Série “Avenidas e ruas do Brasil” XVI – “Alguma coisa acontece no meu coração”, a Avenida São João nos 469 anos de São Paulo

“Alguma coisa acontece no meu coração que só quando cruza a Ipiranga e a avenida São João”. Assim começa Sampa, do compositor Caetano Veloso, uma das mais belas canções sobre a São Paulo – foi lançada no álbum Muito – Dentro da Estrela Azulada, em 1978. Então, para homenagear os 469 anos de fundação da cidade, a Brasiliana Fotográfica destaca uma foto aérea da Avenida São João, do acervo do Museu Aeroespacial, uma de suas instituições parceiras, além de registros da cidade realizados por Militão Augusto de Azevedo (1837 – 1905) e Guilherme Gaensly (1843 – 1948) na publicação do 16º artigo da Série “Avenidas e ruas do Brasil”.

Destacamos também artigos já publicados no portal sobre a cidade, que foi fundada em 25 de janeiro 1554 com a celebração de uma missa que oficializou a criação de um colégio jesuíta, no alto de uma colina entre os rios Anhangabaú e Tamanduateí, por 12 padres, dentre eles José de Anchieta (1834 – 1597) e Manoel da Nóbrega (1517 – 1590). É onde fica o Pátio do Colégio.

 

 

São Paulo é o principal centro corporativo, financeiro e mercantil da América do Sul assim como a cidade mais populosa do Brasil.

 

 

Muitos fotógrafos registraram diversos aspectos da cidade de São Paulo desde o século XIX, dentre eles Alfredo Krausz (18? – 19?), Claude Lévi-Strauss (1908 – 2009), Edgard Egydio de Souza (1867 – 1956), Frédéric Manuel (18? – 19?), Guilherme Gaensly (1843 – 1928), Marc Ferrez (1843 – 1923), Militão Augusto de Azevedo (1837 – 1905), Otto Rudolf Quaas (c. 1862 – c. 1930), Valério Vieira (1862 – 1941), Vincenzo Pastore (1865 – 1918) e fotógrafos ainda não identificados, cujas imagens podem ser apreciadas nos artigos listados a final desta publicação.

Militão e Gaensly são considerados os fotógrafos que mais cultuaram São Paulo. Militão produziu o Álbum comparativo da cidade de São Paulo 1862-1887, sua obra-prima, que foi o primeiro realizado com o objetivo de mostrar as mudanças ocorridas na capital paulista, devido ao progresso. O álbum evidencia o valor que Militão dava à fotografia como documento de época inserido em projeto artístico que sugere um passeio pela cidade no período de 1862 a 1887. O trabalho do fotógrafo muito contribuiu para a formação da imagem moderna de São Paulo.

 

 

Gaensly fotografou a cidade em plena transição para a modernidade, tendo registrado todos os aspectos urbanos da nova metrópole que surgia, como a inauguração dos bondes elétricos que substituíram as carroças, o Jardim da Luz, a agitação do comércio na região do entorno da Praça da Sé, o crescimento da Avenida Paulista, além de palacetes, chácaras, edifícios públicos, igrejas, escolas, teatros e hospitais. Essas vistas de São Paulo foram comercializadas em álbuns impressos na Suíça a partir de fotografias em papel albuminado e de colotipias. Fotografou também a chegada de imigrantes italianos em Santos e em São Paulo. Dentre os prêmios que recebeu, está uma medalha de prata conquistada na Exposição Universal de Saint Louis, em 1904.

 

 

Artigos sobre a cidade de São Paulo já publicados na Brasiliana Fotográfica

 

 

Militão Augusto de Azevedo (1837 – 1905) e sua obra-prima, o “Álbum comparativo da cidade de São Paulo 1862-1887″, publicado em 24 de maio de 2015

Vincenzo Pastore, um fotógrafo entre dois mundos (Casamassima, Itália 5 de agosto de 1865 – São Paulo, Brasil 15 de janeiro de 1918), publicado em 5 de agosto de 2015

São Paulo sob as lentes do fotógrafo Guilherme Gaensly (1843 – 1928), publicado em 25 de janeiro de 2017

