando da média de umas cinqüenta provas à hora, e precariedade da matriz, que dificilmente suporta mais de mil impressões.”

Nesta galeria, selecionamos alguns exemplos de imagens impressas por este processo, desde o mais antigo exemplo conhecido na imprensa periódica, no Brasil: um fac-símile de manuscrito do escritor Machado de Assis, aparecido em publicação editada por Lombaerts. De Manaus, destaque para o arrojado panorama de George Huebner. De São Paulo, há imagens de Otto Quaas e de Guilherme Gaensly — estas, fazem parte de uma série estupenda, realizada pelo talentoso fotógrafo. Mas a maioria das imagens escolhidas refere-se, mesmo, à cidade do Rio de Janeiro – porque desejamos homenageá-la, nesta passagem dos seus 450 anos. A exuberante arquitetura da loja A Torre Eiffel, cartões postais das séries editadas por A. Ribeiro e alguns dos colótipos produzidos por Marc Ferrez – tudo para nos deixar saudosos de um Rio que passou.

 

Seleção de reproduções fotomecânicas na Brasiliana Fotográfica

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Curadoria de Joaquim Marçal Ferreira de Andrade/FBN