Para marcar o centenário da Revolta Paulista de 1924, a Brasiliana Fotográfica destaca registros produzidos pelo fotógrafo Gustavo Prugner (1884 – 1931) sobre os efeitos da rebelião na cidade. Pertencem ao acervo fotográfico do Instituto Moreira Salles (IMS), uma das instituições fundadoras do portal. Também conhecida como a Revolução Esquecida, foi a segunda revolta tenentista e o mais grave conflito bélico ocorrido, até hoje, na cidade de São Paulo. Também publicamos hoje a Cronologia de Gustavo Prugner, a 68ª produzida pelo portal.
É possível conferir algumas destas fotografias de Prugner na base de dados do Acervo IMS online: https://acervos.ims.
Pouco de sabe sobre o fotógrafo Prugner. Ele nasceu em 5 de julho de 1884, em São Bernardo do Campo, e, no início do século XX, ganhou uma das câmeras fotográficas distribuídas em uma ação promocional da loja de artigos fotográficos de Guilherme Wessel (1862 – 1940), pai do empreendedor Conrado Wessel (1891 – 1993). Prugner havia estudado na Escola Alemã com Guilherme. Curiosamente, a vida de Conrado Wessel foi fortemente impactada pela rebelião de 1924: devido ao violento conflito urbano, faltou papel importado para os fotógrafos que atuavam, principalmente, no Jardim da Luz, e eles passaram a comprar de Wessel. Quando a rebelião terminou, o fornecimento de papel importado foi restabelecido, mas Conrado já havia conquistado uma clientela fiel. Sua empresa começou a prosperar.
Voltando a Prugner. Com a obtenção da câmera, passou a trabalhar como fotógrafo e laboratorista. Foi também, em São Paulo, assim como o alemão Theodor Preising (1883 – 1962) e o suíço Guilherme Gaensly (1843 – 1928), um importante editor de cartões-postais, uma forma de circulação de imagens que, desde meados do século XIX, contribuiu para popularizar a fotografia. Prugner organizava álbuns a partir de fotos de sua autoria e de outros fotógrafos. Suas imagens eram marcadas pelas iniciais GP. Foram publicadas em revistas ilustradas como a Careta e a Revista da Semana e também em jornais, porém nem sempre sua autoria era identificada.
Gustavo Prugner foi o autor de um dos mais importantes conjuntos de fotografias sobre o conflito de 1924. Fotografou a destruição causada pelos bombardeios terrificantes realizados pelas tropas leais ao presidente da República, Artur Bernardes (1875 – 1955), sobre São Paulo – única cidade brasileira já bombardeada por um ataque aéreo.
“As vítimas civis passaram de dois milheiros, quase todas estraçalhadas de modo horroroso por estilhaços de granada. O número de prédios destruídos ou simplesmente estragados subiu aos milhares. Dia e noite os canhões legalistas despejavam metralha às tontas, sem o menor objetivo militar […]. Havia lá dentro 3 mil rebeldes disseminados no seio de uma massa de 800 mil civis. O mais rudimentar cálculo faria ver que, por força do bombardeiro às tontas, seria mister massacrar 270 civis para dar cabo de um revoltoso”
Monteiro Lobato (1882 – 1948), trecho de O bombardeio de São Paulo
As fotos de Prugner mostravam trincheiras improvisadas, prédios arruinados, ruas, fachadas de casas, animais mortos e incêndios. Os bairros mais atingidos foram Belenzinho, Brás, Cambuci, Centro, Ipiranga, Mooca e Vila Mariana. Os registros de Prugner, focados nos efeitos da revolta no cotidiano dos moradores dos bairros mais afetados pela guerra, tiveram grande sucesso comercial.
Faleceu, em 4 de dezembro de 1931, em São Paulo. Seus filhos com Lina Hagemann (1889 – 1981), com quem foi casado, Edgar (1911 – 1984) e Mário (1912 – 1993), continuaram a editar cartões-postais até 1936, quando passaram a trabalhar em tempo integral na primeira fábrica de papel fotográfico da América Latina, a Fábrica Privilegiada de Papéis Fotográficos Wessel, criada, em 1921, e que utilizava tecnologia e patente próprias, cujo proprietário era o já mencionado pioneiro Conrado Wessel (1891 – 1993). Prugner foi casado com Lina Hagemann (1889 – 1981).
Acesse aqui a Cronologia de Gustavo Prugner (1884 – 1931).
Brevíssimo resumo da Revolta Paulista de 1924
A Revolta Paulista de 1924 foi motivada pelo descontentamento dos militares com a crise econômica e a concentração de poder nas mãos de políticos de Minas Gerais e de São Paulo. Os rebeldes, sob a liderança do general Isidoro Dias Lopes (1865 – 1949), pretendiam derrubar o governo de Artur Bernardes (1875 – 1955), instituir o voto secreto, fazer mudanças no ensino público e realizar reformas sociais. A rebelião eclodiu, em 5 de julho de 1924, justamente dois anos após a primeira revolta tenentista, a Revolta do Forte de Copacabana, ocorrida no Rio de Janeiro.
Os 23 dias da Revolta Paulista de 1924, que contou com a participação de vários tenentes, dentre eles Juarez Távora (1898 – 1975) e Eduardo Gomes (1896 – 1981), tiveram como saldo 503 mortos e cerca de 5 mil feridos. O número de desabrigados passou de 20 mil e, aproximadamente, dois mil edifícios foram destruídos. Os rebeldes, derrotados pelas tropas legalistas do governo federal, fugiram de São Paulo e foram para Santa Catarina e para o Paraná. Os tenentistas juntaram-se à Coluna Prestes, sob a liderança de Luís Carlos Prestes (1898 – 1990), e começaram a marcha que seguiu pelo interior do Brasil propondo reformas e atacando a República Velha.
Veja outras fotos da Revolta de 1924, em São Paulo, publicadas da página 15 a 22 da Revista da Semana de 9 de agosto de 1924 e da página 19 a 27 da Revista da Semana de 16 de agosto de 1924
Andrea C. T. Wanderley
Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica
Fontes:
GERODETTI, João Emílio; CORNEJO, Carlos. Lembranças de São Paulo: a capital paulista nos cartões postais e nos álbuns de lembranças. São Paulo : Estúdios Flash Produções Gráficas, 1999.
Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional
KOSSOY, Boris. Luzes e sobras da metrópole: um século de fotografia em São Paulo (1850 – 1950) in PORTA, Paula (org) História da Cidade de São Paulo: A cidade no Império. São Paulo : Paz e Terra, 2004.
LEMOS, Eric Danzil. Fotografia profissional, arquivo e circulação: a produção de Theodor Preising em São Paulo (1920 – 1940). Universidade de São Paulo, 2016.
LOBATO, Monteiro. O bombardeio de São Paulo. Obras Completas, vol. 6. São Paulo : Editora Brasiliense, 1946.
O Estado de São Paulo
Schiavinatto, Iara. Séries Fotográficas narram um evento: 1924/São Paulo. Revista Stadium, número 8, 2002.
Site Enciclopédia Itaú Cultural
WANDERLEY, Andrea C. T. Aspectos de Poços de Caldas impressos no papel fotográfico fabricado pelo pioneiro Conrado Wessel (1891 – 1993) in Brasiliana Fotográfica, 7 de abril de 2022
ZERWES, Erica. Suvenires da destruição: a Revolução de 1924 por Barros Lobo e Gustavo Prugner in Conflitos: fotografia e violência política no Brasil, 1889 -1964. Rio de Janeiro : Instituto Moreira Salles, 2017.