Os trinta Valérios, uma fotografia bem-humorada de Valério Vieira (1862 – 1941), publicado em 21 de março de 2017

O fotógrafo austríaco Otto Rudolf Quaas e o construtor Ramos de Azevedo, publicado em 28 de setembro de 2017

Série “Avenidas e ruas do Brasil” IV – Rua 25 de março em São Paulo, publicado em 1º de setembro de 2020

A cidade de São Paulo e Tebas (1721 – 1811), reconhecido como arquiteto, em 2018, mais de 100 anos após sua morte, pubicado em 25 de janeiro de 2021

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XI – A Rua da Esperança, em São Paulo, por Vincenzo Pastore, publicado em 14 de dezembro de 2021

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XII – A Avenida Paulista, o coração pulsante da metrópole, publicado em 21 de janeiro de 2022.

Série “1922 – Hoje, há 100 anos” II – A Semana de Arte Moderna, publicado em 13 de fevereiro de 2022.

O Edifício Martinelli, antigo referencial e símbolo de São Paulo, publicado em 16 de maio de 2022

 

 

Assinaturas dos membros do 1º Governo de São Paulo, 1555

Assinaturas dos membros do 1º Governo de São Paulo, 1555 / São Paulo Antigo e São Paulo Moderno

Sampa

Caetano Veloso

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Brasiliana Fotográfica

São Paulo Antigo e São Paulo Moderno – 1554-1904. São Paulo : Editores Vanorden & Cia, 1905.

 

Links para as outras publicações da série “Avenidas e ruas do Brasil”

 Série “Avenidas e ruas do Brasil” I – Avenida Central, atual Rio Branco, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 7 de setembro de 2016

Série “Avenidas e ruas do Brasil” II – A Rua do Imperador em Petrópolis por Klumb, Leuzinger e Stahl, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 26 de junho de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” III – A Rua do Bom Jesus, no Recife, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 6 de agosto de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” IV – A Rua 25 de Março, em São Paulo, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 1º de setembro de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” V – A Rua Direita, a Rua das Mercês e a Rua Macau do Meio, em Diamantina, Minas Gerais, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 22 de outubro de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” VI  – Rua Augusto Ribas e outras, em Ponta Grossa, no Paraná, pelo fotógrafo Luiz Bianchi, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 16 de novembro de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil” VII – A Avenida Atlântica, em Copacabana, no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 23 de dezembro de 2020

Série “Avenidas e ruas do Brasil VIII – A Rua da Carioca por Cássio Loredano, de autoria de Cássio Loredano, publicada em 20 de janeiro de 2021

Série “Avenidas e ruas do Brasil” IX – Ruas e panoramas do bairro do Catete, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 14 de julho de 2021

Série “Avenidas e ruas do Brasil” X – A Rua da Ajuda, no Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 9 de novembro de 2021

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XI – A Rua da Esperança, em São Paulo, por Vincenzo Pastore, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 14 de dezembro de 2021

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XII – A Avenida Paulista, o coração pulsante da metrópole, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 21 de janeiro de 2022

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XIII – A Rua Buenos Aires no Centro do Rio de Janeiro, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal,  publicada em 19 de julho de 2022

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XIV – A Avenida Presidente Vargas,, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 31 de agosto de 2022

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XV – Misericórdia: rua, largo e ladeira, no Rio de Janeiro, por Cássio Loredano, de autoria de Cássio Loredano, publicada em 8 de dezembro de 2022

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XVII  e série “O Rio de Janeiro desaparecido” XXIII – A Praia e a Rua do Russel, na Glória, de autoria de Andrea C. T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 15 de maio de 2023

Série “Avenidas e ruas do Brasil” XVIII – Avenida Beira-Mar, de autoria de Andrea C.T. Wanderley, editora e pesquisadora do portal, publicada em 22 de janeiro de 2024

 

 

O Edifício Martinelli, antigo referencial e símbolo de São Paulo

A Brasiliana Fotográfica destaca quatro imagens do icônico Edifício Martinelli, símbolo do apogeu e do declínio do Centro velho de São Paulo. Uma delas foi produzida pelo francês Claude Lévi-Strauss (1908 – 2009), que esteve no Brasil entre 1935 e 1938, tendo sido professor de Sociologia na Universidade de São Paulo e que, nas horas vagas, fotografava a cidade. Sobre o edifício escreveu em Saudades de São Paulo:

“Se coloquei o prédio Martinelli na abertura desta coletânea, é que em 1935 ele era ao mesmo tempo um referencial e um símbolo.

