Hoje é comemorado o Dia da Amazônia em homenagem à criação da Província do Amazonas por dom Pedro II (1825 – 1891), em 5 de setembro de 1850. A Amazônia é um bioma que possui 4,196.943 milhões de km2 – a maior floresta tropical do planeta – e abrange nove países: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Paraguai, Peru, Suriname e Venezuela. Este ecossistema tem uma biodiversidade incomparável e influencia o equilíbrio ecológico global, o ciclo da água e o clima da Terra. Sua preservação é uma questão de urgência mundial.
Para lembrar o Dia da Amazônia, a Brasiliana Fotográfica destaca um grupo de 15 fotografias do acervo da Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha, uma das instituições parceiras do portal, sobre a expedição realizada, em 1901, à Amazônia com o objetivo de demarcar o limite entre Brasil e Bolívia. Foram realizadas três expedições e as comissões instituídas pelo governo brasileiro objetivavam traçar o limite na região amazônica e verificar a localização da principal nascente do rio Javari, cujo desconhecimento gerava controvérsias.
A primeira e segunda expedições foram realizadas em 1895 e 1897 e foram chefiadas por Gregório Thaumaturgo de Azevedo (1853 – 1921) e Augusto Cunha Gomes (18? – ?), respectivamente. A terceira, assunto de nosso artigo, foi chefiada pelo astrônomo belga Luis Cruls (1848 – 1908), que havia sido fotografado por seu amigo Marc Ferrez (1843 – 1923), em torno de 1884. Cruls foi diretor do Observatório Astronômico do Rio de Janeiro entre 1891 e 1908. O retrato (abaixo) foi exposto, em 1884, na Notre Dame de Paris, e referido como um “trabalho artístico obtido pelo novo sistema de gelatino-bromureto, especialidade do sr. Marc Ferrez, clichê do sr. Insley Pacheco”(Jornal do Commercio, 4 de julho de 1884, na última coluna).
Voltando à expedição de 1901. O ministro das Relações Exteriores, Olyntho de Magalhães (1866 – 1948), deu a Cruls instruções para subir o rio Javari até as nascentes e determinar sua verdadeira posição geográfica.
Na época, Cruls já era um cientista renomado. Já havia sido membro da comissão da Carta Geral do Império, de 1875, na seção de geodésia, sua primeira atuação profissional no Brasil; e, em 1892, viajado e explorado o Planalto Central, trabalho pelo qual é atualmente mais conhecido. Era professor de Geodésia da Escola Militar.
Cruls e integrantes da comissão embarcaram no Alagoas, no Rio de Janeiro, rumo ao norte, em 4 de janeiro de 1901 (O Paiz, 4 de janeiro de 1901, segunda coluna). Desembarcaram em Belém, em 20 de janeiro. Os integrantes da comissão brasileira eram o capitão de fragata Carlos Accioli, o capitão do Estado-Maior Augusto Tasso Fragoso, o médico Leovigildo Honorário de Carvalho, o capitão farmacêutico Alfredo José Abrantes, o capitão honorário Eduardo Chartier, o secretário Ricardo Veríssimo Vieira, o encarregado do material Arthur Nogueira; e um contingente militar de 50 praças, comandados pelo alferes Arthur Cantalice. A comissão boliviana era chefiada por Adolpho Ballivian (Jornal do Commercio, 4 de março de 1901, sexta coluna).
Cruls montou o seu observatório no interior do Forte do Castelo.
A expedição de 1901 é referida na historiografia da ciência como sendo a que contribuiu para o Tratado de Petrópolis, firmado em 17 de novembro de 1903 em Petrópolis, que pôs fim à disputa territorial entre Brasil e Bolívia pelo território do Acre. Porém, de acordo com Moema de Rezende Vergara, a solução para o problema se deu puramente no plano político, sem levar em consideração os trabalhos técnicos então realizados, o que invalida a relação de causalidade entre a expedição chefiada por Cruls e o fim do litígio com a Bolívia…na Exposição de Motivos sobre o Tratado de 1903, é possível ver que o Barão de Rio Branco optou por uma condução política para a crise, fazendo tabula rasa das viagens de demarcação do período republicano. Os acontecimentos políticos, precipitando-se, haviam tornado sem efeito os esforços técnicos de localização precisa das nascentes do Javari. Cabe a ressalva de que, apesar dos trabalhos de Luiz Cruls não terem sido utilizados no Tratado de Petrópolis, isto não os invalida. As coordenadas que sua comissão determinou para as nascentes do rio Javari, consideradas a parte mais ocidental do Brasil, foram as mesmas utilizadas em importantes obras que tinham por objetivo apresentar a geografia do país, como o “Dicionário Histórico, Geográfico e Etnográfico do Brasil”, publicado para as comemorações do Centenário da Independência de 1922 (IHGB, 1922).
O Tratado de Petrópolis foi assinado pelo Barão do Rio Branco (1845 – 1912), ministro das Relações Exteriores, e pelo diplomata Joaquim Francisco Assis Brasil (1857 – 1938), do lado brasileiro; e pelos diplomatas Fernando Guachalla (1853 – 1908) e Claudio Pinilla (1859 – 1928), do lado boliviano.
Os signatários do Tratado de Petrópolis
No Tratado de Petrópolis foi estipulada a venda do território do Acre da Bolívia para o Brasil. Em compensação, o Brasil cedeu para a Bolívia territórios na Bacia do Rio Paraguai e o governo brasileiro se comprometeu a construir a Estrada de Ferro Madeira-Mamorée pagou à Bolívia a quantia de 2 milhões de libras esterlinas.
Andrea C.T. Wanderley
Editora e pesquisadora do portal Brasiliana Fotográfica
Fontes:
El Aparapita, cargador de la memoria cultural de Bolivia, 7 de julho de 1922
Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional
VERGARA, Moema de Rezende. Ciência, fronteiras e nação: comissões brasileiras na demarcação dos limites territoriais entre Brasil e Bolívia, 1895-1901. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, agosto de 2010.
WANDERLEY, Andrea C.T. O Observatório Nacional pelas lentes de Marc Ferrez, amigo de vários cientistas in Brasiliana Fotográfica, 29 de maio de 2023.