Único arranha-céu de toda a cidade, aos olhos dos paulistanos simbolizava a ambição de que esta se tornasse a Chicago do hemisfério sul. Ambição que se realizou desde então, e foi além…

O prédio Martinelli era também um referencial cuja silhueta dominava todos os outros prédios. Era visto de quase toda a parte, mesmo do fundo dos barrancos escarpados que desciam das elevações onde corria a avenida Paulista. Ainda entregues à natureza, esses barrancos abrigavam as habitações mais pobres, com os riachos, à guisa de esgotos, transformados em torrentes quando chovia.

Mas o arranha-céu impunha sua presença majestosa sobretudo no início da avenida São João, artéria nova cuja abertura não estava ainda terminada. Descendo a pé a avenida em direção ao oeste, ficava-se obsedado por sua massa rosada que se percebia toda vez que se olhava para trás. Mesmo à distância, ela obstruia o horizonte, tanto de dia como ao anoitecer, quando as ornamentações feitas para o Carnaval se iluminavam“.

 

 

Há também uma fotografia aérea de autoria de Alfredo Krausz (? – 19?), uma de autoria de um fotógrafo ainda não identificado e, finalmente, um registro realizado por Edgard Egydio de Souza (1867 – 1956). Inicialmente, o Martinelli era dividido em três partes: na rua Líbero Badaró, a parte residencial do edifício; na rua São Bento, a área comercial; e, pela entrada da São João, estava o Hotel São Bento e os salões Verde e Mourisco, alguns dos destinos preferidos da alta sociedade paulistana. A pintura rosa dos detalhes esculpidos em suas paredes é uma de suas marcas registradas.

 

 

Marco na verticalização de São Paulo, um de seus símbolos de progresso, da riqueza gerada pelo café, o Edifício Martinelli foi o primeiro arranha-céu de São Paulo e, como cenário urbano, traduzia o cosmopolitismo, que caracterizou o modernismo no Brasil. Abaixo, versos da revolucionária escritora Patrícia Galvão (1910 – 1962), a Pagu, participante do movimento modernista, onde o Edifício Martinelli é citado:

 

pagu

 

O Edificio Martinelli foi idealizado pelo imigrante italiano Giuseppe Martinelli (1870-1946), que chegou ao Brasil em fins do século XIX e tornou-se um dos mais ricos empresários do país. O projeto do prédio foi de autoria do arquiteto húngaro William Fillinger (1888-1968), formado na Academia de Belas Artes de Viena, na Áustria. A fachada foi desenhada pelos Irmãos Lacombe, suas portas eram de madeira de lei, as escadas tinham mármore italiano e o cimento veio da Noruega e da Suécia. Foi inaugurado, em 1929, em um terreno entre as ruas São Bento, Libero Badaró e a Avenida São João. Era, na época, o maior prédio da América do Sul, com 105,65 metros de altura, e a maior obra de cimento armado do mundo (O Cruzeiro, 11 de maio de 1929).

 

 

Sua construção foi iniciada, em 1924, e, a princípio, o prédio teria 14 andares. Mais seis pavimentos foram adicionados à obra e, posteriormente, com a ajuda de seu sobrinho, o engenheiro calculista Ítalo Martinelli, o edifício passou para 24 andares. A obra foi embargada, sob denúncias de risco de desabamento da construção. Giuseppe revogou a decisão e ainda ergueu mais pavimentos (A Gazeta (SP), 23 de setembro de 1925, sexta colunaA Gazeta (SP), 23 de janeiro de 1928, quinta coluna; Gazeta de Notícias, 25 de maio de 1928, última coluna; Gazeta de Notícias, 1º de junho, sexta colunaCorreio da Manhã, 1º de junho de 1928, sétima coluna; Gazeta de Notícias, 17 de outubro de 1928, quinta coluna).

 

 

Em 29 de março de 1928, o embaixador italiano, Bernardo Attolico, durante sua estadia em São Paulo, foi visitar as obras do edifício (Correio Paulistano, 30 de março de 1928).

 

 

Em abril de 1929, 25 andares já estavam construídos (O Paiz, 21 de abril de 1929, quarta coluna). Foi visitado pelo governador de São Paulo, Julio Prestes (1882 – 1946).

 

 

 

Em novembro, o prédio já tinha 26 pavimentos (Jornal do Brasil, 26 de novembro de 1926, primeira coluna). No topo, foi construído um palacete, de cinco andares, onde Martinelli moraria. Mudou-se com a família para o prédio, em 1929. Porém, foi o italiano Arturo Patrizi, professor de dança, o primeiro morador do prédio. Mudou-se para lá em 1928, com o edifício ainda em obras, e abriu uma concorrida escola em uma das salas de sua casa, no quarto andar.  
Em 2 de setembro de 1929, foi inaugurado, no prédio, o luxuoso Cinema Rosário, com a exibição do filme O Pagão. O evento foi considerado o maior acontecimento social do ano (A Gazeta (SP), 4 de setembro de 1929).

 

 

 

 

 

“E o Zeppelin veio provar para São Tomé o sofisma gracioso de que uma casa dum andar pode ser mais alta que o Martinelli.” 

Mário de Andrade, 1976

 

Devido à quebra da Bolsa de Valores de Nova York, em 1929, o comendador Martinelli vendeu o prédio para o Instituto Nazionale di Credito per il Lavoro Italiano all´Estero. Os bens italianos foram confiscados pelo governo brasileiro durante a Segunda Guerra Mundial e o Edifício Martinelli passou para a administração federal, tendo sido, em seguida, leiloado. Foi comprado por Milton Pereira de Carvalho e Herbert Levy e pouco tempo depois passou a ter 103 proprietários, tornando-se o primeiro edifício do Brasil a se transformar em condomínio. Entrou em decadência até a reforma realizada durante a gestão do prefeito Olavo Setúbal (1923 – 2008), na década de 70, tendo sido reinaugurado, em 4 de maio de 1979 (Diário da Noite (SP), 1º de fevereiro de 1979).

 

martinellicartãoO Estado de São Paulo, 5 de maio de 1979

O Estado de São Paulo, 5 de maio de 1979

 

O Martinelli foi o endereço da sucursal paulista da revista O Cruzeiro (O Cruzeiro, 20 de fevereiro de 1932), assim como dos partidos políticos Comunista, Integralista e também da União Democrática Nacional (UDN); do Palmeiras e da Portuguesa, do Club Republicano, da Ordem dos Músicos, da Federação Paulista de Medicina e do Instituto Médico Dante Alignieri.

Em 2019, quando completou 90 anos, cerca de 70% do Edifício Martinelli estava ocupado por secretarias municipais e o restante estava distribuído entre a Caixa Econômica Federal, o Sindicato dos Bancários de São Paulo e 11 lojas.

Uma curiosidade: Giuseppe Martinelli é avô da artista plástica Maria Bonomi (1935-).

 

 

 

Andrea C. T. Wanderley

Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica

 

Fontes:

Esquinas – Revista Digital Laboratório da Faculdade Casper Líbero, 11 de fevereiro de 2020

Folha de São Paulo, 25 de janeiro de 1998

Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional

HOMEM, Maria Cecília Naclério. O Prédio Martinelli – A ascensão do imigrante e a verticalização de São Paulo. São Paulo : Editora Projeto, 1984.

LEVI-STRAUSS, Claude. Saudades de São Paulo. São Paulo : Companhia das Letras, 1996.

REBECHI JUNIOR, Arlindo. Pagu: poesia, militância e condição feminina. Revista da USP. Comunicação & Educação • Ano XXIII • número 1 • jan/jun 2018.

São Paulo Antiga

Site Prefeitura de São Paulo

Site YOU, INC

UOL